Tânia Ganho – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Sat, 09 Jan 2021 12:09:33 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.2 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Tânia Ganho – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 Opinião: Apneia, de Tânia Ganho https://branmorrighan.com/2021/01/opiniao-apneia-de-tania-ganho.html https://branmorrighan.com/2021/01/opiniao-apneia-de-tania-ganho.html#comments Sat, 09 Jan 2021 12:06:40 +0000 https://branmorrighan.com/?p=24784
Apneia

Apneia
Tânia Ganho

Editora: Casa das Letras

Sinopse

Opinião: Aaaah! As saudades que eu tinha de ler Tânia Ganho! Alguma vez leram o seu romance Mulher-Casa? Foi essa obra que me introduziu à escritora portuguesa e desde então que volta e meia me perguntava quando teríamos o privilégio de um novo romance. Esse momento chegou em 2020, ainda estava eu a viver nos Estados Unidos, mas assim que aterrei em Portugal, passados poucos dias, o livro chegou-me às mãos. Que momento feliz! Melhor ainda foi ter partilhado esta leitura com uma amiga muito querida. Decidimos mergulhar juntas neste belo e arrepiante Apneia.

Apneia – suspensão da respiração (priberam).

Logo de início o título do livro faz todo o sentido. Tânia Ganho começa a narrativa com a descrição de uma situação que nos deixa logo em alerta para a evolução e potencial violência psicológica da história. Quando a premissa é violenta, o que nos espera na conclusão? O caminho que nos leva de um a outro fez-me lembrar uma caminhada numa floresta com trilhos íngremes, em que volta e meia tememos pela nossa segurança, alternada com parcas e falsas sensações de descanso.

Sendo um livro longo, a mestria de Tânia Ganho pontuou-se na estratégia de optar por capítulos curtos e rápidos, alternando entre espaços temporais, motivando o leitor a manter-se atento. Durante a leitura, existem alguns elementos que se repetem como que para nos relembrar constantemente de padrões que merecem a nossa atenção. Apesar de ser uma história de cariz sério, pesado e violento, a verdade é que após o início agressivo, temos um intervalo emotivo de algumas dezenas de páginas, em que Tânia Ganho vai lançando todas as sementes necessárias para a certa altura se iniciar uma subida vertiginosa, sem forma de voltar atrás, de apneia constante, que nos revolve o estômago e nos desarma.

Sem mais rodeios, Apneia é capaz de ser um dos romances mais necessários na literatura portuguesa devido à forma como expõe um dos maiores problemas da nossa sociedade – abuso doméstico e infantil e o quão frustrante podem ser os processos judiciais associados. E há aqui um ponto muito importante que se relaciona com a noção que temos de violência e abuso. Quando se fala de violência doméstica ou abuso, a grande tendência é associar-se esses conceitos a um sinónimo de agressão física.

A história de Adriana e Edoardo vem mostrar-nos, precisamente, como é que sem haver evidência de violência física podem perpetuar-se abusos psicológicos que destroem qualquer sentido do “eu”, qualquer sentido de autopreservação, havendo uma alienação e um percurso de submissão inconsciente em que se perde poder pessoal.

No seu romance anterior, o Mulher-Casa, a escritora portuguesa já tinha explorado uma relação mãe-filho que muito me impressionou. Não sou mãe, portanto há coisas que só posso imaginar. Em Apneia, é difícil conceber colocar-me nos pés de Adriana enquanto mãe de Edoardo. Os pensamentos irracionais que me passaram pela cabeça à medida que avançava na leitura fizeram-me crer que nunca ninguém, jamais, por mais forte que seja, estará alguma vez preparado para a imprevisibilidade que pode ser ter um parceiro/a com as características psicológicas e de personalidade de Alessandro. Mais, o sentimento de impotência sempre tão latente é desconcertante.

O abuso psicológico constante, o bullying, o gaslighting, e outras técnicas de deturpação de personalidade do próximo, deixam marcas para uma vida. Foi difícil aceitar que, por vezes, psicólogos e psiquiatras testemunhos destas situações decidam lavar as mãos e retirarem-se dos processos por serem litigiosos. Compreendo que haja intimidação por parte de intervenientes envolvidos, mas não lhes cabe eles, perante o juramento que fizeram, denunciar todos os riscos que lhes saltam à vista? Quanto vale a saúde psicológica de uma criança, com todos os riscos que a mesma acarreta para o seu desenvolvimento e formação de personalidade enquanto adulto?

