Albert Camus – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Mon, 25 Aug 2025 09:02:57 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.9 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Albert Camus – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 Opinião: A Morte Feliz, de Albert Camus https://branmorrighan.com/2019/03/opiniao-morte-feliz-de-albert-camus.html https://branmorrighan.com/2019/03/opiniao-morte-feliz-de-albert-camus.html#respond Fri, 15 Mar 2019 11:39:00 +0000
A Morte Feliz

A Morte Feliz
Albert Camus

Editora: Livros do Brasil

OPINIÃO: Ler Albert Camus é sempre uma experiência intensa. Sempre que o li fiquei com aquela sensação agridoce que nasce do confronto a que o autor nos obriga a ter com a nossa percepção da vida, da felicidade e de como atingi-la. A Morte Feliz é um pequeno livro resgatado dos apontamentos do autor. Foi editado já após a sua morte e, por isso, não contém uma linha narrativa muito sólida. No entanto, os fragmentos que se conseguiram alinhar são suficientes para se dissertar eternamente sobre a obra.

As primeiras páginas deixaram-me logo em sentido de alerta. Tomando consciência que estes fragmentos foram escritos em tão tenra idade leva-nos ao reforço da constatação que Camus não era um ser humano comum. Abordando a morte e a felicidade com um pragmatismo estonteante, chega a ser quase cruel a forma como A Morte Feliz quebra certas ilusões.

Claro que tudo o que está relacionado com existencialismo é sempre subjectivo, mas a verdade é que Camus, através do errante Patrice Mersault, esfrega-nos na cara a dura verdade da pescadinhas de rabo na boca: para se ser feliz é preciso ter tempo -> para se ter tempo é preciso ter dinheiro -> para se ter dinheiro é preciso trabalhar -> trabalhar para ganhar dinheiro suficiente para ter tempo ocupa-nos o tempo todo. Aqui o ciclo fecha-se e a felicidade parece impossível para aqueles que têm de se matar a trabalhar para ter o tal dinheiro que pode nunca chegar e por isso o tempo para se ser feliz parece também ele uma miragem. 

Outro ponto muito importante abordado neste livro, é a importância de estarmos conscientes de nós mesmos, do que queremos para nós, em vez de nos agarrarmos ao que é superficial. Dividido em duas partes – Morte Natural e Morte Consciente – o autor leva-nos por um caminho em que passamos de uma certa alienação para a consciência do que nos rodeia e da nossa própria solidão enquanto veículo de tomada dessa mesma consciência.

Não obstante o caminho sinuoso traçado ao longo destas páginas, entre o apego desinteressado e a urgência de significado, o protagonista acaba satisfeito com a vida que levou. Confesso que não consigo imaginar uma vida em que alguém encontra paz depois do que aconteceu entre Mersault e Zagreus (o personagem impulsionador de toda esta história), e portanto nem sempre me senti alinhada com algumas das atitudes e pensamentos de Mersault. 

Não tirando qualquer mérito desta narrativa, devo alertar quem decidir ler este livro que por vezes a leitura pode tornar-se um pouco arenosa. Mas vale a pena prosseguir e fazer o caminho completo. Nutro uma profunda admiração por este autor e sou da opinião que qualquer amante literário deveria ler pelo menos uma das suas obras. Talvez esta não seja perfeita para começar, mas é sem dúvida uma leitura fundamental na contribuição da discussão sobre a existência humana. 

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Opinião: O Estrangeiro, de Albert Camus https://branmorrighan.com/2016/05/opiniao-o-estrangeiro-de-alberto-camus.html https://branmorrighan.com/2016/05/opiniao-o-estrangeiro-de-alberto-camus.html#respond Sun, 08 May 2016 20:21:00 +0000

O Estrangeiro

Albert Camus

Editora: Porto Editora

OPINIÃO: Depois de uma série de leituras em que o suicídio era um tema presente, eis que a minha intuição me levou a pegar n’O Estrangeiro. Não sabia bem ao que ia, nunca tinha lido nada de Albert Camus, mas avisaram-me logo para me preparar, pois seria uma leitura estranha. Tudo bem, nada a que não esteja habituada e que de certa forma até cria sempre um desafio para mim.

A questão com O Estrangeiro é que ele traz consigo todo um peso de fama por ser não só considerado um clássico como por o seu autor ter sido Prémio Nobel da Literatura. Quando pegamos num livro com estas características convém que as expectativas sejam moderadas ou nenhumas, pois caímos no risco de sairmos desiludidos por algum enviesamento dispensável. Foi mais ou menos nessa mentalidade que então abri o livro.

O prefácio, por António Mega Ferreira, desvenda logo mais do que o que seria desejável, mas findado o livro, e relido o prefácio, é um bom complemento à obra. Entrando na história de Meursault, rapidamente nos apercebemos do absurdo literal que é a sua maneira de ver o mundo. Sem qualquer conotação crítica positiva ou negativa, cada momento na sua vida é declarado e enfrentado, pois não existe o conceito de contemplação aqui, com a simplicidade dos factos, deixada de parte a emoção.

Enquanto leitora, fui sentindo uma certa dualidade emocional. Se por um lado a sua ausência de julgamento, encarando apenas o que é como apenas o que é, lhe atribuía uma certa simplicidade e até castidade, por outro custou-me imaginar um mundo onde após a morte de uma mãe não se sentisse qualquer tipo de emoção, que após um pedido de casamento o pensamento fosse que tanto fazia, que quando declarado culpado de um homicídio não tivesse qualquer vontade de se defender por achar que não valia a pena.

A escrita de Camus é também ela despejada de grandes adornos, a forma como todo o romance está escrito revela um sentido prático que se reflecte nas acções do seu protagonista e também na forma como o sentido da existência é abordado enquanto um certo absurdo, uma certa frieza e quase despersonalização em relação aos actos e às respectivas consequências.

Não chega a uma centena de páginas, lê-se rápido e bem, mas quando cheguei ao fim senti alguma incompletude. Não tem a ver com o ter gostado ou não do final que o autor deu ao livro, mas antes porque talvez, como qualquer ser humano, procurasse um sentido ali que não existe e que também reforça o enredo montado.

Se para Meursault que era tão simples e aceitava praticamente tudo sem contestar a vida não se tornou mais fácil, imaginem para todos aqueles que se questionam dia após dia, que se colocam em causa e que pensam sempre duas vezes antes de qualquer coisa. Talvez nem um nem outro estejam certos, mas O Estrangeiro dá-nos uma perspectiva interessante de como terceiros reagem a este alheamento complexo da vida. E essa reacção resulta sempre em condenação. 

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