Manuel Jorge Marmelo – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Sun, 18 Apr 2021 15:07:23 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.8.3 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Manuel Jorge Marmelo – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 Recensão: Tropel, de Manuel Jorge Marmelo, por João Morales https://branmorrighan.com/2021/04/recensao-tropel-de-manuel-jorge-marmelo-por-joao-morales.html https://branmorrighan.com/2021/04/recensao-tropel-de-manuel-jorge-marmelo-por-joao-morales.html#respond Sun, 18 Apr 2021 15:07:21 +0000 https://branmorrighan.com/?p=25102

Tropel
Manuel Jorge Marmelo

Porto Editora
149 págs

Distopia? É melhor que sim…

Embora tentador, é difícil catalogar esta história como uma distopia, tal é a presença de elementos concretos e actuais, referências identificáveis por todos, e um assombroso desejo de que tudo não passe… de uma ficção.

Tropel, assim se designa o mais recente romance de Manuel Jorge Marmelo, demonstra mais uma vez a capacidade deste autor em criar narrativas apelativas, escritas de forma extremamente fluída, onde a intensidade das personagens e do seu devir substituem qualquer arquitectura intrincada de relações ou um discurso apoiado num vocabulário hermético. Sem que, com isto, se menospreze a escolha das palavras exactas e da sua carga simbólica. Pelo contrário – veja-se a referência repetida à “actividade venatória”, introduzindo um carácter ritualístico numa descrição de brutalidade: “Sim. Caço refugiados. É este, agora, o meru desporto., o meu modo de vida, aminha principal especialidade venatória. É o meu contributo para limpeza e para o progresso da minha pátria amada”.

Atanas Viktor é o jovem narrador, nome no qual, consciente ou inconscientemente, encontramos ecos a Thanatos, o Deus da morte – mas da morte pacífica. O seu pai é Hirónimo, tal como Hieronimus Wolf, historiador do séc. XVI, todavia, mais uma vez o pensamento do leitor vagueia e é impossível não pensar em Bosch, o pintor de As Tentações de Santo Antão, quadro que repousa no Museu Nacional de Arte Antiga. 

O Clube dos Caçadores ocupa-se de vigiar a fronteira, mas não apenas. O seu espírito voluntarioso leva-os a criar armadinhas e ciladas, aliciando refugados que acabam abatidos. A crueza do raciocínio que pauta o comportamento destes homens é notória e assumida. Logo nas primeiras páginas, a cena que põe termo à vida do avô de Atanas deixa bem clara a ausência de contemplações e a rigidez dos preceitos que norteiam esta comunidade, bem como a bestialidade dos comportamentos com as mulheres, tónica constante ao longo do livro. 

O livro é pontuado com algumas alusões literárias, absolutamente justificadas, consistindo em contributos inteligentes e adequados à consolidação do simbolismo de uma interpretação literária e filosófica de tudo o que nos é apresentado: O Estrangeiro, obra maior de Albert Camus, ou o igualmente icónico O Deserto dos Tártaros, de Dino Buzzati, estabelecendo um paralelismo interessante entre o conflito que se pressente, mas não eclode, e a ansiedade da personagem Krassimiro (“disse-lhe que estava a ler um livro em que um Tenente espera por um ataque dos tártaros. Limita-se, porém, a esperar. Espera e espera num forte erguido no meio de um deserto poeirento onde nada acontece”)

Um ambiente maléfico alimenta o pior de cada um e assegura a continuidade do mal. A moral nivela-se por baixo: “senti confusamente uma espécie daninha de triunfo e vingança, o alívio mesquinho de saber que Marguita não mais seria tratada com deferência especial e que provaria do mesmo veneno que a minha mãe há muito ingeria em grandes sorvos”.