O outro ponto fundamental deste romance, que me enfureceu de início ao fim, é a descrição do processo judicial, tanto de divórcio como de custódia de um filho, que é completamente desumanizador. Tendo a escritora feito um estudo profundo e apurado, com testemunhos de quem passou por situações semelhantes, de como tudo se processa, é revoltante ver um sistema a funcionar tão mal e que é tão enviesado pelos preceitos que se tem do papel do homem e da mulher numa família e na sociedade. É completamente revoltante e aberrante que este tipo de processos se arraste por tanto tempo sem garantir qualquer tipo de segurança aos intervenientes, muito menos às crianças.

“As palavras afiguravam-se-lhe sempre aquém. Insuficiente perante a dor. Como se a dor fosse incompatível com a articulação da linguagem. Com a ordem. A dor era o caos e o caos não obedecia à gramática, a regências, concordâncias, tempos verbais. Tudo era presente; o passado e o futuro transfiguravam-se em presente. Se escrevesse, seria para dizer << Eu sou a minha dor >> e não era verdade, ela era muito mais do que a sua dor, até porque havia uma hierarquia e a sua ficava longe do topo da pirâmide. Existiam dores tão piores, recordava a si mesma, e enumerava-as, para se lembrar de que a sua era suportável. Mas não era compatível com palavras.”

Destaco esta citação porque, honestamente, poderia escrever muito mais, mas nada do que estou a escrever me parece suficiente para fazer jus à palete de emoções que fui sentindo. Um pormenor lírico belíssimo, que ainda não referi aqui, foram as referências literárias e artísticas ao longo da narrativa, reforçando a vulnerabilidade física e mental retratados na pele da personagem de Adriana.

Para terminar, a última parte do livro foi extremamente dolorosa de ler. Se houve dias em que só consegui ler poucas páginas, para o fim já lia madrugada fora, tentando de alguma forma arranjar cenários mentais para salvar uma situação impossível. O fim, em si, a situação com que Tânia Ganho decidiu fechar o livro, é um fim à filme, mas que, a meu ver, tenta dar alguma esperança a Adriana e Edoardo.

Foi dureza, mas valeu a pena. Obrigada, Tânia Ganho, por nos trazeres esta obra e que a mesma possa inspirar e incentivar todas as componentes envolvidas a agirem.

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[Destaque] Tânia Ganho regressa com novo romance – Apneia https://branmorrighan.com/2020/07/destaque-tania-ganho-regressa-com-novo.html https://branmorrighan.com/2020/07/destaque-tania-ganho-regressa-com-novo.html#respond Thu, 09 Jul 2020 18:11:00 +0000

Apneia

Nº págs: 696

ISBN: 978-989-66-0810-1

PVP C/ IVA 21,90€


Apneia, o novo romance de Tânia Ganho chega às livrarias no dia 21 de julho

Em Apneia, através das personagens de Adriana e Alessandro, um casal luso-italiano, e do seu filho Edoardo, Tânia Ganho dá voz às vítimas de violência doméstica e de abusos sexuais, em especial às crianças que são alvo deste flagelo, transmitindo ao leitor as dinâmicas psicológicas da manipulação e do medo e, acima de tudo, as sequelas do stresse pós-traumático.

Embora se trate de uma obra de ficção literária, Apneia assenta em casos verídicos e em experiências reais vividas no Tribunal de Família e Menores de Lisboa e junto do Ministério Público, da Polícia de Segurança Pública, do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e do Departamento de Investigação e Acção Penal. Ao longo das suas páginas, acompanhamos não só o sofrimento das vítimas, mas também o decurso habitual da Justiça que, perante processos desta complexidade, tantas vezes falha, deixando as crianças desprotegidas e entregues à sua própria sorte.

