Afonso Cruz – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Wed, 17 Aug 2022 11:07:57 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.9 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Afonso Cruz – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 [Opinião] Princípio de Karenina, de Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2022/08/opiniao-principio-de-karenina-de-afonso-cruz.html https://branmorrighan.com/2022/08/opiniao-principio-de-karenina-de-afonso-cruz.html#respond Wed, 17 Aug 2022 10:58:25 +0000 https://branmorrighan.com/?p=25374
Princípio de Karenina

Princípio de Karenina
Afonso Cruz

Companhia das Letras

O amor corrige o mundo. Mas será a presença do amor suficiente para corrigir o mundo, ou será necessário uma certa intensidade, uma certa proximidade com o desastre e o desespero, para agir? Princípio de Karenina é o primeiro livro da série Geografias de Afonso Cruz, já publicado em 2018. Há uma série de anos que não escrevo sobre os livros do Afonso. Não que não o leia, porque tenho lido todos, mas porque receio sempre cair nos lugares comuns, de me repetir, de não ter nada de novo para dizer. Li o Princípio de Karenina, pela primeira vez, pouco depois de ter sido publicado. Esta semana, decidi relê-lo.

Acho que nunca me vou cansar de me sentir fascinada com o efeito de reler um livro, constatando que a nossa posição no mundo, o nosso estado de espírito quando lemos um livro, tem um efeito tremendo na forma como o lemos, como o interpretamos. E talvez por Princípio de Karenina evocar precisamente esse sentido de viagem, ao mesmo tempo de imobilização, dei conta de vários efeitos muito subtis que não tinha sentido na primeira leitura.

E o primeiro efeito, e talvez o mais surpreendente para mim, foi a empatia ampliada pelo protagonista. E, talvez, se já leram o livro, vocês vão pensar: como é que é possível? Por tantas razões. Comecemos pelos deimos e phobos, unidades do medo. Apesar do nosso protagonista ter sofrido um condicionamento brutal por parte do pai, estes deimos e phobos não deixam de existir para quem sofre de uma certa ansiedade espacial. A forma como se mede o desconforto e o risco ou a confiança numa determinada acção poderia certamente usar estas medidas.

Enquanto este pai escreve esta carta de amor à sua filha (porque não deixa de ser uma carta de amor), vivemos com ele uma viagem de aproximações e afastamentos, um medo irracional do desconhecido à distância da porta de entrada da casa, que só começa a ser desconstruído quando um agente estrangeiro entra precisamente por aquela mesma porta. Se até então as janelas deviam estar sempre fechadas, há uma janela que se abre e que se torna impossível de fechar. E se por um lado esta janela representa esperança, a mesma não é capaz, com toda a sua luz, de afastar o medo da mudança e o comodismo.

Até ao dia em que contratámos a tua mãe, eu vivia uma rotina amável, a meia-luz, sem sobressaltos, cego às dores alheias. A partir desse instante, a solidez da minha rotina começou a abrir uma brecha por onde entrava luz. A presença dela haveria de perturbar o tédio nosso de cada dia, abrindo uma janela por onde quer que passasse.

Princípio de Karenina é uma ode à fragilidade e à força humana. Dois pesos que se tentam equilibrar de forma constante, mas muitas vezes de forma muito precária. Quem é que termina este livro e não fica a pensar também no Dois Metros e na cegueira (in)consciente? Quantos Dois Metros temos nós nas nossas vidas? Quem é que não fica a pensar na forma cega como às vezes se fica obcecado com um amor para depois, depois de tantos actos potencialmente irreflectidos e irracionais, se aperceber que afinal era algo oco? Também a finitude, a morte, tem um papel importante tanto na nossa coragem como na nossa cobardia.

Mas aliviemos a seriedade deste texto, que já vai longo, e passemos à leveza dos pormenores belíssimos da escrita de Afonso Cruz. É aqui que provavelmente me vou repetir, mas depois de tanto tempo sem o fazer, tenho a certeza que vocês me perdoam. Como já nos foi habituando, também Princípio de Karenina é rico não só em referências literárias (penso que o título fala por si mesmo) como também é encantador na forma como mistura e reinventa conceitos científicos e filosóficos.

