Elizabeth Strout – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Mon, 28 Dec 2020 05:58:46 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.7.1 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Elizabeth Strout – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 Opinião: O meu nome é Lucy Barton, de Elizabeth Strout https://branmorrighan.com/2016/10/opiniao-o-meu-nome-e-lucy-barton-de.html https://branmorrighan.com/2016/10/opiniao-o-meu-nome-e-lucy-barton-de.html#respond Mon, 31 Oct 2016 12:30:00 +0000

O meu nome é Lucy Barton

Elizabeth Strout

Editora: Alfaguara

Sinopse: Lucy Barton está numa cama de hospital, a recuperar lentamente de uma cirurgia que deveria ter sido simples. As visitas do marido e das filhas são escasssas e pouco aproveitadas por Lucy. A monotonia dos dias de hospital é quebrada pela inesperada visita da mãe, que fica cinco dias sentada à sua cabeceira. Mãe e filha já não se falavam há anos, tantos quantos os que Lucy passou sem visitar a casa onde cresceu e os que a mãe passou sem a visitar em Nova Iorque, nem sequer para conhecer as netas.

Reunidas, as duas trocam novidades e cochichos sobre os vizinhos de infância de Lucy, mas por baixo da superfícies plácida da conversa de circunstância pulsam a tensão e a carência que marcaram a vida de Lucy: a infância de pobreza e privação no Illinois, a vontade de ser escritora e a desconfortável sensação de não pertencer a lado nenhum, a fuga para Nova Iorque e a desintegração silenciosa do casamento, apesar da presença luminosa das filhas. Com um passado que ainda a atormenta e o presente em risco iminente de implosão, Lucy Barton tem de focar para ver mais longe e para voltar a pôr-se de pé.

Mais do que uma história de mãe e filha, este é um romance sobre as distâncias por vezes insuperáveis entre pessoas que deveriam estar próximas, sobre o peso dos não-ditos no seio das relações mais íntimas e sobre a solidão que todos sentimos alguma vez na vida. A entrelaçar esta narrativa está a voz da própria Lucy: tão observadora, sábia e profundamente humana como a da escritora que lhe dá forma.

Opinião: Tenho de admitir, tenho sido sortuda com “os chamamentos” dos livros nas últimas semanas. Acontece que não tenho tido muito tempo para ler e o máximo que tenho conseguido é um livro por semana, a grande maioria do livro lido ainda no fim-de-semana. De Segunda a Sexta o meu dia vai muitas das vezes das 6h até perto da meia-noite e mesmo quando tenho tempo para ler antes de dormir, nunca é muito mais do que meia dúzia de páginas. A exaustão tem vencido sempre. Mas depois encontramos livros como o da semana passada, Cheio de Vida, de John Fante, ou este, O meu nome é Lucy Barton, de Elizabeth Strout. 

Na minha opinião, O meu nome é Lucy Barton é uma obra essencial. Não porque a autora ganhou um Pulitzer, mas porque nesta centena e meia de páginas consegue tocar em vários nervos que várias pessoas do sexo feminino têm como sensíveis. O que há de mais delicado que a relação entre uma mãe e uma filha. Por vezes temos aqueles casos em que mãe e filha são inseparáveis, confidentes, melhores amigas. Porém, também temos os casos em que a interacção entre ambas se torna uma espécie de tabu, com mais assuntos não falados do que aqueles que emergem, e mesmo estes últimos parecem quase forçados. 

A narrativa passa-se quase toda a partir da cama de hospital onde Lucy Barton se encontra e onde testemunhamos a sua mãe a passar noite após noite sentada numa cadeira de hospital, recusando-se a dormir numa cama de apoio ou noutro sítio que não ali. A sinopse é bastante reveladora quanto ao conteúdo do livro, mas mais do que a solidão e a carência sentida por parte de Lucy Barton, o que mais me marcou foram as suas ramificações e os seus reflexos na sua vida adulta. A protagonista teve uma infância que muitos poderão considerar traumática, cheia de zonas cinzentas, asfixiante e, por vezes, aterradora. Segundo a mãe, ainda assim ela foi a única que seguiu em frente e que conseguiu: tanto a sua irmã como o seu irmão parecem ainda presos a esses tempos. E Lucy reflecte sobre isso, ao mesmo tempo que salta entre o passado e o tempo pós-hospital. 

Em grande parte da escrita existe uma dor tão latente, tão visceral, que a ideia com que fiquei é que apesar da sua vida seguir em frente, ela não consegue parar de saltar entre os vários momentos da sua vida, bons e maus, reconstruindo o presente a partir do que sobreviveu de cada um desses momentos. Não é que ela não saiba quem é e qual o seu papel, apenas a sua história de vida está vividamente gravada no seu ADN. E depois temos ainda o papel invertido, se bem que pouco explorado, quando a relação com as suas filhas deixa de ser o que ela ambicionava que fosse. Foi a minha estreia a ler esta autora, não sei se existe alguma outra obra possivelmente relacionada com esta, mas que teria panos para mangas para outras ramificações, lá isso tinha. 

Uma coisa é certa. Tenho a certeza que diferentes pessoas terão diferentes interpretações de tudo o que está ali escrito. Acho, honestamente, que pode haver até casos de pessoas que ao se referirem a este livro pensam que se estão a referir a livros diferentes. Existe tanto por onde pegar, por onde analisar, se quisermos escrutinar a obra ao máximo, que no fundo o que é fascinante é que tudo isto é provocado numa história curta e directa. Deixo-vos com uma passagem com a qual penso que muitos amantes de literatura, escritores e/ou aspirantes a, se possam identificar:

(…) os livros trouxeram-me coisas. É aqui que quero chegar. Fizeram-me sentir menos só. E eu pensei: vou escrever e as pessoas não vão sentir-se tão sós!(Mas era um segredo meu. Mesmo depois de ter conhecido o meu marido, não lhe contei logo. Não conseguia levar-me a mim própria a sério. Só que levava. Secretamente, secretamente, levava-me muito a sério! Eu sabia que era escritora. Não sabia quão difícil seria. Mas isso ninguém sabe; e não importa.

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Citações Aleatórias #51 – Elizabeth Strout – O meu nome é Lucy Barton https://branmorrighan.com/2016/10/citacoes-aleatorias-51-elizabeth-strout.html https://branmorrighan.com/2016/10/citacoes-aleatorias-51-elizabeth-strout.html#respond Sun, 23 Oct 2016 19:04:00 +0000

Há momentos, hoje em dia, e a minha vida mudou tão completamente, em que olho para aqueles primeiros anos e dou por mim a pensar: não foi assim tão mau. Talvez não tenha sido. Mas também há momentos – inesperados – em que vou a andar por uma rua soalheira, ou vejo a copa de uma árvore vergar-se, ou um céu de Novembro a terminar no East River, e sou subitamente invadida pelo conhecimento de uma escuridão tão profunda que até me pode fugir um som da boca, e então entro na loja de roupa mais próxima e falo com uma desconhecida sobre o feitio das camisolas que acabaram de chegar. Este deve ser o modo como a maioria de nós navega pelo mundo, meio ciente, meio alheado, visitados por recordações que não podem ser verdade. Mas, quando vejo outras pessoas andarem com autoconfiança pela rua, como se estivessem completamente livres do terror, percebo que não sei como são os outros. Uma grande parte da vida parece especulação.

Elizabeth Strout, O meu nome é Lucy Barton

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