Sinopse

Quando Adriana ganha finalmente coragem para sair de casa com o filho de cinco anos, pondo fim ao casamento com Alessandro, mal pode imaginar que o marido, incapaz de aceitar o divórcio, tudo fará para a destruir – nem que para isso tenha de destruir o próprio filho. APNEIA é uma viagem ao mundo sórdido da violência conjugal e parental, através de um labirinto negro em que os limites da resistência psicológica são postos à prova, ameaçando desabar a qualquer instante, e dos meandros tortuosos de uma Justiça por vezes incompreensível, desumana e desfasada da realidade. Escrito com uma sobriedade e frieza inquietantes, APNEIA é um romance intenso, absorvente e perturbador, que ilustra com uma autenticidade desarmante o estado de guerra em que vivem milhares de famílias estilhaçadas, e com o qual, inevitavelmente, muitos leitores se vão identificar, encontrando nestas páginas ecos da sua própria experiência.

Autora

Tânia Ganho nasceu em 1973, em Coimbra. Licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, trabalhou durante vários anos em legendagem para televisão e cinema. Foi assistente convidada na Universidade de Coimbra, onde leccionou tradução literária, área a que se dedica há mais de 20 anos. Traduziu autores como Angela Davis, Siri Hustvedt, Maya Angelou, Leila Slimani, Chimamanda Adichie, Amor Towles, David Lodge e Alan Hollinghurst, entre muitos outros. É autora dos romances A Vida sem Ti (2005), Cuba Libre (2007), A Lucidez do Amor (2010) e A Mulher-Casa (2012) e tem vários contos publicados na revista Egoísta. Em 2012, ganhou o primeiro prémio na categoria internacional do Concurso de Contos Cidade de Araçatuba, no Brasil. Depois de ter vivido em Inglaterra, na Alemanha e em França, reside actualmente em Lisboa. Apneia é o seu mais recente romance.

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[DESTAQUE] Reportagem – Livros na Estrato(blogo)sfera! Fotografias por Gil Cardoso https://branmorrighan.com/2014/06/destaque-reportagem-livros-na.html https://branmorrighan.com/2014/06/destaque-reportagem-livros-na.html#respond Mon, 09 Jun 2014 17:27:00 +0000 Painel Completo!
As bloguers! 
O moderador e os escritores!
João Paulo Sacadura
Tânia Ganho
Márcia Balsas
Afonso Cruz
Sofia Teixeira
Pedro Garcia Rosado
Vera Brandão
Sempre com boa disposição!
A Vera é a nossa entusiasta dos policiais! 
Espero não ter dito muitas asneiras!
Os nossos escritores muito atentos! 
A boa disposição foi a emoção de ordem! 

Foi pouco o tempo e pareceu passar a voar! Com a energia latente do moderador João Paulo Sacadura, começou-se pelas apresentações para logo se avançar pelo tema principal, a importância da blogosfera em Portugal. Um tema central foi a questão da proximidade que um blogue permite com os leitores que as publicações física e a comunicação social impressa não conseguem. Outro ponto pertinente, e que na minha opinião dá pano para mangas, foi a questão de muitas vezes os leitores procurarem opiniões e gostos das pessoas que seguem e não tanto aquela crítica, boa parte dela destrutiva, mais oficial, de pessoas versadas na área.

Também na divulgação de novos autores portugueses, a importância dos blogues ficou reconhecida. É muito mais fácil encontrarmos informações sobre os mesmos nas oportunidades que hoje em dia os blogues dão a esses autores, do que na imprensa escrita. Mais, a informação que está na internet, nunca desaparece, está sempre disponível, o que torna este meio de comunicação muito atractivo para quem quer opiniões em tempo real. 

É de comum acordo que os blogues fazem um trabalho que é impagável. Como disse Afonso Cruz e muito bem, nós basicamente trabalhamos de borla para eles e é claro que eles agradecem (se nem todos agradecem, deviam). A própria escritora Tânia Ganho admira todo o entusiasmo com que bloguers como eu, a Márcia e a Vera, trabalham em que acabam por chegar às pessoas e estas por nos seguirem e quererem falar sobre livros. Da nossa parte, e penso que posso falar pelas três, cada uma de nós tem o seu emprego e quem faz o mesmo sabe o esforço que é manter um blogue actualizado e bem actualizado. Não é só chegar em frente ao computador e depositar meia dúzia de palavras. Requer esforço, ponderação e uma dedicação extrema. Sem esse dito entusiasmo, não haveria a motivação necessária. Felizmente, temos para dar e vender! E não somos as únicas! 