Dado que esta obra resulta também de uma viagem do autor ao Vietname e ao Camboja, não será de estranhar a referência à Cochinchina e a forma como o autor entrelaça a forma como usamos a expressão à sua referência espacial. A certa altura do livro, o protagonista tem uma guia turística, a Sun — thank you so much — e eu só me ria a imaginar o próprio autor a interagir com esta pessoa e a trocar aqueles diálogos. E há sempre algo de especial quando sentimos uma experiência real no meio de um romance.

Quando ouvi a palavra Cochinchina, sem me aperceber de que era o amor que eu temia e não o monstro da minha infância, levantei-me e disse gravemente, tal como teria feito o meu pai num a situação idêntica se fosse ameaçado pelo estrangeiro ou pelo amor: fechem as janelas.

No geral, Princípio de Karenina irá tocar cada um de nós nos nossos nervos mais sensíveis. Apesar da minha empatia acrescida pelo protagonista, não posso dizer que seja um personagem fácil de gostar e se talvez nem seja suposto. No entanto, a sua evolução ao longo da estória culmina numa espécie de redenção que atenua as infinitas formas de imperfeição que é a vida humana.

Como esta dissertação já vai mais que longa, deixo uma última referência ao papel da deformidade, da música, de todas as imperfeições que nos acompanham, que nos salvam e nos condenam e como ainda assim está sempre do nosso lado a dúvida sobre se a felicidade é um caminho ou um destino.

É certo que: Existem infinitos lugares para estar errado, apenas um para estar certo, dois e dois tem um resultado correcto e infinitos resultados errados. É assim que funciona a entropia e os copos partidos/inteiros. Existem inúmeras configurações para os cacos de vidros partidos, mas apenas uma para ter o copo original. Todos os quadrados perfeitos, se nos abstrairmos das suas dimensões, são iguais. São as mazelas, as imperfeições, que fazem ‘quadrados’ diferentes, imperfeitos.
Porém, a felicidade não obedece a essas regras. Estar no lugar errado pode ser fonte de felicidade. Matar-me pode ser fonte de felicidade. Não há condições certas para ser feliz. Existem condições propícias para se estar contente, ou momentaneamente feliz, mas não para ser feliz. Todas as disposições de cacos de vidro podem ser modelos de felicidade. Disposições imperfeitas, cada uma à sua maneira, mas felizes, cada uma à sua maneira.

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[DESTAQUE] Hoje – Streaming com Afonso Cruz no Plano Nacional de Leitura de Matosinhos https://branmorrighan.com/2020/04/destaque-hoje-streaming-com-afonso-cruz.html https://branmorrighan.com/2020/04/destaque-hoje-streaming-com-afonso-cruz.html#respond Thu, 02 Apr 2020 14:13:00 +0000

A página de Facebook do Blog BranMorrighan, em colaboração com a The Book Company, irá transmitir em directo esta sessão do Plano Municipal de Leitura Matosinhos com o escritor português Afonso Cruz. Sintonizem-se aqui: https://www.facebook.com/blogbranmorrighan/

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CONVERSAS de CORRENTES – João Morales entrevista Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2019/03/conversas-de-correntes-joao-morales-5.html https://branmorrighan.com/2019/03/conversas-de-correntes-joao-morales-5.html#respond Wed, 20 Mar 2019 19:51:00 +0000

É um dos autores mais aclamados, entre os portugueses da sua geração. E também dos mais prolixos, com um obra já vasta e diversificada, embora haja pontos de contacto entre livros de diferentes géneros e abordagens. Escritor, desenhador, músico, fabricante de cerveja artesanal (antes de ser moda entre nós), Afonso Cruz lançou recentemente Princípio de Karenina, obra nascida de uma viagem à Cochinchina.

Os simbolismos das personagens e dos seus comportamentos, a felicidade e a sua efemeridade ou o crescimento que só o convívio com outras culturas permite são alguns dos pontos de partida para esta conversa, que teve lugar na Póvoa de Varzim, durante as Correntes d’Escritas de 2019.

