Banda Desenhada – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Sun, 12 Sep 2021 11:09:11 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.9 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Banda Desenhada – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 Opinião: Balada para Sophie https://branmorrighan.com/2021/09/opiniao-balada-para-sophie.html https://branmorrighan.com/2021/09/opiniao-balada-para-sophie.html#comments Sat, 11 Sep 2021 20:26:17 +0000 https://branmorrighan.com/?p=25159
Balada para Sophie

Balada para Sophia
Filipe Melo & Juan Cavia

Editora: Companhia das Letras

Opinião: Quem é que decide o que temos ou não direito de fazer? A nós mesmos, ao próximo… Muitas vezes vivemos cada dia como um prolongamento do anterior e em antecipação ao próximo, muitas vezes enfiados nas nossas cabeças, nas nossas ambições, no que achamos urgente atingir, no que achamos que pode ficar para depois. Balada para Sophie é uma espécie de quinta-essência por variadíssimas razões. Muitas delas já foram apontadas noutros textos: Filipe Melo escreveu um argumento sublime, provocando o subconsciente, incandescendo o consciente, tudo envolto numa beleza triste e enternecedora; Juan Cavia na sua arte deu uma vida e um assombro perfeitos a esta dinâmica que flui entre a memória e oblívio.

Honestamente não vou falar sobre os personagens em particular porque já existem vários textos (incluindo a sinopse) que se dobram sobre a análise dos mesmos, e porque o que ainda estou a exorcisar (no bom sentido) é uma sensação de quarto escuro em que nos enfiamos nas nossas lutas interiores e em que a sensação de entitlement e o sentido de obrigação digladiam até nos exaurir, movendo um véu que consegue ser tão ténue.

Confesso, com embaraço, que é a primeira vez que vivo algo composto por Filipe Melo e Juan Cavia. Digo viver em vez de ler porque é uma preciosidade rara encontrar arte e texto conjugados e entrelaçados de forma tão visceral. A experiência tomou de assalto todos os meus sentidos, incluindo os interiores – a dor, a compaixão, a desilusão, o amor, a carência, o arrependimento, a saudade, a esperança e por fim a surpresa, sem ser realmente uma surpresa.

Enquanto estive nos Estados Unidos, antes de a pandemia nos mandar a todos para casa, tive o privilégio de assistir a algumas óperas, incluindo La Traviata (que por alguma razão me veio à cabeça a certa altura). Não sei se vocês já assistiram a alguma ópera, mas para mim é uma experiência incrível. E refiro isto porque quando fechei Balada para Sophie pensei, na minha ignorância sobre a tangibilidade das adaptações, que daria uma das mais belíssimas óperas de sempre. Não um filme, não uma curta, uma ópera com todo o ambiente onírico que esta consegue evocar.

Tendo em conta toda a sua musicalidade e movimento e a composição de Filipe Melo em piano para Balada para Sophie, houve parte de mim que se transportou para uma qualquer sala a projectar a arte gráfica de Juan Cavia animada por figuras de uma performance intensa e hipnotizante. E o fim! O fim deste livro…! A ironia da vida. O universo a manifestar as suas subtilezas mais brutais.

Resumindo e concluindo: sinto que poderia ficar horas a escrever sobre o livro. Sobre os seus pontos de luz e de escuridão, sobre o incrível trabalho gráfico que nos suga e subjuga intensificando as emoções provocadas pela narrativa, sobre a magia que existe à sua volta, incluindo os seus abismos… Existem muitos adjectivos positivos que podem ser atribuídos a Balada para Sophie. No entanto, fundamentalmente considero que este é um livro que coloca a nu o ser humano e a sua complexidade.

Vocês sabem que eu quando gosto mesmo muito de um livro escrevo coisas talvez sem sentido porque ainda sai tudo muito de coração nos dedos. Já passaram duas semanas desde que terminei a leitura de Balada para Sophie, já lhe quis pegar novamente, mas opto por o manter por perto. Não sei se para me recordar, se para me alertar. O que sei é que se junta a A Ridícula Ideia de Não Voltar a Ver-te e a Nem Todas as Baleias Voam como obras que irei para sempre recomendar.

Dito isto, encontrem Balada para Sophie, comprem/aluguem/o-que-for, percam-se nele. Vale completamente a pena. E, honestamente, vale o dinheiro (comprei o meu, não foi oferecido). Deixo-vos com um vídeo que encontrei de Filipe Melo a tocar o tema que compôs e cujas pautas se encontram no final da obra. Parabéns, Filipe Melo e Juan Cavia, sem dúvida que esta é mais uma obra que vos torna imortais.