Outro tema fortemente discutido foi a questão de quase não haver literatura nacional policial. Neste ponto, o autor Pedro Garcia Rosado falou um pouco sobre o seu percurso enquanto autor e frisou que o trabalho que é muitas vezes necessário por parte das editoras para se poderem trabalhar como deve ser os manuscritos não existe. Sem dúvida um dedo na ferida no que toca à publicação de novos autores em Portugal. E mais uma vez, muito ficou por ser dito nesta matéria. 

Isto é um resumo já de si resumido do evento. Penso que cada tópico abordado resultaria em horas infindáveis de conversa e nós sem sacrifício algum ali ficaríamos, mas infelizmente o tempo estava contado. Quero agradecer imenso à Joana Freitas da TOPSELLER por me ter feito o desafio e por ter tratado da organização do espaço com a APEL. Muitíssimo obrigada ao João Paulo Sacadura por ter sido um excelente anfitrião e pela sua perspicácia, perguntas certeiras e inquietantes! Obrigada Afonso Cruz, Pedro Garcia Rosado e Tânia Ganho por terem aceite o convite e despendido um pouco do vosso tempo já tão ocupado. Às minhas colegas Márcia Balsas e Vera Brandão um grande obrigada por partilharem deste entusiasmo e por serem uns autênticos pilares da nossa blogosfera. 

Da minha parte, só consigo pensar em vir a organizar mais eventos, mais tertúlias, mais meios de propagação e divulgação da cultura portuguesa. Existe um bichinho por aqui que não fica saciado facilmente e espero mesmo poder vir a organizar e participar em mais iniciativas destas. 

Um último destaque para o Gil Cardoso que tirou fotos excelentes ao evento e que quem estiver interessado em ver o pacote completo, pode contactar. O trabalho do Gil pode ser encontrado aqui: http://www.gilcardoso.net/

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[DESTAQUE] Evento na Feira do Livro de Lisboa – Os Livros na Estrato(blogo)sfera – 7 de Junho https://branmorrighan.com/2014/05/destaque-evento-na-feira-do-livro-de.html https://branmorrighan.com/2014/05/destaque-evento-na-feira-do-livro-de.html#respond Wed, 21 May 2014 13:38:00 +0000

Lembram-se de um teaser lançado aqui há dias sobre um evento que andava a preparar para a Feira do Livro de Lisboa? Pois aqui fica ele!

LIVROS NA ESTRATO(BLOGO)SFERA

Os autores Afonso Cruz, Pedro Garcia Rosado e Tânia Ganho vão juntar-se aos conhecidos bloggers Sofia teixeira, Vera Brandão e Márcia Balsas, para, numa tertúlia moderada pelo conhecido jornalista João Paulo Sacadura, falar sobre o que gira à volta dos livros: os diferentes géneros literários, os gostos dos portugueses, a nova moda dos blogues, entre outros temas. Estão todos convidados a participar nesta verdadeira festa ao livro!   

Quem quiser aparecer uma hora mais cedo, terá a oportunidade de estar na relva à conversa com o autor Pedro Garcia Rosado e outros que possam aparecer. Venham todos e participem nestas discussões tão pertinentes! Tem sido um grande prazer ajudar a organizar este evento. Obrigada à Joana Freitas pelo desafio.

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Nova Entrevista a Tânia Ganho, Escritora/Tradutora Portuguesa https://branmorrighan.com/2013/02/nova-entrevista-tania-ganho.html https://branmorrighan.com/2013/02/nova-entrevista-tania-ganho.html#respond Sat, 02 Feb 2013 16:17:00 +0000 Hoje temos o regresso de uma autora portuguesa de grande talento, Tânia Ganho. O seu último romance foi lançado em 2012,A Mulher-Casa, e recentemente através da sua veia de tradutora, traduziu outra grande obra de Mathias Malzieu,Metamorfose à Beira do Céu.