João Morales

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Citações Aleatórias – Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz_29.html https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz_29.html#respond Fri, 29 Dec 2017 10:45:00 +0000

“Ao viajar à noite num carro alugado, pelas curvas do Atlas, encontrei um cachorro no meio da estrada. Percebi que fora abandonado e que, muito provavelmente, morreria. Estava deitado, enrolado, a tremer de frio. Decidi trazê-lo para Portugal. Peguei nele ao colo. Era um cão malhado, inteligente e meigo. No comboio tive de o esconder dos revisores, entre malas, dentro de malas, com a ajuda de outras pessoas. Em Marraquexe enquanto o carregava nos braços pelas ruas do souk, fez sucesso e queriam comprá-lo, perguntavam-me quanto queria por ele, ofereciam dinheiro, por vezes quantias relativamente avultadas. Há muito poucos cães por ali. No entanto, há muitos gatos, pois o Profeta gostava deles. Recusei todas as ofertas que me foram feitas. Um cão, ao que parece, tal como um boné dos Yankees [aqui falta uma entrada anterior para se perceber ainda melhor], é muito mais valioso do que a pornografia ou o whisky. Consegui passá-lo na fronteira, escondendo-o da polícia, e o cachorro clandestino viajou de barco até Espanha e, depois, de autocarro até Lisboa. 

Foi baptizado de Berbere. E foi o melhor negócio que não fiz.”

Afonso Cruz, em Jalan Jalan

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Citações Aleatórias – Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz_23.html https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz_23.html#respond Sat, 23 Dec 2017 17:32:00 +0000

“Há uma moda omnipresente entre os jovens: passar o tempo a fazer exercício e a ter um estilo de vida saudável. Para mim, saudável, nesta altura, nesta idade, é fazer do corpo um abismo, um apocalipse. O prazer de ser jovem reside na ausência da preocupação com a salubridade e numa conquista do barro, da imersão no erro, no caos. A higienização da vida, na juventude, é um envelhecimento precoce. Procuram um ideal de saúde e beleza no momento em que esse ideal já faz parte das suas vidas. Não imagino como se lhes será dolorosa a velhice. 

É muito provável que a preocupação com um estilo de vida saudável lhes traga alguns benefícios mais tarde, mas retira a experiência de uma vida posta no limite, impede-os da embriaguez, da possibilidade do êxtase, em troca de uma moderação e contenção caquécticas, consumindo bagas exóticas e superalimentos (o que será isso?), folhas de alface e iogurtes com bactérias inventadas pela publicidade. Andam em bicicletas sem rodas e correm esteiras sem paisagens, enquanto ouvem pop nos seus auscultadores e contam os batimentos cardíacos num telefone. Escolhem uma vida sem sobressaltos, absolutamente rendida a uma temperança monástica. Preferem uma vida em quantidade, longa, em vez de intensa, curta e dolorosa. É uma pena. Como escreveu Joaquín Verdaguer, «não criemos, pelo amor de Deus, um mundo de café sem cafeína, tabaco sem nicotina e álcool sem embriaguez. Não façamos do mundo um imenso e feio bolo sem açúcar.»”

Afonso Cruz, Jalan Jalan

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10 Livros de 2017 que poderia oferecer como prenda de Natal https://branmorrighan.com/2017/12/10-livros-de-2017-que-poderia-oferecer.html https://branmorrighan.com/2017/12/10-livros-de-2017-que-poderia-oferecer.html#respond Sun, 10 Dec 2017 16:15:00 +0000

À semelhança do que fiz em 2016, aqui ficam 10 sugestões de livros para este Natal. Aliás, na verdade, esta imagem pode muito bem reflectir parte dos melhores livros que li este ano. Há algum tempo que decidi não fazer TOPs, mas se recomendamos uma lista de livros é porque eles para nós representam alguma coisa, não? Pois bem, alguns remontam já aos primeiros meses do ano, como Iluminações de uma Mulher Livre, de Samuel Pimenta, enquanto outros saíram recentemente, como Jalan Jalan, de Afonso Cruz. Não estando ordenados por nenhuma ordem ou razão específica, tentei ainda assim equilibrar o número de autores portugueses e autores estrangeiros. Por causa disso, há outros dois livros que estariam ali igualmente bem: “1933 foi um mau ano”, de John Fante (Alfaguara) e “A Sul de Nenhum Norte”, de Charles Bukowski. Acabei por não colocá-los porque são autores que já têm uma boa legião de fãs e nestas recomendações quis colocar livros que talvez não fossem escolhas evidentes à primeira vista. Ora vejamos. 

Afonso Cruz, apesar de para mim ser um dos melhores autores do mundo (é a verdade), parece continuar a ser conhecido apenas num circuito mais restrito, o que escapa à minha compreensão (mas também pode ser só impressão minha). “Jalan Jalan”, a sua mais recente obra, tem sido para mim uma leitura que tem atingido várias dimensões. Nos últimos dois anos devo ter viajado por sete países diferentes, vivi um mês no Japão, etc, e às vezes há aqui coisas sobre essa mobilidade constante que disparam alguns “triggers”. Deixarei essas deambulações para o texto de opinião. O que interessa aqui é: vale COMPLETAMENTE a pena ser adquirido e lido com atenção. 