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Sugestões de Natal, por João Morales: Mar de Aral, de José Carlos Fernandes e Roberto Gomes https://branmorrighan.com/2019/11/sugestoes-de-natal-por-joao-morales-mar.html https://branmorrighan.com/2019/11/sugestoes-de-natal-por-joao-morales-mar.html#respond Wed, 20 Nov 2019 02:30:00 +0000

Mar de Aral

José Carlos Fernandes (argumento) e Roberto Gomes (desenhos)

Comic Heart/G Floy Studio – Portugal

72 págs

14 euros

Foi distinguido no Prémio nacional de Banda Desenhada (no Amadora BD), vencendo as categorias de Melhor Argumento de Autor Português e Melhor Obra de Autor Português. Conquistou os três prémios para que estava nomeado nos Galardões BD Comic Com 2019: Melhor Argumento (para José Carlos Fernandes), Melhor Desenho (para Roberto Gomes) e Melhor Álbum de Autor Português. Mar de Aral é o regresso de José Carlos Fernandes (argumentista), aqui acompanhado pelo desenhador Roberto Gomes, trazendo à luz do dia um álbum há muito elaborado. A qualidade, essa, é aquela a que o autor já nos habituou há muito.

O conjunto de histórias que compõem este álbum começa com uma narrativa que dá nome ao livro. Mas antes da ficção, os factos. O Mar do Aral era um lago, entre o Cazaquistão e o Uzbequistão, com cerca de 66 mil km2. Nos anos 60, a URSS desviou os rios que alimentavam a região, para irrigar plantações de algodão. O volume da água diminuiu, mas o sal ficou prejudicando o solo e matando os peixes.

Na versão de JCF os peixes sofreram uma adaptação, uma metamorfose com laivos de Lovecraft que introduz o Fantástico, elemento comum a todas estas histórias. “Um boi sobre o telhado”, “Roupas de defunto”, “A Inauguração do canal do Panamá” e “A arte esquecida de nadar rio acima”, completam o leque de discretos delírios que perfazem, este puzzle.

Em certa medida, a última narrativa, está em sintonia com o trabalho de Engenharia Florestal que, em tempos, ocupou os dias de JCF. Trata-se de uma escola para salmões, onde estes peixes são instruídos para nadarem contra corrente, rio acima, portanto. O cenário é um prodígio de cenografia, quase uma ironia sobre M.C. Escher, confirmando os méritos de Roberto Gomes, bem expressos na diversidade de registos elencados neste livro (como a inteligente mudança na primeira história, quando se passa do deserto para o bar). Roberto, que foi em tempos aluno de JCF, revelou-se o parceiro ideal para concretizar um livro que, no fundo, já existia há vários anos, aguardando apenas autorização do argumentista (arredado da BD e quejandos) para avançar. Mar de Aral foi co-editado pela Comic Heart/G Floy Studio – Portugal e pertence agora ao catálogo da recém-formada A Seita.

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[Divulgação] SAGA volume 9, Argumento de BRIAN K. VAUGHAN e arte de FIONA STAPLES https://branmorrighan.com/2019/11/divulgacao-saga-volume-9-argumento-de.html https://branmorrighan.com/2019/11/divulgacao-saga-volume-9-argumento-de.html#respond Thu, 07 Nov 2019 16:01:00 +0000

SAGA volume 9

Argumento de BRIAN K. VAUGHAN e arte de FIONA STAPLES

Reúne os #49 a #54 da série original de SAGA

Álbum, formato comic, 152 pgs a cores, capa dura. PVP: 14€

ISBN: 978-83-65938-69-5

SAGA narra a luta de uma jovem família para encontrar o seu lugar num universo vasto e hostil, e já foi descrito como um encontro entre a Guerra das Estrelas e Romeu e Julieta no espaço. E preparem-se para o mais chocante, surpreendente e impactante volume da série, cheio de acção e de violência há muito adiada, fake news e terror genuíno. Nada voltará a ser igual depois desta história!

O volume 9 de SAGA assinala vários marcos na edição da série. Saga chega à metade da sua… saga. Os autores anunciaram que a série teria mais 9 volumes para além deste, num total de 18 volumes (108 comics), a mais longa série que Vaughan já escreveu. Para além disso, os autores anunciaram que iam tirar umas férias (merecidas!), e por isso, o lançamento deste volume marca também o momento em que a edição Portuguesa apanho a edição Americana!

Agora resta-nos a todos esperar para que a série arranque de novo, até porque o final do vol. 9 é… traumático!

