Tiago Sousa – Bran Morrighan https://branmorrighan.com Literatura, Leitura, Música e Quotidiano Mon, 28 Dec 2020 05:34:49 +0000 pt-PT hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.8.2 https://branmorrighan.com/wp-content/uploads/2020/12/cropped-Preto-32x32.png Tiago Sousa – Bran Morrighan https://branmorrighan.com 32 32 TIAGO SOUSA apresenta ‘Um Piano nas Barricadas’ na Galeria ZDB https://branmorrighan.com/2016/02/tiago-sousa-apresenta-um-piano-nas.html https://branmorrighan.com/2016/02/tiago-sousa-apresenta-um-piano-nas.html#respond Tue, 23 Feb 2016 08:27:00 +0000 Fotografia Vera Marmelo

Dono de uma linguagem sonora cada vez mais única, a sua história reserva já diversos capítulos e encarnações. Acompanhamo-lo nas margens do rock, seguimo-lo no influente trabalho da editora Merzbau e continuamos a observá-lo neste brilhante percurso onde o piano é o coração deste corpo em constante evolução. Como habitual num exercício de busca criativa e até pessoal, o rumo ao desconhecido proporciona frequentemente momentos de descoberta e de partilha. E desde o longínquo ano de 2006 que esse processo se tem sedimentado através de quase uma dúzia de discos assinados a solo ou em colaborações.

O que faz de Tiago Sousa um exemplo insular na abordagem ao instrumento é o afastamento natural face a estilos e expectativas. Demasiado mestiço para os cânones da escola erudita, nele escutamos elementos vagamente jazzísticos, referências resgatadas à filosofia oriental e uma multiplicidade de mundos entrelaçados. Embora intimista, a delicadeza e a grandiosidade da implosão emocional das suas peças não encontram outro habitat que não a universalidade. Trata-se pois de música genuinamente livre e libertadora na sua mais plena dimensão em que o pano do onírico adorna orgulhosamente o palco do telúrico. O modo como nos envolve e nos devolve à realidade faz dele um virtuoso na habilidade de conjugar os silêncios e os seus ganhos como pontuação na escrita.Para completar, a consciência socio-política do músico faz dele um discreto mas assertivo artista de acção cuja obra ‘Coro das Vontades’ (apresentada em 2012 no Teatro Maria Matos e editado este ano em CD) é, sem dúvida, a maior das façanhas. É com uma mão coberta de terra e outra de sangue que os dedos de Sousa encontram em cada tecla, cada nota e cada imagem uma possibilidade de conceber um mundo novo.

Com ‘Samsara’ cristalizou ideias e concebeu um dos documentos mais apaixonados a surgir no panorama português nos últimos anos. Tão simples quanto isso. Com ‘Um Piano nas Barricadas’, traz inéditos e promissores horizontes que primam logo pela riqueza da diversidade instrumental. Por aqui encontra-se a melodia do clarinete, o ritmo da percussão, o calor da guitarra clássica ou o universo sonhador da harpa. A sensibilidade na forma de interligação entre estes pontos reserva tanto de inesperado como de revelador. Tudo começa no piano sim, mas o que daí nasce é uma surpreendente viagem para o ouvinte. O resultado situa-se para lá do que até então poderíamos estar familiarizados com a sua obra. E neste momento nada poderia fazer mais sentido na carreira de quem já deixou um cunho muito próprio.

A ZDB tem agora o privilégio de acolhê-lo naquela que será a primeira escuta colectiva do próximo disco. Para evidenciar este registo, Tiago estará acompanhado por dois músicos completando assim o papel de trio. Trata-se pois de um aguardado regresso ao palco desta casa de uma das constelações mais brilhantes dos nossos tempos. NA

Formação: Tiago Sousa piano  |  Ricardo Ribeiro clarinete | Baltazar Molina percussão

Entrada: 8€ | Bilhetes disponíveis na Tabacaria Martins, Flur e ZDB em dias de concerto | reservas@zedosbois.org

Entrevista Tiago Sousa 2014:

http://www.branmorrighan.com/2014/09/entrevista-tiago-sousa-musico-portugues_9.html