Eimear McBride, a autora revelação, para mim, de 2016 com o seu “Uma Rapariga É Uma Coisa Inacabada”, lançou este ano o seu segundo romance “Pequenos Boémios”. Foi mais um livro que devorei compulsivamente e foi a concretização da certeza que esta autora se tornou numa das minhas preferidas de sempre. A sua forma de escrita, muitas vezes fragmentada, transporta-nos directamente para o psicológico dos seus protagonistas. Há murros no estômago que merecem ser sentidos. As suas histórias são exemplos disso. 

James Rhodes e a sua história brutal em “Instrumental” são ideais para os que estão dispostos a mergulhar em cenários agressivos, porém também comoventes. Um livro não muito fácil de se ler, mas onde se aprende muito e se acompanha a luta de quem já atravessou estados mentais que passam completamente ao lado da maioria dos humanos durante a sua vida. Só tenho pena de não ter conseguido ir ver nenhum dos concertos que deu recentemente em Portugal.

Angie Thomas foi genial ao escrever “O Ódio Que Semeias”. Apesar de estar categorizado como jovem-adulto, é um livro que recomendaria para qualquer faixa etária. Penso que escrevi isto na opinião: este é um livro necessário! No nosso país não conhecemos assim tantas histórias como aquela, mas é excelente para abrirmos os olhos em relação a outras realidades tão difíceis. E tudo isto é facilmente testemunhado a partir da protagonista com quem a empatia é imediata. 

David Litchfield e as suas maravilhosas ilustrações. “O Urso e o Piano” é toda uma viagem por uma história super querida ilustrada de forma a aquecer e a derreter os nossos corações. Recentemente foi editado “O Gigante Secreto do Avô” que veio comprovar a sua mestria no que toca à forma magnífica como dá cor às suas histórias. Frios e quentes misturam-se num equilíbrio que acabam por reflectir as emoções do que se está a ler. 

Dulce Garcia e o seu “Quando Perdes Tudo Não Tens Pressa de Ir a Lado Nenhum” foram uma das melhores descobertas de 2017. Confesso que foi o título que me atraiu. A vida prega-nos rasteiras e às vezes, mesmo que não seja bem assim, sentimos que perdemos tudo e que então a vida parece que pode esperar que lhe voltemos a dar atenção. Foi um romance sentido, dramático, mas com um sentido real bastante apurado. Um romance de estreia muito bem conseguido. 

Carla M. Soares já é bem conhecida por estes lados. No início do ano lançou “O Ano da Dançarina” e foi uma excelente maneira de recordar alguma história e de ao mesmo tempo viver um romance que poderia mesmo ter acontecido. Sei que entretanto lançou outro romance, mas ainda não o tenho nem li. Como tal, fica esta sugestão que irá deliciar os amantes de romance histórico. 

Sandra Carvalho é uma das autoras mais queridas de Portugal. A cada Feira do Livro está horas e horas a assinar livros e foi este ano que terminou a trilogia Crónicas da Terra e do Mar, que recomendo por completo. A Sandra é uma autora que inspira um carinho enorme e uma devoção completamente merecida. As suas narrativas proporcionam-nos viagens fantásticas, sempre com aquele olhar romântico. Nunca são histórias fáceis, existe sempre muita luta, mas também o amor vence sempre no fim. Leiam-na e deixem-se conquistar. Vale a pena!

Rosa Montero, outra escritora que é das minhas preferidas. Lembro-me do impacto que teve o primeiro livro que li seu. “A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te”. Tinha perdido dois grandes amigos meus recentemente e, apesar de a história ter um contexto amoroso e autobiográfico, as emoções foram tão fortes que foi impossível não me sentir atingida por elas. Em “A Carne”, Rosa Montero expõe a peito aberto as fragilidades emocionais que a idade pode trazer com elas. Como será o amor quando sentimos que o nosso tempo já passou? Um romance duro, mas que vale a pena. 

Samuel Pimenta é um jovem autor português que continua a passar ao lado de muita gente, mas cuja voz merece ser ouvida. É um poeta notável e um romancista acutilante. Depois de em 2016 ter lançado o romance “Os Números Que Venceram os Nomes”, uma chamada à atenção à forma como a humanidade pode progredir, este ano presenteou-nos com “Iluminações de Uma Mulher Livre”, que pretende dar uma nova força à imagem e ao poder interior da mulher. É um dos autores nos quais vale a pena apostar. 