“Tentar escrever uma história de FC, mas fazê-lo com a complexidade moral e as zonas cinzentas dos conflitos reais foi muito educativo para mim. Penso muito na violência, e de como gosto dela na ficção, onde ela pode ser bela e divertida e catártica. Mas a violência no mundo real é universalmente estúpida e imoral e horrível… como é que juntamos estes dois conceitos opostos? A resposta tem muito que ver com a conclusão que estamos a tentar explorar.”

Brian Vaughan, entrevista à Entertainment Weekly

Fantasia e ficção científica – e sexo, traição, morte, amor verdadeiro e vinganças obsessivas – juntam-se como nunca antes neste épico subversivo e provocante do escritor Brian K. Vaughan e da artista Fiona Staples, que questiona incessantemente as narrativas e preconceitos do nosso tempo através do contraste com o seu mundo surreal e bizarro.

SAGA já venceu doze Prémios Eisner, um Hugo para Melhor História Gráfica, e uns incríveis dezassete Harveys.

Link para imagens da capa e de páginas do interior:

https://jc63iv.s.cld.pt

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Em Março, pela GFloy Portugal: Astonishing X-Men Livro Dois https://branmorrighan.com/2019/03/em-marco-pela-gfloy-portugal.html https://branmorrighan.com/2019/03/em-marco-pela-gfloy-portugal.html#respond Sun, 24 Mar 2019 18:57:00 +0000

OS SURPREENDENTES X-MEN: LIVRO DOIS

Argumento de JOSS WHEDON e arte de JOHN CASSADAY


O final de uma das mais célebres e aclamadas fases dos X-Men, criada por dois dos pesos pesados dos comics!

Reúne os comics Astonishing X-Men #13-24 e Giant-Size Astonishing X-Men #1 (correspondentes às histórias Torn e Unstoppable)

Álbum, formato deluxe (19 x 28), 344 pgs a cores, capa dura. PVP: 28€

ISBN: 978-84-16510-94-8

A épica série de Joss Whedon e John Cassaday conclui neste volume que reúne as sagas: Destroçados e Imparável! Na primeira história, o comportamento errático de Emma Frost está à beira de ser desvendado, quando o novo Clube do Inferno entra finalmente em acção contra os X-Men, depois de meses de se esconderem dos olhares dos mutantes do Instituto Xavier. E na segunda história, os X-Men têm de partir para o perigoso mundo Ruptura, naquela que será a sua última oportunidade de proteger a Terra dum terrível ataque. E, quando tudo acabar, nada será como dantes!

Quando esta série dos X-Men começou, em 2004, a crítica era unânime que seria difícil para a nova equipa igualar a fase anterior, escrita por Grant Morrison. Mas, com o passar dos anos, Astonishing X-Men de Joss Whedon e de John Cassaday tornou-se num dos maiores clássicos de sempre dos mutantes da Marvel. As duas fases são perfeitamente distintas, mas de algum modo complementam-se, e é adequado que Whedon siga Morrison na continuidade. Grant Morrison é um dos grandes “desconstrutores” de super-heróis dos comics, Whedon é um dos seus maiores fãs. Morrison destruiu e arrasou parte do mundo dos mutantes, Whedon reconstruiu a equipa e voltou a dar-lhe um propósito. E se Morrison puxou os X-Men um pouco para o realismo, Whedon procurou devolvê-los às suas origens como super-heróis – e escreveu uma das mais potentes cartas de amor aos X-Men de todos os tempos.

Combinando uma saga típica de mutantes, com inimigos tradicionais como o Clube do Inferno, conflitos conhecidos e recorrentes, a caça aos mutantes, a discriminação, os eternos triângulos amorosos entre X-Men, alguns deles… telepáticos? – com uma incrível saga de ficção-científica ao “estilo Joss Whedon”, Astonishing X-Men é também uma história que vai aprofundar tremendamente a caracterização de alguns dos maiores heróis da Marvel: a história da redenção e ressurgimento de Ciclope, da humanização de Emma Frost, e sobretudo, mais que todos os outros, é a história de Kitty Pryde, do seu regresso, da sua história de amor com Colossus, e do seu destino final.

“Poderá dizer-se que estas histórias já foram contadas… E se isso é inegável, parece-me que nunca tinham sido contadas desta forma. Na verdade, Whedon fez deste regresso dos X-Men, ocupados com a reconstrução do grupo e da sua escola e a braços com um invulgar inimigo, um dos arcos mais interessantes dos últimos anos. De sempre, na minha óptica.”

Pedro Cleto, AsLeiturasdoPedro.com

Nomeada para inúmeros prémios Eisner, venceu em 2006 o prémio para Melhor Série em Continuação, e por duas vezes, em 2005 e 2006, o prémio foi para Cassaday como Melhor Desenhador.