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[DESTAQUE] Tiago Sousa tem novo disco – Coro das Vontades – e concerto no Teatro Maria Matos https://branmorrighan.com/2015/02/destaque-tiago-sousa-tem-novo-disco.html https://branmorrighan.com/2015/02/destaque-tiago-sousa-tem-novo-disco.html#respond Mon, 16 Feb 2015 12:44:00 +0000

Coro das Vontades

um disco com música de Tiago Sousa e textos de Joana Rosa, Inês Leitão e Paulo Carvalho

O Coro das Vontades é o novo disco de Tiago Sousa. A edição desta obra comissariada pelo Teatro Maria Matos, será assinalada com um concerto a ter lugar no teatro lisboeta, a 8 de Abril, momento em que o CD será oferecido a todos os que a ele assistam.

Em antecipação, Tiago irá enviar O Coro das Vontades, em formato digital, a todos os subscritoes da sua newsletter no final deste mês, Fevereiro. Quem ainda não tiver subscrito poderá fazê-lo através do site www.tiagosousa.org. No dia 15 de Março a versão digital será dispnibilizada ao público em geral através do mesmo site e no novo Bandcamp do músico.

Teatro Maria Matos 8 abril 22h

Do coro das vontades a um piano nas barricadas

O Coro das Vontades, originalmente comissariado pelo Teatro Maria Matos, e aí apresentado no Dia do Manifesto a 14 de Julho de 2012, parte da criação de dois finlandeses, Tellervo Kalleinen e Oliver Kochta-Kalleinen, que em 2005 organizaram o primeiro Complaint Choir na cidade de Birmigham. Os artistas decidiram disponibilizar o conceito na Internet em open source. Os coros de queixas começaram a emergir em todo o mundo: Helsínquia, Hamburgo, São Petersburgo, Melbourne, Jerusalém, Budapeste, Chicago, Florença, Vancouver, Singapura, Copenhaga, Filadélfia, Milão, Hong Kong, Tóquio, Roterdão. A convite do teatro lisboeta, Tiago Sousa propõe uma abordagem a este conceito.

Partindo de textos enviados pelo público do Teatro Maria Matos, Tiago Sousa e Joana Rosa criaram este espectáculo a partir de questões levantadas pelos manifestos e chegaram à ideia de separação. Da separação inerente à condição do cidadão, que entrega o seu poder à esfera política, à separação entre autor e público, nos seus papéis de emissor e receptor.

À ideia iluminista que vê o Autor como um agente de intelectualidade, ou de sensibilidade, vedada ao público comum, ignorante da arte enquanto prática, propõe-se a ideia de que tanto o autor quanto o espectador são emissores e receptores de ideias, potenciais criadores de um diálogo dinâmico de partilha.

Os autores propõem a oposição desse sujeito pensante que se reconhece como tal separado de sentido e de corpo, a um novo sujeito pensante que se expressa pela via da acção. Exercendo-a sobre si mesmo e sobre os outros. Buscando a sua harmonização e realização de modo colectivo e emancipatório.

Créditos:

Créditos:

conceptualização, piano e composição Tiago Sousa

conceptualização, edição e escrita de textos Joana Rosa

clarinete soprano Ricardo Ribeiro

violoncelo Ulrich Mitzlaff

soprano Beatriz Nunes

actriz Inês Nogueira

uma encomenda Maria Matos Teatro Municipal

agradecimentos Os autores agradecem aos amigos, familiares e a toda a equipa do Teatro Maria Matos pelo contributo dado na realização deste disco. Em especial a Mark Deputter e Pedro Santos. Por fim, agradecem a todos os que contribuíram com os seus manifestos e ideias.

This work is licensed under Creative Commons License: Attribution-NonCommercial-ShareAlike 4.0 International (CC BY-NC-SA 4.0)

 International License. To view a copy of this license, visit https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/4.0/

01 A Terra Treme

a partir do original de Mónica Amaral Ferreira

A Terra Treme (a casa cai)

02 Antígona

Joana Rosa

Quando erguidos e retos

Descobriremos insurretos

Antiga Antígona

Primeira lei interior

Anterior às leis dos homens

03 Cinco crimes por dia, amor meu, e seremos nossos

Joana Rosa

I.