Gostei muito de elaborar esta entrevista e, na minha opinião, as respostas estão fantásticas. Espero que gostem de conhecer melhor esta autora, que apresentei aqui no blog em 2010 (https://branmorrighan.com/2010/04/tania-ganho-escritora-portuguesa.html). Obrigada, Tânia, pela simpatia 🙂

Tânia, em 2012 lançaste o teu último Romance A Mulher-Casa. Adorei lê-lo e acho que está muito realista. O que é que inspira uma autor a escrever sobre o tema desta obra?

Há vários temas em A Mulher-Casa: a maternidade, a degradação de um casamento, a corrupção política, a venalidade do poder… Inspirei-me nas minhas vivências de Paris, nas minhas caminhadas pelas ruas da cidade, nas histórias das minhas amigas sobre os filhos pequenos e as dificuldades que sentiam em conciliar bebés, maridos, carreiras, nos casos políticos que encheram as páginas dos jornais – como o caso Dominique Strauss-Kahn –, em textos sobre os meandros do poder em França, em todas as exposições e concertos que vi… Tudo me inspira, em especial as pessoas.

As tuas personagens são extremamente humanas. As suas emoções, motivações, podiam ser as de qualquer ser humano dito normal. O que te motivou a criar este tipo de personagens em vez do tradicional ‘quase perfeito apesar das imperfeições’?

Não gosto de personagens perfeitas nem de enredos em que tudo se conjuga de modo a criar o final perfeito, porque a minha escrita é realista e as pessoas, por natureza, têm tanto de bom quanto de mau e as histórias nunca são como gostaríamos. Sempre que leio um romance em que tudo é demasiado “certinho”, sinto que o autor cedeu à tentação do facilitismo comercial.

A trama do livro é toda ela um pouco complexa. Especialmente o fim, penso, pode ser susceptível a opiniões divergentes sobre a opção de Mara. Como é que os teus leitores têm reagido ao fim que deste às personagens?

Os leitores têm reagido às personagens e ao final com uma intensidade que me faz sorrir, porque me escrevem sobre a Mara, o Thomas e o Mathéo como se fossem pessoas de verdade, que é precisamente o meu objectivo: que as pessoas leiam o livro como se fosse a história delas ou de alguém que conhecem. Houve leitores que detestaram a passividade da Mara, outros que não suportaram a indiferença do Thomas. Curiosamente, são as mulheres que mais criticam a Mara – os homens apaixonam-se por ela – e os homens que mais se insurgem contra o Thomas. Pensei que ia acontecer o contrário: as mulheres iam identificar-se com a Mara e compreender as suas falhas, e revoltar-se contra a cegueira do Thomas, mas não, têm-no desculpado sistematicamente, como se as reacções do Thomas fossem uma resposta às alterações de humor da Mara e não o oposto. Tem sido fascinante receber este feedback dos leitores.

Nasceste em Coimbra, mas viveste bastante tempo em França. Como caracterizarias o panorama literário em França quando comparado com o panorama actual português?

França tem uma verdadeira máquina literária em acção, coisa que só agora começa a acontecer em Portugal. Os editores franceses promovem os seus autores com unhas e dentes e existem inúmeros apoios à criação literária, bolsas e prémios que permitem a um autor dedicar-se exclusivamente à escrita, algo que é quase impossível no nosso país. E os livreiros têm um papel verdadeiramente interventivo, sabem o que vendem, aconselham os seus clientes, promovem os livros melhor do que ninguém, enquanto em Portugal, infelizmente, ainda se comercializam livros como se fossem salsichas ou pacotes de leite. Outra diferença gritante é a quantidade de programas e publicações culturais que existem em França; se em Portugal já tínhamos pouco espaço para a cultura, neste momento estamos a criar um vazio cultural escandaloso na imprensa. Quanto mais ignorante for o povo, melhor obedecerá aos déspotas…

Recentemente traduziste a obra ‘Metamorfose à Beira do Céu’ de Mathias Malzieu. Já li este livro e gostei bastante. Qual a tua opinião sobre o mesmo?