Naturalmente, este livro é um alerta e uma denúncia, uma obra assumidamente política, nunca no restrito sentido partidário, mas tendo por base um olhar sobre alguns discursos da actualidade. Seria tão que o pudéssemos continuar a definir como distopia…

João Morales

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E agora, o que se segue? [Diário de Bordo XLVI] A correria do costume e o Crowdfunding https://branmorrighan.com/2015/03/e-agora-o-que-se-segue-diario-de-bordo_10.html https://branmorrighan.com/2015/03/e-agora-o-que-se-segue-diario-de-bordo_10.html#respond Tue, 10 Mar 2015 10:43:00 +0000

É verdade, esta fotografia bem que podia ser o reflexo dos meus últimos meses. Sempre a correr, por vezes literalmente, e a tentar chegar mais além, também literalmente. Acontece que ao contrário do que se deu no momento desta fotografia, nem sempre consigo atingir o ponto mais alto da minha produção quando quero e os últimos dias têm sido uma loucura ainda maior do que o que costume.

Dar aulas na faculdade é algo que gosto mesmo de fazer, mas tudo tem um preço e conjugar isso com um trabalho de doutoramento que se tem andado a arrastar mais a preparação das fases finais de basquetebol, tem exigido uma certa quantidade de energia que nem sempre é fácil manter. Não vou a um concerto desde o aniversário do blogue no Maus Hábitos e embora já comece a aceitar fazer novas entrevistas, é certo que tenho quase vinte por transcrever e também isso tem que ser diluído rapidamente. Se souberem de um truque para fazer dobrar o tempo, sou toda ouvidos!

Com isto tudo não me quero queixar, mas antes alertar que o volume de conteúdos já anda a sofrer com isso, mas que ando a fazer os possíveis para vos trazer o máximo de informação possível que acho relevante. E neste momento, a mais importante é a seguinte:

“DESASSOSSEGO DA LIBERDADE” – COLECTÂNEA DE CONTOS

A campanha de Crowdfunding para a concretização desta obra já está disponível no site PPL: http://ppl.com.pt/pt/livros-de-ontem/desassossego-da-liberdade

Esta é uma colectânea muito especial por mim, organizada a pensar no Sexto Aniversário do blogue, mas que se tornou em muito mais do que isso. Os 5 Escritores Convidados são todos muito especiais para mim, os 2 Músicos Convidados marcaram muito o último ano do blogue e ainda tive o prazer de descobrir mais 5 Novos Autores. Temos então:

Contos de Carla M. Soares; Manuel Jorge Marmelo; Nuno Nepomuceno; Pedro Medina Ribeiro e Samuel Pimenta.

Autores convidados: David “Noiserv” Santos e Guillermo de Llera Blanes.

Autores vencedores: André Mateus; Cláudia Ferreira; Eduardo Duarte; Márcia Balsas e Márcia Costa.

Capa: João Pedro Fonseca

Organização: Sofia Teixeira

Editora: Livros de Ontem

Para saberem mais e poderem ajudar, em que cada ajuda significa que pelo menos o nome estará nos agradecimentos e consoante o montante ainda poderão ficar com um ou mais exemplares do livro é visitarem o link: http://ppl.com.pt/pt/livros-de-ontem/desassossego-da-liberdade

Estou muito orgulhosa deste projecto e espero que possa ver a luz do dia com a vossa ajuda, os melhores leitores do mundo! A apresentação, contando que irá acontecer, será também ela uma festa muito bonita. Não esquecer que 30% dos direitos vão para a Associação sem Fins Lucrativos Burricadas – O Abrigo do Jumento! 

Agora tenho de ir ali a correr dar mais uma aula, mas hei-de dar novamente notícias brevemente! 

Grande beijo e muito obrigada a todos pelo apoio! 

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Opinião: O Tempo Morto É Um Bom Lugar, de Manuel Jorge Marmelo https://branmorrighan.com/2014/08/opiniao-o-tempo-morto-e-um-bom-lugar-de.html https://branmorrighan.com/2014/08/opiniao-o-tempo-morto-e-um-bom-lugar-de.html#respond Wed, 13 Aug 2014 10:00:00 +0000

O Tempo Morto É Um Bom Lugar

Manuel Jorge Marmelo

Editora: Quetzal

Sinopse: Galardoado recentemente com o Prémio Correntes d’ Escritas/Casino da Póvoa 2014, pelo romance Uma Mentira Mil Vezes Repetida, M.J. Marmelo lança um extraordinário romance em que temas fundamentais do nosso tempo são tratados com a mais apurada mestria literária.