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Recensão: Luzes de Niterói,de Marcello Quintanilha (Argumento e desenhos) https://branmorrighan.com/2018/11/recensao-luzes-de-niteroide-marcello.html https://branmorrighan.com/2018/11/recensao-luzes-de-niteroide-marcello.html#respond Mon, 26 Nov 2018 19:43:00 +0000

Luzes de Niterói

Marcello Quintanilha (Argumento e desenhos)

Polvo

232 págs

20 euros

Por João Morales

A primeira reacção que um leitor habitual do trabalho de Marcello Quintanilha (sem dúvida, um dos mais importantes autores de BD do momento) pode ter ao entrar em contacto com o seu mais recente trabalho, Luzes de Niterói – que tive o prazer de apresentar em estreia internacional, durante a edição de 2018 do Amadora BD–Festival Internacional de Banda Desenhada da Amadora – é uma percepção de como a sua arte cria ligações cada vez mais estreitas com o Cinema. Isto, no ano em que conhecemos Tungsténio, adaptação para a Sétima Arte do seu livro homónimo.

São várias sequências em que o autor (desenhador e argumentista) recorre a diversas vinhetas num mesmo movimento de personagens, acentuando a faceta de movimento, aproximando o registo desenhado e a concepção que temos de um movimento em tempo real.  Depois, há outras facetas, como a utilização da perspectiva com a segurança de uma máquina de filmar. Tome-se como mero exemplo a página 70, com o paralelismo entre a ascenção de Hélcio à superfície e o olhar para pai, de baixo para cima, num ângulo picado.

Este livro é a história de uma amizade, entre Hélcio e Noel (carinhosamente designado como Calunga). O primeiro é a recriação do pai do autor, igualmente futebolista, carreira nascida no seio dos clubes operários. O segundo surge marcado por uma evidente e acentuada deformação física que, no enanto, não o impede de acompanhar o companheiro nas aventuras do quotidiano. O cenário temporal é a década de cinquenta, num Brasil lançado na confusão pelo suicídio do Presidente, Getúlio Vargas. A época e o seu significado pessoal já tinham sidos abordados no primeiro livro de Marcello, Fealdade de Fabiano Gorila, inicialmente publicado no Brasil, em 1999, com o pseudónimo de Marcello Gaú, hoje igualmente publicado em Portugal.

A narrativa assenta na estrutura de um épico, evocando modelos clássicos intemporais. Os dois amigos partem para o mar (o pretexto é um avantajado cardume de peixe), deparando-se com diversos perigos e obstáculos. Em terra, aguarda-os um dos encontros mais importantes da vida de Hélcio, a contratação para um clube maior. 

Logo no início, Hélcio persegue um peixe, debaixo de água, testando e desafiando os seus limites. E aí começamos a entender melhor a arquitetura do livro. Se o confronto entre o atleta e o peixe nos remete para um dos grandes textos de Ernest Hemingway, O velho e o Mar, a persistência de Hélcio no encalce da sua presa é esclarecedora. No campo, em ambiente de Futebol, a sua posição é de defesa, algo designado no Brasil como beque. A sua função seria parar o adversário e passar a bola aos avançados para que eles concretizassem o golo. Mas ele não faz nada disso, avança campo fora, com a bola nos pés, tentando ser ele a concretizar. Como já se disse, testando e desafiando os seus limites. O padrão reflecte um traço essencial de personalidade e uma postura de vida. Hélcio não está disposto a reduzir-se à condição que a vida preparou para si. Quer mais e melhor. Sem medir os riscos.

Esse mergulho profundo atrás do peixe é o momento em que Hélcio reflecte sobre o seu passado, o seu percurso, as suas circunstâncias. Marcello Quintanilha aproveita o sossego do fundo do mar para nos introduzir no universo do seu personagem.

O texto, ambientado na sua época, é um repositório constante de calão de época. Expressões como “puxar o crocodilo”, “deixando a zaga na mão”, termos como “curriola” ou “xipófagos” ou um personagem como Manuel Isopor (termo para esferovite) fixam terminologias e modos de falar que são reflexo de uma época e de uma região. Também nessa dimensão antropológica o livro de mostra pertinente.

Hélcio e Noel formam uma dupla que se complementa, e também aqui cabe recordar algumas figuras icónicas. D. Quixote e Sancho Pança, Bouvard e Pécuchet ou Vladimir e Estragon são apenas alguns exemplos deste modelo. Hélcio e Noel funcionam quase com um espelho; os pontos fortes de um reflecetem-se nas fraquezas do outro. Numa análise quase psicanalítica seriam como um alter-ego simbólico, um do outro. Contudo, é importante recordar que ambos existiram, Noel foi, efectivamente, um dos grandes amigos de Hélcio Carneiro Quintanilha, pai do autor de BD. 