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Citações Aleatórias – Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz.html https://branmorrighan.com/2017/12/citacoes-aleatorias-afonso-cruz.html#respond Sat, 09 Dec 2017 12:40:00 +0000

“A literatura é um exercício de empatia em que os leitores e autores se colocam na pele de personagens diversos. É uma prática que ajuda a impedir a erosão da empatia e objectificação do outro, que leva muitas vezes à violência extrema.”

Afonso Cruz, em Jalan Jalan

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[DESTAQUE] Em Novembro, pela Companhia das Letras: Jalan Jalan – Uma Leitura do Mundo, de Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2017/11/destaque-em-novembro-pela-companhia-das.html https://branmorrighan.com/2017/11/destaque-em-novembro-pela-companhia-das.html#respond Fri, 24 Nov 2017 10:30:00 +0000

Jalan Jalan – Uma Leitura do Mundo

Afonso Cruz

Companhia das Letras

ISBN 978 989 6653 3162 289

656 Páginas 

PVP c/IVA 29,90€

O novo livro de Afonso Cruz é uma reunião de textos filosóficos, poéticos e pensamentos do autor sobre a sociedade em que vivemos, numa colectânea que pretende ser uma etapa de descoberta, mais do que uma viagem física pelo mundo. Além dos textos, o livro inclui também fotografias da autoria de Afonso Cruz.

APRESENTAÇÃO POR PEDRO MOTA E PEDRO VEIRA, NA LIVRARIA FÉRIN, DIA 6 DE DEZEMBRO, ÀS 21H

«Apesar da beleza da paisagem, dos campos de arroz, do verde omnipresente, dos templos hindus, dos macacos zangados, uma das melhores coisas que trouxe de Bali foi uma oferta do João, que me embrulhou e ofereceu uma palavra, talvez duas: Jalan significa rua em indonésio, disse-me. Também significa andar. Jalan jalan, a repetição da palavra, que muitas vezes forma o plural, significa, neste caso, passear. Passear é andar duas vezes. (…) Passear é o que fazemos para não chegar a um destino, não se mede pela distância nem pela técnica de colocar um pé à frente do outro, mas sim pelo modo como a paisagem nos comoveu ou como o voo de um pássaro nos tocou.  

É um pouco como a arte, tem o valor imenso de tudo aquilo que não tem valor nenhum. Pode não ter razão, destino, objectivo, utilidade, e é exactamente aí que reside a riqueza do passeio. Não existem profissionais do passeio. Chesterton, que era um grande apologista do amador, dizia que as melhores coisas da vida, bem como as mais importantes, não são profissionalizadas.  O amor, quando é profissionalizado, torna-se prostituição.» Afonso Cruz

LIVRO

O mundo, dizem, é um livro. E um livro também pode conter o mundo. 

Partindo das suas muitas viagens, Afonso Cruz apresenta neste livro a sua leitura do mundo, um passeio que nos leva a lugares tão diversos como a geografia, a arte, a ciência, a filosofia, e a literatura. Partilhando com o leitor as suas experiências, sugere que façamos com ele percursos idênticos, bastando, para passear assim, dar «um passo para o lado ou usar a imaginação». O resultado poderá ser, se aceitarmos o convite, uma visão nova do mundo.

«Muitas das minhas viagens começaram pelos livros. Foram caminhos que saíram das folhas e se prolongaram para lá das estantes, das paredes da biblioteca. A viagem foi de certo modo uma corroboração da literatura, uma experiência diferente daquela que havia feito enquanto lia. Curiosamente, muitas vezes ela culmina na escrita, já que depois da viagem há o desejo ou a necessidade de solidificar a experiência, torná-la um objecto partilhável, materializar emoções, afectos, pensamentos, enfim, fazer da viagem um espaço imutável, parado, mas acessível aos outros, que com a sua própria experiência farão da leitura uma forma de viagem.»