Adoro a escrita do Mathias Malzieu, que já conhecia de A Mecânica do Coração. Fiquei fascinada com Metamorfose à Beira do Céu: é um livro que nos transporta para um universo onírico e nos comove profundamente, contando-nos a história de um rapaz que queria ser ave para poder voar e de uma mulher-pássaro que realizou o sonho dele. Além de poético, tem momentos muito divertidos, em especial as descrições das acrobacias do Tom “Hematoma” Cloudman. Como dizem os Franceses, Metamorfose é “un petit bijou”.

Como é conciliar as actividades de escritora e tradutora? As obras que traduzes servem de inspiração para novas histórias ou separas completamente as duas componentes?

Ser escritora e tradutora é viver dentro dos livros de manhã à noite, por isso é muito fácil conciliar as duas actividades, embora me sinta frustrada por dedicar mais tempo no meu dia-a-dia à tradução do que à escrita. Nunca me inspirei directamente num livro de outro autor para escrever os meus romances e nunca me senti tentada a copiar uma imagem ou metáfora. Aprendo muito com a tradução, porque me obriga a analisar, de uma perspectiva interna (e não externa, como um leitor comum), a maneira como outros autores desenvolvem as suas personagens e constroem a trama. Mas separo a tal ponto a tradução da escrita que até uso computadores diferentes para cada actividade.

Já tens algum projecto planeado para um futuro próximo e de que nos possas falar um pouco?

Tenho dois romances na cabeça e estou a construir as personagens e o enredo de cada um, mas ao meu ritmo, ou seja, com muita calma e paciência. Só quando tiver as personagens de “carne e osso” dentro de mim é que passarei à fase da escrita, mas, em princípio, o próximo livro sairá em 2014, o mais tardar. Não gosto de falar dos meus projectos, mas posso adiantar que o protagonista desse romance é um homem e está ligado ao mar; parte da história desenrola-se num farol, numa ilha. Um amigo lançou-me um desafio: escrever sobre um homem subjugado por uma mulher, e estou a criar uma personagem masculina que eu espero que seja extremamente humana e complexa. O outro romance passa-se no mundo da música clássica.

Pergunta da praxe: O que achas do blog Morrighan?

O Blog Morrighan tem tido um papel exemplar na divulgação da literatura portuguesa e está de parabéns. Os blogues têm cada vez mais um lugar crucial na promoção dos livros e todos os esforços que sejam feitos no sentido de aproximar os autores dos leitores são louváveis. A paixão com que falas dos livros que lês é contagiante, Sofia!

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Opinião: ‘A Mulher-Casa’ de Tânia Ganho https://branmorrighan.com/2013/01/opiniao-mulher-casa-de-tania-ganho.html https://branmorrighan.com/2013/01/opiniao-mulher-casa-de-tania-ganho.html#respond Fri, 18 Jan 2013 11:44:00 +0000

A Mulher-Casa
Tânia Ganho

Editora: Porto Editora

Opinião: A Mulher-Casa foi a primeira obra que li da autora Tânia Ganho e conquistou-me logo desde muito cedo. Magistralmente bem escrito, a autora transporta-nos para uma Paris fervilhante dando-nos a conhecer a nova vida de Mara e Thomas, o seu marido. Com um filho pequenino e um marido cada vez mais ausente, Mara vê a sua vida confinada a quatro paredes e a Raphael, ainda completamente dependente e carente.

A história que acompanhamos está repleta de emoções contraditórias, lutas constantes sobre o que é certo e errado, mas acima de tudo é realista. As personagens são do mais humano que há, com tudo o que um ser pode ter de bom, mas também com as suas falhas, as suas fragilidades e inseguranças.

Thomas tornou-se num autêntico workaholic, sedento de agradar ao Chefe, destruindo aos poucos qualquer possibilidade de estabilidade no seu lar. Aos poucos deixa de procurar Mara, quando procura o sexo é desprovido de qualquer sentimento e esta vai-se sentido cada vez mais sozinha e carente.

Mara é uma personagem um pouco complexa na sua simplicidade. Ela quer o que qualquer mulher deseja: atenção do marido, realização pessoal e que mesmo já tendo um filho pequenino que continue a haver alguma excitação na sua vida. Quando Thomas praticamente se torna num espectro para si, ela começa a virar a sua atenção para Matthéo, o chef de cozinha. O caso que inicia com ele, rapidamente lhe começa a pesar na consciência, mas Mara precisa dele para se sentir viva.