Marcello apresenta diversas opções gráficas que justificam o seu talento. As cenas passadas debaixo de água têm, naturalmente, uma gama cromática bem definida e distinta da realidade à superfície. Quando vemos Hélcio nadando na linha de água, a relação entre as duas realidades, sublinha as palavras que mentalmente debita ao mergulhar: “não era a sensação de entrar na água, quer dizer… era entrar na água… mas ao mesmo tempo não era isso o que o Hélcio sentia… que ele estava entrando na água… mas que ele estava saindo do mundo”. As onomatopeias são reproduzidas graficamente, autêntica banda sonora da narrativa. Da mesma forma, a utilização das filacteras com um delineamento diferenciado, consoante o volume da voz – do diálogo cordato aos gritos mais lancinantes, como durante a tempestade – cria um código visual que permite imediatamente ao leitor estabelecer uma afinidade com a situação e as suas implicações.

O regresso à costa, depois das agruras ultrapassadas, remete para o mito de Ulisses, o herói que retorna a casa e é recebido com o apreço dos vitoriosos e a alegria da sobrevivência. Hélcio assume o seu lugar no mundo do Futebol, mas a viagem deixou marcas profundas, quer nele, quer no seu amigo de sempre. O primeiro momento de glória pública do desportista coincidirá com um paroxismo privado de Noel, acentuando novamente o efeito de relação entre os dois. Passados ligados e futuros ligados. 

Um livro que assenta no domínio pleno da técnica narrativa da BD, influenciado por alguns momentos clássicos da literatura ocidental. Uma história que poderia ter por epígrafe os versos iniciais de um poema de Alexandre O’Neill: «Mal nos conhecemos/ inaugurámos a palavra “amigo».

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Em Outubro, pela G Floy Portugal: MOONSHINE vol. 1: Sangue e Whisky https://branmorrighan.com/2018/10/em-outubro-pela-g-floy-portugal.html https://branmorrighan.com/2018/10/em-outubro-pela-g-floy-portugal.html#respond Sun, 07 Oct 2018 17:29:00 +0000

MOONSHINE vol. 1: Sangue e Whisky

Argumento de BRIAN AZZARELLO e arte de EDUARDO RISSO

Formato comic deluxe (19 x 28), capa dura, 152 pgs. a cores.

PVP: 14€

ISBN: 978-84-16510-81-8

Há coisas que vão sempre bem juntas, como café e bolachas de chocolate, bife e batatas fritas, ou Brian Azzarello e Eduardo Risso, uma das duplas de argumentista e artista mais famosas nos comics, que formam uma parceria que dura há já duas décadas. E Moonshine é a sua nova série independente, uma colaboração que iniciam num comic que nos levará pelos anos 1920 e a Era da Proibição, com gangsters, traficantes, e… lobisomens?

Durante a Proibição, Lou Pirlo, um gangster de Nova Iorque a soldo de um dos maiores reis do crime da cidade, tem de viajar para os isolados Montes Appalachia e descobrir um fornecedor de bebida ilegal. Mas o que ele descobre na realidade, é um terrível segredo sobrenatural que não pode nunca ser revelado à luz do dia, ou melhor… nunca poderá ver a luz da lua cheia!

AUTORES

Brian Azzarello é um hoje um dos mais conhecidos argumentistas dos comics americanos. A sua carreira iniciou-se na Vertigo, e um dos seus primeiros sucessos foi Johnny Double, que marcou também a sua primeira colaboração com Eduardo Risso, e que levaria pouco tempo depois ao lançamento de 100 Balas, talvez a mais conhecida obra desta dupla. Depois de muitos anos de trabalhos diversos para as principais editoras americanas, DC e Marvel, notabilizou-se mais recentemente pela sua colaboração com Frank Miller em The Master Race, a saga de Batman que é a conclusão de O Regresso do Cavaleiro das Trevas.

Quanto a Eduardo Risso, já tinha construído uma longa carreira de sucesso na sua Argentina natal e na Europa, com destaque para os mercados italiano e espanhol, mas depois de ter ilustrado Johnny Double para Azzarello, o bom entendimento entre ambos levou a que iniciassem a série 100 Balas, que os propulsou para o estrelato dos comics. Ao longo dos anos colaborou extensamente com Azzarello, embora tenha também assinado álbuns para outros escritores, de que um bom exemplo é Wolverine: Logan, publicado pela G. Floy, com argumento de Brian K. Vaughan. Em 2018, Risso desenhou também o primeiro álbum de Torpedo em quase quinze anos, e neste Moonshine assina também as cores.