     Preparai-vos

     Saí de vós

     Desfazer não

     Traz temor se

     Confiais na

     Promessa que

     Se esconde

     Atrás da

     Cortina de fogo

     II.

     Manifesta-se a

     Estrada cortada

     Ao espanto

     Anunciada

     Por um Piano

     Na barricada

     III.

     A primordial

     Forma do mundo

     Inspira, é mimética

     Imago Mundi aberta

     IV.

     Dirigi-vos

     Entrai em vós

     Chegar não é louvor

     Se vos focais na meta

     Não vês que é certa

     A perda de sentido

     Do caminhar

     V.

     Libertai

     Da Mente

     Os pássaros

    Como Prometeu

     O fogo

     Que a dádiva

     Torna livre

     Aquele que dá.

04

Manifesto a favor da utilização

dos transportes públicos / Manifesto pela saída de emergência

Inês Leitão

Fonte Sonora A

Faço questão do autocarro público, das pessoas contra o meu corpo, de ir para o trabalho a achar que eu sou os olhos e as mãos de todos os que passaram por mim, de todos os que me tocaram inocentemente, ostensivamente, luxuriosamente.

Faço questão dos seus olhos a fitarem os meus: dos seus olhos, de como se abrem e fecham tão rapidamente sem que eu compreenda o fenómeno do fechamento das pálpebras cansadas e da densidade das sobrancelhas. Faço questão de os ver dormir quando o cansaço os agarra e de os ver despertar para sair, automáticos e autónomos. Gosto de dar atenção às suas expressões, àquilo que a sua cara diz quando se silenciam sozinhos e falam para dentro onde eu não oiço.

Faço questão dos dedos, de lhe contar os pelos da pele das mãos, de lhes conhecer perfeitamente as mãos sem que se apercebam dos meus olhos na sua pele.

Faço questão do tamanho das unhas, do contorno da barba, do desenho do queixo na anatomia total do corpo a que pertencem.

Faço questão que o autocarro chegue cheio e quente de gente e que o vapor se instale na janela para eu poder desenhar e escrever. Faço questão de desenhar e escrever no vapor deles.

Faço questão do número de senhoras da minha idade, de lhes analisar as ancas e adivinhar quantas pessoas lhes dormiram no útero durante nove meses de gestação.

Faço questão das roupas que usam de manhã e que trazem no fim do dia. Faço questão de pensar neles sem roupa

(o ato de vestir é o mais terrível ato de egoísmo individual sobre a humanidade)

e faço questão da transpiração.

9

Faço questão das gotas de água a saírem de poros invisíveis e audaciosos, faço questão do milagre do suor do corpo quando somos tantos no mesmo espaço, tantos a respirar o mesmo ar, tantos a suar os mesmos medos. Faço questão do barulho do motor do autocarro, de me agarrar a ferros mornos de gente para resistir à queda. Faço questão de sentir o ferro e de invejar a sorte da sua condição de ferro de autocarro público: tão tocado por tantos. Faço questão de não esquecer

(não esquecer um só)

e de me sentir feliz sempre que os vejo chegar à hora certa (a perturbação invade-me e as minhas mãos tremem ao pensar no que pode ter causado a ausência)

Faço questão que o autocarro venha cheio de corpos para eu poder entrar de lado e jurar a todos com licença. Faço questão de gravar as suas vozes na minha memória para poder reproduzi-las quando me deito e penso que a cidade de Lisboa é muda à noite

(só à noite)

quando não há ninguém nem nada de novo a acontecer nas paredes do meu quarto. Faço questão do cheiro do champô deles no autocarro, do desodorizante, dos perfumes, dos roupeiros

(tantos, tantos, tantos).