Toda a trama acaba por se centrar no quotidiano de Mara e no quão viciado este fica. Tendo de ser a esposa perfeita e de conveniência para Thomas, a mãe dedicada e atenciosa para Raphael e a amante proibida de Matthéo, não foi de estranhar quando esta se obrigou a tomar uma decisão.

A escrita de Tânia Ganho é simples, mas rica no poder de projectar as imagens das pessoas, os cheiros e os cenários de Paris. Sentimo-nos como um espectador presente à medida que avançamos na leitura. O único ponto que talvez me tenha desiludido um pouco foi o final. Não querendo desvendar como acaba, posso dizer que gostava que Mara tivesse sido mais senhora de si, mais determinada e que a escolha fosse clara e única. De resto, só posso dizer bem. É um excelente livro e que agradará a todo um público que goste de um bom romance.

A mulher-casa de Tânia Ganho - www.wook.pt
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Entrevista a Tânia Ganho – Escritora Portuguesa https://branmorrighan.com/2010/04/tania-ganho-escritora-portuguesa.html https://branmorrighan.com/2010/04/tania-ganho-escritora-portuguesa.html#comments Wed, 21 Apr 2010 21:37:00 +0000 Boa noite a todos!!!
Hoje tenho para vos apresentar a simpática e sempre disponível Tânia Ganho!
Foi uma escritora que gostei muito de conhecer e que foi sempre impecável comigo. Enviou-me mesmo o seu último livro, A Lucidez do Amor, desde França!! Muito Obrigado Tânia 🙂 Vou ter todo o gosto em lê-lo e em partilhar a minha opinião.
Passemos então a palavra à Tânia:

Sobre mim:

Sou uma contadora de histórias. Como levo uma vida de eremita, vivo virada para o mundo, para os outros, sempre atenta ao que vejo e ouço. Sou uma amiga fiel, uma leitora compulsiva, uma mãe-galinha, uma namorada ciumenta, uma mulher objectiva, uma cabeça no ar, uma portuguesa muito britânica, um ser muito autocrítico. Sou perfeccionista, pontual, desastrada, tropeço em tudo, queimo o jantar com demasiada frequência. Sou orgulhosa, mas sei pedir desculpa quando erro. Sou tradutora de dia, escritora de noite. Sou uma insatisfeita permanente, mas sei reconhecer a felicidade quando ela me bate a porta e deixo-a sempre entrar. Detesto a frase: «Vai-se andando.» Vivo tudo até ao fim, não faço nada pela metade.

Estilo e Ritmo de Escrita:

Gosto muito da maneira como os meus leitores definem o meu estilo: «despretensioso», «límpido», «directo», «simples mas não light». É uma escrita intimista, mas contida, sobre sentimentos intensos, evitando o sentimentalismo. O ritmo é extremamente importante para mim, o texto tem de fluir, a leitura tem de ser um prazer e não um constante tropeçar em obstáculos; detesto frases inúteis, floreados, «palha». Gosto de agarrar o leitor desde a primeira frase e dar-lhe vontade de continuar a ler, talvez por eu própria ter uma capacidade de concentração limitada e facilmente me desinteressar das coisas. Escrevo como vivo: sem tempo a perder com coisas supérfluas, indo directa ao que realmente importa. Quando era mais nova, adorava livros com longas descrições e malabarismos linguísticos, livros que me deslumbrassem… hoje, aprecio cada vez mais a simplicidade e a subtileza, livros que me façam exclamar menos enquanto os leio, mas pensar mais quando os pouso.

Influências:

Como tenho uma profunda paixão pela língua inglesa, as minhas influências passam sobretudo por autores anglófonos, como Ian McEwan, Martin Amis, Kazuo Ishiguro, Doris Lessing, Maya Angelou, Adrienne Rich, Margaret Atwood, Alice Munro, Anaïs Nin, Jenny Diski, Julia Leigh… Já para não falar nos clássicos, Jane Austen, Henry James, Edith Wharton, Somerset Maugham, as irmãs Brontë, E.M. Forster e por aí fora. Se tivesse de escolher autores portugueses que me marcaram muito nos meus «anos de formação», diria Sophia de Mello Breyner, Eça de Queiroz e Jorge de Sena. Os Maias e Sinais de Fogo são dois livros extraordinários!