Nos EUA o segundo volume da série sai em finais de Outubro deste ano, e tem lançamento previsto em Portugal no Verão de 2019. E qual o futuro para Moonshine? Azzarello afirmou recentemente que, “planeámos uns 30 números da série, até agora. Não quer dizer que não haja material e histórias para contar suficientes para estender Moonshine muito para além disso… mas acho que nunca haverá outro 100 Balas. Um é suficiente!”

IMPRENSA

“Moonshine tem uma atmosfera que nos assombra e seduz, e que torna a história tão cativante quanto misteriosa. Azzareloo e Risso conseguiram criar mais um best-seller!”

IGN

“Um livro quase perfeito.”

Nerdist

Link para a capa e páginas de amostra do interior:

https://nvkna0.s.cld.pt

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Opinião: O Jogador de Xadrez, Adaptação do romance de Stefan Zweig, por David Sala https://branmorrighan.com/2018/09/opiniao-o-jogador-de-xadrez-adaptacao.html https://branmorrighan.com/2018/09/opiniao-o-jogador-de-xadrez-adaptacao.html#respond Sat, 15 Sep 2018 12:49:00 +0000

O Jogador de Xadrez 

de David Sala (adaptado do romance de Stefan Zweig)

Editora: Levoir/Público

Sinopse: Nos tranquilos salões de um paquete em viagem para a Argentina, o campeão do mundo de xadrez defronta numa última partida, a um aristocrata vienense cujo incrível domínio do jogo nasceu do isolamento forçado, durante o domínio nazi. Esta denúncia esmagadora e desesperada da barbárie nazi, foi o último texto escrito por Stefan Zweig antes de se suicidar, a partir do qual David Sala realizou esta adaptação que a revista L’Express classificou como sumptuosa.

OPINIÃO: Quando li Novela de Xadrez, original de Stefan Zweig, o impacto foi tão forte que a história ecoou durante muito tempo na minha cabeça. Na altura escrevi sobre o mesmo neste link, portanto vou-vos poupar à repetição do que achei sobre o livro. Ainda assim, há dois factos que merecem ser relembrados: Novela de Xadrez foi o seu último romance antes de se suicidar, todo o ambiente está envolto numa série de obsessões. Adaptar esta obra a banda desenhada seria tudo menos uma tarefa fácil. Nas mão de David Sala, parece que foram feitos um para o outro. 

Não sou perita em análises de banda desenhada, tal como não sou de romances, portanto à semelhança do que faço com estes últimos, quando escrevo sobre uma banda desenhada exploro apenas a forma e a dimensão que a história toma na minha cabeça quando aliada a expressões gráficas específicas. Uma coisa é lermos um romance e imaginarmos os cenários na nossa cabeça. Outra coisa é termos precisamente todos esses contornos já definidos. Por vezes achamos que qualquer representação gráfica fica aquém da nossa imaginação. Neste caso, David Sala fez um belíssimo formato tanto na opção do traço do desenho, como com as cores que utilizou. 

Conseguir explorar um tempo que já não é o nosso, ao mesmo tempo que se tem a responsabilidade de reproduzir todo o lado emocional, que é caracterizado por um crescendo cada vez mais pesado, do protagonista, foi de mestre. A escolha das perspectivas, os pormenores aumentados, a velocidade que por vezes foi impingida no avanço da história, faz e O Jogador de Xadrez uma belíssima obra de arte. Não posso falar pelo autor original, mas sendo fã da sua escrita, penso que melhor representado seria difícil. 

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Opinião: Dragomante, de Filipe Faria e Manuel Morgado https://branmorrighan.com/2018/08/opiniao-dragomante-de-filipe-faria-e.html https://branmorrighan.com/2018/08/opiniao-dragomante-de-filipe-faria-e.html#respond Wed, 29 Aug 2018 10:33:00 +0000

Dragomante

Filipe Faria e Manuel Morgado

Editora: G Floy Portugal

Sinopse: Um Dragomante e um dragão são guerreiro e cão de guerra, aliados e amigos inseparáveis. Mas uma Dragomante pode ser cobiçada por vários dragões, que ela, em certas circunstâncias, pode a todos domar… No reino de Armitaunin, Nereila, uma jovem Dragomante, conclui por fim o seu árduo treino, juntamente com Ékión, o seu Escudeiro, que deverá protegê-la de qualquer perigo.. e de si mesma. Porque os Dragomantes, que defendem a humanidade da ameaça dos dragões, podem representar um perigo maior ainda que estes, se neles for ateado o fogo que lhes arde nas veias: o fogo de dragão. No caso de Nereila – a primeira mulher Dragomante em séculos – as consequências podem ser mais drásticas ainda, quando os pecados do seu pai regressam para a atormentar. E Ékión, o seu Escudeiro, não sabe se está à altura da tarefa – ou mesmo se deseja fazê-lo. E, se o fogo de dragão for ateado em Nereila, Armitaunin e o mundo inteiro poderão arder.