AUTOR

Além de escritor, Afonso Cruz é também ilustrador, cineasta e músico da banda The Soaked Lamb. Nasceu em 1971, na Figueira da Foz, e viria a frequentar mais tarde a Escola António Arroio, em Lisboa, e a Escola Superior de Belas Artes de Lisboa, assim como o Instituto Superior de Artes Plásticas da Madeira e mais de cinquenta países de todo o mundo. Já conquistou vários prémios: Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco 2010, Prémio Literário Maria Rosa Colaço 2009, Prémio da União Europeia para a Literatura 2012, Prémio Autores 2011 SPA/RTP; Menção Especial do Prémio Nacional de Ilustração 2011, Lista de Honra do IBBY – Internacional Board on Books for Young People, Prémio Ler/Booktailors – Melhor Ilustração Original, Melhor Livro do Ano da Time Out 2012 e foi finalista dos prémios Fernando Namora e Grande Prémio de Romance e Novela APE, conquistou o Prémio Autores para Melhor Ficção Narrativa, atribuído pela SPA em 2014, e o Prémio Fernando Namoro com o romance Flores.

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Citações Aleatórias #52 – Afonso Cruz – Nem todas as baleias voam https://branmorrighan.com/2016/11/citacoes-aleatorias-52-afonso-cruz-nem.html https://branmorrighan.com/2016/11/citacoes-aleatorias-52-afonso-cruz-nem.html#respond Tue, 22 Nov 2016 10:44:00 +0000


(…) eram isso os fantasmas, restos das pessoas que amámos, e a nossa casa ficava assim, repleta de assombrações modernas e antigas, densas e subtis. Tínhamos um protocolo com a memória, tínhamos assinado, juntamente com a dádiva da vida, o compromisso de carregar os mortos no nosso corpo, nos móveis da casa, nas paredes e na luz esmaecida dos candeeiros de estanho e de cobre, e cumpríamos esse contrato com um rigor e uma ética absolutamente notáveis, a ponto de, tantas vezes, chorarmos sem qualquer razão aparente.

Afonso Cruz, Nem todas as baleias voam


Opinião do livrohttp://www.branmorrighan.com/2016/11/opiniao-nem-todas-as-baleias-voam-de.html

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Opinião: Nem todas as baleias voam, de Afonso Cruz https://branmorrighan.com/2016/11/opiniao-nem-todas-as-baleias-voam-de.html https://branmorrighan.com/2016/11/opiniao-nem-todas-as-baleias-voam-de.html#respond Fri, 18 Nov 2016 09:12:00 +0000
Nem Todas as Baleias Voam

Nem todas as baleias voam
Afonso Cruz

Editora: Companhia das Letras

OPINIÃO: Não sei se existe algum outro autor que me cause uma urgência tão grande de leitura como Afonso Cruz. Não, não lhe chamaria obsessão, mas antes uma necessidade visceral. Há qualquer coisa na escrita de Afonso Cruz que, mesmo variando a temática e o formato (afinal escreve desde livros infantis a enciclopédias, passando pelos romances, em que por vezes não se sabe bem se são para adultos ou crianças, mas que na verdade apenas significa que são para todos), me tocam profundamente. Nem todas as baleias voam, o seu mais recente romance, não é excepção a este toque de midas literário. Aliás, dada a minha recente ligação mais intrínseca à música, raras não foram as vezes em que senti de sobremaneira algumas passagens. 

Esta é uma obra que volta a cruzar uma série de géneros: o romance romântico, o toque de thriller com laivos de espionagem, inevitavelmente o romance histórico e, claro, a poesia. Não é fácil falar sobre um livro de Afonso Cruz porque, após terminada a leitura, parece não haver palavras capazes de fazer jus ao que realmente se sentiu durante a leitura. Para não falar na genialidade com que o cruzamento de histórias e o entrelaçar de personagens é feito. Não só dentro do próprio Nem todas as baleias voam, mas também com outras obras suas. Há nomes que poderão ser mais familiares que outros, mas a sensação que dá, a cada nova história, é que toda a obra de Afonso Cruz não passa de uma grande família da qual ainda conhecemos pouquíssimo, mas que sem sombra de dúvidas queremos conhecer por completo. 

Gostei da forma como Nem todas as baleias voam me fez voltar a ouvir alguns clássicos do jazz, a forma como me fez sorrir, como me levou as lágrimas aos olhos, como me fez antecipar, em plenos sofrimento por um desfecho trágico, como depois senti algum alívio, como pelo meio fiquei completamente assombrada pela teia que se encontrava escondida até então… Podia ficar aqui por muito mais linhas, mas acima de tudo acho que é um livro que deve ser lido. Que deve sair das prateleiras das livrarias e habitar as mesinhas de cabeceira para depois ganhar uma nova vida na nossa imaginação, para que depois sintam o contributo sensível e brutal com que este livro nos presenteia. 