Faço questão de me encostar aos seus corpos de propósito, de aproveitar os instantes das travagens abruptas do autocarro para poder tocar-lhes e olhar cada um nos olhos a suplicar perdão pelo toque usurpador

— com licença, desculpe,

senhora, o seu perdão

Faço questão de repetir o transtorno

— com licença, por favor, desculpe

vezes sem conta,

— perdão, senhor, perdão

por todos os corpos presentes, até ser a minha vez de tocar para sair, triste e em tropeço, agarrando as mãos ao ferro como uma despedida de dor com cheiro a aço, colocando o dedo na campainha com a certeza de que os meus ouvidos ouvirão

— dlim-dlão

dlim-dlão

Fonte Sonora B

1. Contra o vento do metro na minha cara

quando eu vou trabalhar,

contra o Jornal de Negócios no degrau do

escritório de manhã,

contra todas as saídas de emergência desta

cidade,

plim.

2. Contra o rating,

contra a precariedade e contra o capitalismo

desenfreado,

plim.

3. Contra o BPN,

o BPP,

a Standard & Poor,

plim.

10

4. Contra mim,

contra o meu corpo carregado de

precariedade,

plim.

5. Contra o que podemos comer e

contra o que não podemos comer,

plim.

6. Contra todo o tédio,

contra a minha cara numa entrevista de

emprego falhada e contra a alma do meu

avô, sindicalista antes de 1974,

plim.

7. Contra a minha vagina,

contra a precariedade da minha vagina e

contra as pilas que já passaram por ela sem

a olhar,

plim.

8. Contra a raiva que tenho entre os dentes

à laia de cárie dentária que levo na boca até

à cadeira do meu trabalho,

plim.

9. Contra a pele dos meus lábios a queimar

à beira da chávena de uma bica demasiado

quente às 08:46 da manhã

antes do serviço,

plim.

10. Contra a pequena janela que tenho à

minha frente e

contra os meus dedos a bater com violência

na chapa plástica do teclado do meu

computador,

plim.

11. Contra o meu carro na oficina há três

meses por falta de pagamento,

contra a ideia de ter de comer o meu chefe

para subir de escalão e

ganhar mais do que os meus colegas: contra

aquilo que a minha boca não diz e

a minha cabeça pensa,

plim.

12. Contra o meu corpo,

contra a ideia de esmagar a minha cabeça

na parede com muita força até a abrir e tudo

se tornar irreversível,

plim.

13. Contra o mundo todo,

contra todos os movimentos pela paz,

plim.

14. Contra o Ghandi,

contra o Luther King e

contra o Mick Jagger,

plim.

15. Contra o José Luís Goucha,

contra a Júlia Pinheiro e

contra a saliva do Sr. Silva,

plim.

16. Contra os carros,

contra os pneus dos carros e

contra as bicicletas que não poluem,

plim.

17. Contra a morte de Saramago e

contra os ecos do livro de Lobo Antunes na

minha cabeça,

plim plim.

18. Contra a minha cabeça,

plim.

19. Contra a cabeça da minha mãe e

do meu pai,

plim.

20. Contra a violência da solidão e o cheiro

da urina seca num beco de Lisboa,

plim.

21. Contra o ar condicionado e contra a

escravatura do clima controlado,

plim.

22. Contra o blazer preto e contra o inverno,

plim.

23. Contra a chuva,

contra o medo e contra os fascistas da

Faculdade de Letras em 2006,

plim.

24. Contra o temor,

contra o Mário Crespo e o pânico na cara

dos outros,

plim.

25. Contra a violência,

o despudor,

contra as gralhas do jornal da SIC,

plim.

26. Contra o engano,

contra as baratas e contra os escaravelhos

amigos escondidos de mim,

plim.

27. Contra os que tropeçam e caem em

balsas quando os barcos se afundam com

pessoas presas lá dentro,

contra o mau tempo no canal,

plim.

28. Contra o mundo todo e todos os

mundos,

contra a vida que levamos e aquilo que

corremos,

plim.

29. Contra a resistência dos resistentes,

contra a sobrevivência dos malditos:

contra o meu umbigo e contra a democracia

que temos,

plim.

30. Contra mim, que tenho 30 anos, e

contra a geração fon-fon-fon:

contra ti e contra aquilo que nos tornámos

os dois multiplicados por tantos,

plim.