OPINIÃO: Sou nova nisto das bandas desenhadas, mas o que é certo é que lhe estou a tomar o gosto. Com a G Floy não só conheci a série Saga (uma das melhores experiências e da qual já comecei a falar aqui no blogue), como tive acesso ao universo Marvel com o qual só tomava contacto através de séries e filmes, entre outros. Um desses outros é esta estreia de Filipe Faria no universo BD. Ao contrário do que se poderia esperar, não é Manuel Morgado que o acompanha, mas o oposto. O artista Manuel Morgado já tinha as belíssimas ilustrações, faltava o argumento. Por isso mesmo, comecemos pelo início. 

A capa, só por si, chama logo à atenção. Eu sei que até nas BDs existe um pouco o preconceito de que o que é estrangeiro é que é bom, mas Manuel Morgado encosta muitos a um canto com o seu traço e a palete de cores que utiliza para expressar a sua imaginação. Os cenários, que vão de paisagens a cenas bélicas, parecem ganhar uma dimensão multi-dimensional. Sendo um universo populado por dragões, dragomantes (guerreiros que conseguem criar um laço com dragões “domando-os”) e escudeiros, é de louvar o realismo, a emotividade e a agressividade bem conseguidos. Com páginas com esta qualidade, a tarefa hercúlea era agora a de construir um argumento que acompanhasse este sangue na guelra criativo.

Tarefa, talvez injusta, que coube ao escritor português Filipe Faria. A associação ao contexto pareceu-me evidente, quem conhece os universos literários criados pelo escritor português sabe que ele já conta com milhares de páginas em descrições de batalhas, campos de guerra e personagens femininas potencialmente “problemáticas”. Nem sempre achei a narrativa, principalmente os diálogos, extraordinários, mas para a introdução do universo e dos conceitos subjacentes foi suficientemente bom para querermos virar página após página o mais rapidamente possível para desvendarmos a intriga. A dupla portuguesa está de parabéns e, havendo próximos volumes, tem todo o potencial para criar uma série memorável. 

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Opinião: Ms. Marvel (Vol 1 – Fora do Normal), de G. Willow Wilson e Adrian Alphona https://branmorrighan.com/2018/08/opiniao-ms-marvel-vol-1-fora-do-normal.html https://branmorrighan.com/2018/08/opiniao-ms-marvel-vol-1-fora-do-normal.html#respond Mon, 27 Aug 2018 16:40:00 +0000

Ms. Marvel (Vol 1 – Fora do Normal)

G. Willow Wilson e Adrian Alphona

Editora: G Floy Portugal

Sinopse: “Ms. Marvel” é uma das mais prestigiadas e aclamadas séries lançada pela Casa das Ideias nos últimos anos. Nomeada para inúmeros Prémios Eisner, vencedora do Hugo para Melhor Romance Gráfico (2015) e do Prémio de Angoulême para Melhor Série (2016), Ms. Marvel rompeu com muitos dos cânones das aventuras da Marvel da era contemporânea, recuperando alguma da magia original de personagens adolescentes que estão a descobrir os seus poderes enquanto tentam sobreviver num universo confuso e cheio de confrontos! Kamala Khan é uma jovem adolescente muçulmana de Nova Jérsia, perfeitamente normal… até ao dia em que descobre que recebeu poderes extraordinários! Mas quem é realmente a nova Ms. Marvel? Uma simples adolescente muçulmana, indecisa entre dois mundos, o da América moderna e o do mundo tradicional do Islão? Uma inumana criada depois da explosão da Bomba Terrígena? Uma fã de Carol Danvers, a Capitã Marvel? Estará Kamala preparada para usar os seus tremendos poderes, e conseguirá ela perceber que com grande poder vem grande responsabilidade? Descubram tudo isso quando ela tomar o universo Marvel de assalto… ou pelo menos Nova Iorque e arredores! O processo de criação de Kamala Khan, a nova Ms. Marvel e a primeira heroína muçulmana da Marvel, não foi isento de controvérsia e mesmo hostilidade. A autora trabalhou com a editora Sana Amanat para definir as suas características e história de família, mas muitos fãs e os meios mais conservadores da sociedade americana opuseram-se à aparição desta heroína adolescente de Nova Jérsia. Mas a nova personagem era tão fácil de se gostar, simultaneamente ingénua, querida, teimosa, e perdida entre as suas obrigações familiares e o Islão e a moderna vida Ocidental, que foi muito bem acolhida pelos fãs e pela crítica, tendo sido comparada sobretudo com Peter Parker nos anos da Idade de Prata da Marvel, e mesmo considerada um símbolo de reconciliação entre tradições religiosas diferentes. 