Depois de acordar ao lado do cadáver de Soraya – a mestiça belíssima, estrela televisiva, com quem mantinha uma relação íntima a pretexto de lhe escrever a autobiografia -, o jornalista desempregado Herculano Vermelho entrega-se à polícia e é preso. Não tem memória de nada, nem de que possa ter sido ele a matar a jovem mulher, mas a prisão parece-lhe ser o lugar ideal, o espaço de sossego e de liberdade (sem contas para pagar, sem apresentações regulares no centro de emprego, sem pressões de qualquer espécie), para passar a sua vida em revista, a relação com as mulheres, e escrever a autobiografia da rapariga morta.

Opinião: Existem estreias, com certos autores, que jamais serão esquecidas. Não é que nos recordemos completamente da narrativa, dos pormenores, dos nomes dos personagens, da sua projecção visual… Não, não é nada disso. É antes uma daquelas reacções inexplicáveis quando nos lembramos do que sentimos com a leitura. Já o disse aqui antes, e volto a reforçar, sou uma pessoa muito emotiva, introspectiva boa parte do tempo, mas que vive muito aquilo que lê, aquilo que ouve. Nesta estreia com a escrita de Manuel Jorge Marmelo, não podia deixar de destacar a capacidade do autor nos transportar para a mente dos protagonistas, de nos confrontar com as suas realidades e de ainda nos fazer reflectir sobre as nossas próprias vidas, o que nos rodeia e as nossas motivações. 

Rita, a minha filha, tem dezoito anos e também não parece apreciar que se lhe recorde que tem um pai.

Herculano Vermelho é aquela personagem que nos persegue ao longo dos tempos. Jornalista, pai, um ser humano que se vê perante um impasse – uma idade em que se vê dispensado do seu cargo, uma relação complicada com a filha, um estado económico decadente e uma possibilidade de ser um ghost writer de uma ex-concorrente de um reality show. Após aceitar ser o escritor da biografia de Soraya, mesmo mediante uma data de condições, a tragédia acontece. Se para muitos, acordar ao lado de um cadáver seria uma razão de preocupação, para Herculano é quase como um meio para atingir um fim, um fim contraditório, mas que o leva a sentir-se confortável, em paz consigo mesmo – livre, em plena prisão. 

Enquanto o estabelecimento prisional sossega, neste espaço ainda mais parado que o tempo morto da reclusão, escrevo e penso naquilo que aqui me trouxe: em todas as frases que não disse à minha filha, nos dias em que não a vi crescer, no silêncio que é o meu mais eficaz refúgio e nas mulheres todas que, calando-me, expulsei da vida – na Sofia e na Soraya, claro, mas também nas outras todas que talvez apenas tivessem necessitado de ouvir a minha voz e de sentir a minha presença para terem a certeza de que estava com elas e não afastando-me já para longe, ausente e concentrado num ponto invisível diante do nariz, à espera de que os problemas se resolvessem por si mesmos, puta que pariu, puta que pariu, puta que pariu, tão distante e alheado da minha própria vida como das pendências domésticas de um vizinho qualquer.” 

Dentro da prisão, encontra um conforto e uma despreocupação que o leva a retroceder na sua história pessoal com uma necessidade latente, embora talvez inconsciente, de justificar o rumo da sua vida. Neste caminho introspectivo, Manuel Jorge Marmelo incute na sua escrita o tom agridoce da realidade como ela é – sem adornos, sem tentativas de apaziguamento, mas antes com um sentido que nos revolve, que nos activa e que nos faz abrir os olhos. Regras cínicas e preceitos hipócritas, é assim com estas características que a vida, fora da prisão, emerge aos olhos de Herculano.

Não preciso, aqui, de ser cortês, educado, político ou simpático com sujeitos que me repugnam, e posso muito bem ignorar que existem.