A favor de todas e quaisquer saídas de emergência intencionais e

criteriosas que nos levem daqui para fora,

dlim-dlão,

dlim-dlão

05 Sentados nas pernas

Joana Rosa

As pernas cruzadas

Freiam a alma

Ignotas do uso

Desconhecem acreditar

E do pensamento só saía

O espanto de um corpo

Que não se sentia

A vontade tocando

Não existia

Alguém — Quem?

Lavou e torceu

Esse pano

Para secar

06 O que é um coro?

… e um coro de vontades?

Paulo Carvalho

Se de vivos falamos, o todo é infinitamente mais pequeno do que as partes. O todo — a civilização (ocidental ou oriental), o continente, o país, a classe, a multidão, a instituição, o partido, o gang, a turma, o género, a família… — são as verdadeiras partes, meras ideias (ainda que armadilhadas), estilhaços de violência implícita, prontas a serem arremessadas ou defendidas, ameaças distantes ou baluartes próximos, que nada são quando comparadas contigo, que és imensidão, que não és parte (ainda que participes), porque não és um triângulo de vidro ou peça de puzzle que se encaixe ou solde. Não és um soldado, ainda que te solidarizes. Também não és inteiramente sólido. Partes só e esburacado para o encontro, encontras-te só e esburacado depois dele. O vento passa dentro desses buracos e no interior dos buracos do encontro. Infinito, entre infinitos, és tu, sou eu. Se te afastas, sentes frio; se te aproximas demais, corres o risco de sufocar. E eu contigo. Não nos conhecemos, conhecemos reações, alquimias a que damos nomes grandes (pelo medo de não sabermos). Infinito é apenas um dos nomes do mistério que te habita e que és. Que me habita e que sou. Foi por isso que, antes dos nomes, a voz sobreveio ao mutismo do corpo. A tua no teu, a minha no meu, a dele no seu. E a primeira forma da voz foi o grito. E o grito, assim fora do corpo, atemorizava. E foi para vencer esse medo que o tímpano — a primeira fonte do medo — se tornou fino e, muito antes da afinação, procurou a afinidade. E, desde então, cada voz existe na distância em que outra a deixa ser. É, pois, o tímpano que marca a distância: pela escuta. Da tua voz, da minha. E da terceira voz, a dele. E assim nasce o canto plural, que já não é só voz, mas cada voz unida a outras vozes singulares modelando os gritos: as vontades na distância exata — que nunca é exata, ou que o é apenas na procura do tom comum. O coro já não é um todo, difusa ideia a combater ou a defender, é a convergência de vozes singulares em ação. 

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[Música] Tiago Sousa com concertos em Setúbal e Lisboa https://branmorrighan.com/2014/11/musica-tiago-sousa-com-concertos-em.html https://branmorrighan.com/2014/11/musica-tiago-sousa-com-concertos-em.html#respond Sun, 23 Nov 2014 23:30:00 +0000

Tiago Sousa vive acima das fronteiras dos géneros, traçando um mundo seu onde as heranças clássicas partilham espaço com ideias que escutou noutras vivências mais próximas (…) das periferias da cultura pop/rock.”

João Lopes, Sound and Vision

Reconhecido primeiramente pelo trabalho de editor desenvolvido com a netlabel Merzbau – que lançou nomes da dimensão incontornável de um B Fachada ou um Noiserv – TIAGO SOUSA tem vindo a revelar-se, desde a sua estreia a solo, já há 6 anos atrás, como um dos mais fascinantes músicos nacionais.

O músico encerra o ciclo de concertos dedicados a Samsara com dois concertos em Setúbal e Lisboa. Em breve haverá novidades sobre o próximo disco a ser editado em 2015.