Queria contar-vos sobre a caixinha de sapatos para os doentes terminais. Do quanto nos questionamos o que é que realmente colocaríamos lá. Gostava de vos falar sobre o amor de Erik Gould, inabalável, infinito, tão vivo que toda a sua obra cresce tanto com a intensidade do mesmo como com o sofrimento atroz da ausência. Adorava que conhecessem Dresner e a razão do seu coxear. Oxalá pudéssemos todos ver as emoções tomarem forma e sermos capazes de enfrentar e acarinhar a nossa morte como Tristan. E preparem-se, o Escritor não vai ser nada daquilo que ao início podiam pensar. No fundo, quem me dera que realmente a música resultasse como solução de guerras que só o homem cego teima em perpetuar. Não quero falar-vos mais sobre a vida deste romance, quero que o leiam, quero se transportem para lá, quero que o sintam. Afonso Cruz é, para mim, o mais completo dos escritores portugueses da actualidade. 

Genuinamente, acreditavam poder, com este programa, vencer a Guerra Fria, ao evangelizarem uma juventude de Leste que ouvia música erudita mas tinha pouco contacto com outros géneros musicais, especialmente o jazz.

Este facto parece-me uma das ideias mais fantásticas da Humanidade: pretender conquistar o mundo através da música, em vez de, por exemplo, fazer explodir Hiroxima ou invadir o Iraque. A música tem um enorme poder transformador, quase imediato. É uma das poucas artes, senão a única, capaz de nos fazer mexer o corpo, de nos pôr a dançar, de provocar a catarse ou o êxtase. (…) O programa americano pode ter falhado – o Muro só viria a cair muitos anos depois -, mas a esperança que esteve na sua base, ainda que utópica, não deixa de ser maravilhosa: a possibilidade de uma guerra poder terminar num baile em vez da explosão de bomba de hidrogénio.

Sobrevivi a quatro mil toneladas de bombas atiradas contra Dresden, sobrevivi ao Holocausto, sobrevivi ao capital e aos programas de televisão. Sobrevivi. Ou seja, tenho vindo à tona, como uma baleia. Mas a maldade, de alguma maneira aberrante e perversa, é uma espécie de estrume. E a vida, por mais incompreensível que seja na sua génese e no seu cumprimento, nasce disso, da terra, do barro, da lama, da merda, se me permite a expressão, faz-nos medrar, e eu, envergonhado, contido, penso que é a maldade a terra mais fértil para a bondade e que o contacto com o fel faz nascer a coisa mais doce. Acho que todos mudamos em contacto com o mal. É o motor. Sei que é horrível, mas o que fazer? Todos os dias rezo para que o mal não deixe de aparecer na minha vida, ao mesmo tempo que o abomino. Adonai, afastai de mim todo o mal, Adonai, aproximai de mim todo o mal. Quando deixar de o fazer, de sentir a corrupção, quando não detectar o mal à minha volta, mais vale estar morto.

Se Tristan soubesse verbalizar as suas emoções, seria assim: Estou à espera de que a felicidade comece a crescer como os bebés no útero das mãos e que um dia nasça e chore e queira mamar e nós eduquemos a felicidade e a levemos à escola para que saiba ler as letras das nossas veias e fazer contas de multiplicar com a nossa saliva, estou à espera de um beijo daqueles que são dirigidos somente a uma pessoa, e não daqueles que se dão a pensar em alguém que está longe, estou à espera que o dia chegue ao fim e que não comece outro, porque os dias são uma chatice. Mas Tristan não saberia verbalizar as suas emoções, portanto: 

– Ia comer primeiro.

(…) eram isso os fantasmas, restos das pessoas que amámos, e a nossa casa ficava assim, repleta de assombrações modernas e antigas, densas e subtis. Tínhamos um protocolo com a memória, tínhamos assinado, juntamente com a dádiva da vida, o compromisso de carregar os mortos no nosso corpo, nos móveis da casa, nas paredes e na luz esmaecida dos candeeiros de estanho e de cobre, e cumpríamos esse contrato com um rigor e uma ética absolutamente notáveis, a ponto de, tantas vezes, chorarmos sem qualquer razão aparente.

PS: Este texto só foi possível escrever não por causa do jazz, mas por causa do novo disco do André Barros – In Between.

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