Desde críticas sociais a políticas, existe um chicote literário que é peremptório – estamos perante um autor que, usando vários recursos linguísticos e narrativos, pega num enredo supostamente banal e transforma-o numa obra prima. O que poderia ser a vida de um ex-jornalista com uma vedeta das revistas cor-de-rosa, é elevado ao estatuto de uma busca pela motivação humana, pela necessidade, neste caso de João António Abelha, de ver um mistério resolvido que está muito além da sua compreensão. Cada personagem de O Tempo Morto É Um Bom Lugar tem o seu propósito. A teia tecida consegue explodir numa panóplia imensa de emoções e descrições imagéticas fortes, deixando a sua marca psicológica, qual tatuagem. 

Tinha sido sempre assim: passara a vida a fechar portas, a instalar ferrolhos e a erguer os muros em seu redor. Vendo bem, o suicídio na cadeia constituía o corolário lógico de um percurso e de um modo de vida. Era como uma fuga definitiva, o desaparecimento final, e havia que reconhecer que Herculano tinha conseguido ser consequente. Abelha sentiu, por isso, admiração e inveja.

Estamos perante uma obra tão rica, tão cheia de possibilidades que é impossível ficarmos-lhe indiferentes. Não falei um décimo daquilo que poderia abordar nesta opinião, mas afinal este é um daqueles livros dos quais era capaz de me colocar aqui a escrever ou a falar horas e horas. Qualquer texto que escrevesse iria sempre sempre abaixo do merecido, mas fica a recomendação sem restrições para quem gosta de boa literatura portuguesa, como só um bom português sabe escrever. 

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Manuel Jorge Marmelo vence Prémio Literário Casino da Póvoa 2014 https://branmorrighan.com/2014/02/manuel-jorge-marmelo-vence-premio.html https://branmorrighan.com/2014/02/manuel-jorge-marmelo-vence-premio.html#respond Thu, 20 Feb 2014 19:55:00 +0000

Manuel Jorge Marmelo venceu o Prémio Literário Casino da Póvoa 2014, no valor de 20.000€, com o romance Uma Mentira Mil Vezes Repetida, publicado em 2011 pela Quetzal.

O júri, constituído por Isabel Pires de Lima, Carlos Quiroga, Patrícia Reis, Pedro Teixeira Neves e Sara Figueiredo Costa, escolheu a obra de uma lista de quinze finalistas e de um total de 180 obras a concurso.

O prémio será entregue no próximo sábado, dia 22, na sessão de encerramento da 15ª edição do festival literário Correntes d’Escritas.

Uma Mentira Mil Vezes Repetida recebeu o aplauso unânime da crítica aquando da publicação. A atribuição deste prémio é um reconhecimento pela extraordinária qualidade deste livro mas também a consagração do percurso literário de Manuel Jorge Marmelo.

O principal mérito de MJM está na forma como consegue manter a sensação de claustrofobia narrativa, sem deixar que o leitor se perca no caos de repetições, incongruências e “solavancos lógicos”. Muito bem escrito, o livro oferece-nos pelo menos dois pastiches brilhantes: um de García Márquez (a cidade de Polvorosa, uma espécie de Macondo onde se produz cacau em vez de bananas); outro de Thomas Pynchon (a barafunda postal de Granada).

José Mário Silva, Expresso

Uma Mentira Mil Vezes Repetida é um festim de labirintos narrativos que esconde, só pelo prazer de forçar a descoberta, as reflexões sobre o mundo que nenhum telejornal permite e que a literatura guarda como melhor espelho de todos nós.

Sara Figueiredo Costa, Time Out

www.quetzal.blogs.sapo.pt

Manuel Jorge Marmelo nasceu em 1971, no Porto. Estreou-se na literatura em 1996 e publicou, de então para cá, mais de vinte títulos. Conquistou, em 2005, o Grande Prémio do Conto Camilo Castelo Branco com o livro O Silêncio de um Homem Só. É o autor de, entre outros, Aonde o Vento me Levar e As Mulheres Deviam Vir com Livro de Instruções, disponíveis na Quetzal, que já publicou As Sereias do Mindelo, Uma Mentira Mil Vezes Repetida, O Amor É para os Parvos e Somos Todos um Bocado Ciganos.

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