5/12 Festival Lado B, Casa da Cultura (Setúbal) + Timespine

+ info http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=22031

11/12 Guilherme Cossoul, Lisboa

21.30, entrada: 5

Av. D Carlos I, nº61 Lisboa

Entrevista a Tiago Sousa no Morrighan: http://www.branmorrighan.com/2014/09/entrevista-tiago-sousa-musico-portugues_9.html

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Entrevista a Tiago Sousa, Músico Português https://branmorrighan.com/2014/09/entrevista-tiago-sousa-musico-portugues_9.html https://branmorrighan.com/2014/09/entrevista-tiago-sousa-musico-portugues_9.html#respond Wed, 17 Sep 2014 10:51:00 +0000 Já passaram algumas semanas desde que tive o prazer de entrevistar o Tiago, mas só hoje consegui sentar-me com tempo e disposição para a transcrever. Gostava de ter conseguido fazê-lo logo na altura, mas andei algumas semanas doente e este é um trabalho que também requer concentração e disponibilidade mental. O que é certo é que desde então esta é uma entrevista que me “assombra” porque o Tiago Sousa é daqueles artistas interessantíssimos, com uma obra musical que transcende a própria música e que abraça também a literatura e outras artes. A entrevista surgiu através do Magafest, que se realizou no dia 6 de Setembro e chega então agora até vós. 

Fotografia Vera Marmelo

A aventura do Tiago no mundo da música já traz consigo uma longa história, começando pela sua infância e pela sua avó que dá aulas de piano: «O piano é um instrumento que me acompanha há bastante tempo, deve ter sido das minhas primeiras brincadeiras de miúdo – improvisar ao piano. Ainda tive aulas até aos 8 ou 10 anos, mas depois entrou aquela fase mais parva, da pré-adolescência, e os teus interesses começam a ser outros. (risos) Desliguei-me um pouco do piano, que é um instrumento muito rígido e com uma disciplina muito marcada, mas sempre mantive uma ligação à música – comecei a tocar guitarra, entrei em bandas de rock… Aquelas coisas normais (risos), aquela rebeldia de tentar sair das saias da minha mãe e da minha avó. Passei por essas fases todas até chegar a uma altura em que senti uma espécie de crise de identidade – que o que estava a fazer não era particularmente diferente do que o que os outros já faziam. Foi então que o piano surgiu novamente como uma espécie de desbloqueio criativo, precisamente porque havia uma ligação muito anterior e um bocado emocional. Eu não queria seguir um procedimento muito académico, não queria ter aulas, não queria nada disso. Queria mesmo pegar no instrumento e tentar descobrir por mim o que é que conseguia fazer com ele. E nos últimos seis anos a minha dedicação tem sido precisamente essa.»

O primeiro trabalho do Tiago, Crepúsculo, data do ano de 2006. Desde então, vários foram os discos lançados, e com eles veio a particularidade de, ao contrário do que é habitual, as suas músicas se manifestarem como uma longa-metragem, ultrapassando, em tempo, o período habitual de três ou quatro minutos. Essa escolha, disse-me o Tiago, foi um pouco acidental: «Aquilo que se começou a tornar cada vez mais claro para mim foi que eu gostava, de facto, da música dita erudita – é precisamente um certo comprometimento com a obra estética e não só a forma como atinge o público, mas também todas as questões filosóficas, sociológicas, antropológicas e políticas que possam surgir no simples acto de criador. Isso interessa-me muito e eu acho que é isso que faz com que a minha música ganhe alguma densidade e que torne difícil ter um princípio, meio e fim num curto espaço de tempo. Mas isso não é um cânone para mim, se olhares para um disco como, por exemplo, o Insónia, e mesmo um disco que estou a preparar agora para sair, já são discos de faixas curtas. Às vezes quando estou a trabalhar num disco como o Crepúsculo, o Samsara ou o Walden Pond’s Monk, de facto há uma ideia muito mais cinematográfica de construir um disco, de haver uma narrativa que conduz o ouvinte ao longo de trinta minutos, o que seja. Mas não é sempre assim, depende sempre do tema que estou a tratar. Há discos que têm uma narrativa e uma ligação conceptual muito próprias, que faz sentido aprofundar e olhar para eles como uma peça inteira e não como uma série de canções. Já o Insónia, por exemplo, não é nada disso, é muito mais inconsequente nesse sentido. e é simplesmente eu a tentar fazer algo de música com o piano. Não existe nada assim adquirido, na realidade. (risos)»