Projectos Futuros:

Num futuro muito próximo: embalar a casa de Paris, mudar-me para Lisboa, reaprender a viver em Portugal, tomar muitos cafés com os meus amigos e tirar dois meses de férias para escrever o meu quarto romance, porque as personagens «habitam-me» há três anos e estou cheia de vontade de me entregar a elas de uma vez por todas.

Que conselhos dá a quem quer enveredar pela carreira de escritor?

Ler, ler, ler. Para se escrever bem, é preciso ler muito e ler autores variados. É natural passar pela fase das «obsessões» literárias, mas convém descobrir o seu próprio estilo, a sua própria voz, para não cair no pastiche. Depois, é preciso trabalhar muito e corrigir, corrigir, corrigir. Não ter medo de cortar, deitar fora, reescrever. Saber ouvir a opinião dos outros, sem se deixar censurar. Aceitar as críticas, sem se ir abaixo. Ser perseverante. Acreditar no que se faz. Manter-se fiel a si mesmo, escrever aquilo que se tem vontade e não aquilo que se acha que o mercado quer. Olhar mais para os outros e menos para o seu umbigo. Ter o espírito aberto, sem preconceitos. Pensar em letras e não em algarismos.

Apresento-vos agora, os três livros da autora:

A Lucidez do Amor

“Esta é a história de Michael e Paula, cujas vidas se vão desenrolando em paralelo, numa pequena aldeia de França e numa base internacional no meio do deserto tajique, separados por quatro meridianos e cinco mil quilómetros de distância.

Uns meses depois do 11 de Setembro, Michael Adam, piloto da Força Aérea francesa, é enviado para o Afeganistão no âmbito da luta contra o terrorismo. Passados quatro anos, parte novamente em missão, mas desta vez com plena consciência da natureza letal do seu trabalho. É com o inquietante pressentimento de que poderá não regressar a casa que se despede da mulher, Paula, e do filho recém-nascido. Atirada para um mundo sem homens, Paula é obrigada a tornar-se mãe solteira e a criar laços de amizade com o heterogéneo grupo de mulheres que a rodeia e que vive ao ritmo do toque do telefone – até ao dia em que as linhas ficam mudas…

Baseado em quatro personagens profundamente humanas e complexas – o piloto estranhamente supersticioso com licença para matar, a sua mulher artista e impressionável, a sogra africana, sábia e marcada para toda a vida, e o sogro amargo que carrega um pesado segredo dos seus tempos de guerra na Guiné-Bissau -, A Lucidez do Amor é um romance inquietante e cheio de suspense, que questiona o significado do amor, explorando as diferenças que nos separam uns dos outros, mas que podem também unir-nos irrevogavelmente.”

A Vida Sem Ti

Ana tem 27 anos, uma colecção de namorados e uma total falta de vocação para casar e ter filhos. Mas quando conhece Richard, um homem vinte e um anos mais velho, divorciado e com dois filhos pequenos, não hesita em fazer as malas e mudar-se para Londres, convicta de que encontrou o amor da sua vida. Para trás deixa um emprego na Universidade, a família que adora e, acima de tudo, a sua independência. Chegada a Inglaterra, descobre que a vida a dois não é a aventura que esperava e que ser mãe dos filhos dos outros não é simplesmente brincar às casinhas. Uma tragédia vem pôr fim aos seus pequenos dramas diários e mostrar que todos escondemos terríveis segredos.

Cuba Libre

Como é que alguém pode saber o que se passa dentro da cabeça de uma mulher que foi educada para fugir à tentação?

Uma mulata de cabelo rapado à beira de uma piscina, numa madrugada em Cuba. Um homem vindo de Bruxelas, na véspera de um casamento. Uma relação de sete anos e o medo do escândalo, numa terra de «gente austera e devota». Duas ilhas estanques no meio do Atlântico. O desejo louco de libertação. Um regresso inesperado a Paris. Dez anos na vida de uma mulher de sexualidade ambígua, em busca do seu rumo no mundo.

Site Oficial da Autora

Obrigado por todo o carinho Tânia!

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