OPINIÃO: Aqui está uma banda desenhada que promete conquistar. Não só temos uma heroína feminina, como temos uma protagonista com quem é fácil sentir uma empatia enorme. Kamala é filha de imigrantes, em Jersey, e carrega todo o legado de fazer parte de uma família religiosa muçulmana. Não obstante, é seu dever integrar-se na cultura ocidental, fazer amigos e ser a filha perfeita. O problema é que estes três factores parecem ser incompatíveis.

Como é que pode fazer amigos ou integrar-se se não pode sair com os colegas ou sequer estar presente em festas com bebidas alcoólicas? Kamala não se resigna com essa condição e decide fugir uma noite para se juntar a uma das festas. Rapidamente percebe que os seus supostos amigos descriminam a sua origem e as suas crenças, o que resulta na sua fuga da festa. Enquanto deambula a caminho de casa, é apanhada por uma névoa que a leva a delirar, enquanto deseja ser como a Capitã Marvel ou ter poderes especiais. Do que não estava à espera era de realmente ter obtido capacidades metamórficas assim que fica consciente.

A partir deste momento, a vida de Ms. Marvel torna-se no caos completo. Se por um lado assistimos a alguns estereótipos em relação à sua família, por outro lado é de enaltecer a Marvel por juntar dois em um: ter mais uma mulher no papel de super-heróis e explorar outras culturas. A junção de ambos resulta numa Kamala que tem um universo por explorar, mas muito mais a descobrir sobre si mesma e o seu papel na sociedade em que vive. Ao acompanharmos Ms. Marvel, somos obrigados e reconhecer que por vezes existem dimensões culturais que ignoramos e com as quais, por causa disso, podemos ser mais ou menos tolerantes. A cereja no topo do bolo é a tonalidade bem disposta com que estas aventuras são transmitidas. 

O grafismo está muito bem explorado e elaborado. Gostei muito dos enquadramentos, que tornam cada cenário mais palpável e real, o traço do desenho é realista quanto baste e a palete de cores usada também ajuda a que o desenrolar da acção seja vibrante. Também a G Floy Portugal está de parabéns por esta edição de luxo, de capa dura e qualidade de papel impecável. Sem dúvida que é uma banda desenhada que quero continuar a acompanhar. Sou aficionada pelo universo Marvel e, mesmo não tendo ficado completamente deslumbrada, acho que Ms. Marvel tem argumentos e aspectos positivos suficientes para prender a atenção de todo o tipo de leitores, dos mais miúdos aos mais graúdos. 

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Em Agosto, pela LEVOIR: O Jogador de Xadrez, de David Sala (adaptado do romance de Stefan Zweig) https://branmorrighan.com/2018/08/em-agosto-pela-levoir-o-jogador-de.html https://branmorrighan.com/2018/08/em-agosto-pela-levoir-o-jogador-de.html#respond Sun, 26 Aug 2018 11:23:00 +0000

Novela Gráfica Vol. 10 

O Jogador de Xadrez 

de David Sala (adaptado do romance de Stefan Zweig)

Tradução – João Miguel Lameiras

Prefácio – Pedro Vieira de Moura

Preço – 10,90€

Nº páginas – 136

cor

Capa dura

Formato – 220mm x 300mm

Nos tranquilos salões de um paquete em viagem para a Argentina, o campeão do mundo de xadrez defronta numa última partida, a um aristocrata vienense cujo incrível domínio do jogo nasceu do isolamento forçado, durante o domínio nazi. Esta denúncia esmagadora e desesperada da barbárie nazi, foi o l último texto escrito por Stefan Zweig antes de se suicidar, a partir do qual David Sala realizou esta adaptação que a revista L’Express classificou como sumptuosa.

Nascido em Décines, perto de Lyon, em 1973, David Sala não é estranho às adaptações à BD de obras literárias, pois com a colaboração de Jorge Zentner, publicou a serie Nicolás Eymerich, inquisidor, uma adaptação de uma novela de Valerio Evangelisti.

No site do Públicohttp://loja.publico.pt/products.php?product=Colec%C3%A7%C3%A3o-BD-Novela-Gr%C3%A1fica-IV-10-%252d-O-Jogo-De-Xadrez-%28David-Sala%29

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