Seja qual for o disco, existe sempre esta imagética cuidada e pensada que também bebe muito da mitologia. Sendo fascinada pelas várias mitologias, não resisti e perguntei-lhe o porquê dessa referência: «Como te disse, a música erudita tem sido um foco meu. Não é tanto o lado virtuosístico ou o lado mais académico, mas sim esse lado que eu acho que ascende mais à origem da própria prática musical, que tem uma ligação muito forte com a religião cristã, e penso que isso tem repercussões em todos os músicos que surgiram ao longo dos séculos. Existe um comprometimento muito forte entre o autor e a obra que está a criar, não é de ânimo leve e muitas das vezes consegues até pressentir a pessoa que está por trás da música que faz. Eu acho que aí é que a coisa é mesmo importante e mágica – é a ligação a metáforas e outras imagens que possam surgir e que é muito importante para mim porque revelam esse lado mais profundo da música que não se esgota na simples audição, mas antes que desperta o ouvinte numa descoberta, ele próprio, em torno daquilo que estou a tentar aludir. Cada um ouvirá coisas diferentes nos meus discos e acho que isso também é interessante. Não quero limitar a experiência de quem ouve e por isso vou deixando umas pistas ou no nome do disco, ou no texto que o acompanha, mas que terá sempre interpretações diferentes e eu gosto disso, acho que enriquece a obra.»

As referências são muitas, e algumas vão mesmo até à literatura: «No Walden Pond’s Monk, a principal influência é o Henry David Thoreau, escritor americano do séc. XIX, que passou dois anos junto ao lago Walden a tentar perceber qual era a essência da vida, tentar ir ao mais profundo âmago da vida, ou seja, viveu praticamente sem materialismo nenhum, construiu a sua própria casa, vivia daquilo que conseguia plantar, basicamente tentava viver numa espécie de auto-subsistência super reduzida. A forma como ele explica isso no livro é absolutamente mágica e também está cheia de referências de mitologia clássica, referências dos pensadores orientais, e é delicioso também por isso mesmo, porque tu estás a aceder a um ensaio filosófico de uma profundidade incrível. Foi isso que me inspirou na altura a fazer esse disco, precisamente por haver uma interligação muito forte entre aquilo que eram os meus ideais e a minha forma de fazer a música e aquilo que ele estava a transmitir por palavras. Houve uma identificação imediata que aconteceu nos valores e na ética de fazer as coisas, que transportou depois para a música e a tornou tão natural, que a homenagem quase se tornou inevitável. No caso do Samsara já foi um bocadinho diferente, já foi mais ponderado, é um disco que tem uma narrativa mais densa, penso eu. Tem uma ligação bastante forte com o termo hindu que significa precisamente o ciclo de repetição do nascimento, da vida, da morte e do renascimento. No fundo é esta constante passagem de estados, um fluxo perpétuo que se prolonga pela existência, as coisas nunca são estanques. Essa ideia interessou-me muito, não tanto pela questão religiosa, mas muito mais pela ideia desse fluxo contínuo que surge e que eu identifico não só ao nível individual, porque isso também acaba por ser uma forma filosófica de resolvermos o problema da morte e da finitude, mas muito mais de olharmos para isto como um todo. Sociologicamente, se olharmos para a civilização e percebermos como ela evolui é porque existe uma interligação cultural, das diferentes gerações, que vai perpetuando uma série de valores e de princípios, alterando também, com o curso do tempo, através da radicalização do pensamento, de transformação de formas de estar, e foi sobre isso que eu quis falar. Ou seja, como é que construindo opostos consegues encontrar uma linha harmónica que consegue equilibrar isto tornando-o tão mágico. (risos)»

Para o processo criativo, estabelecidas as bases, todas as influências acabam por contar, inclusive as colaborações com outros músicos. Uma delas aconteceu no álbum Walden Pond’s Monk, em que participaram Ricardo Ribeiro e Baltazar Molina: «Começou comigo a mostrar inicialmente ao Ricardo, e depois ao Baltazar, a peça que eu tinha, e eles construíram em cima disso. Foi uma construção em conjunto e não eu a escrever a parte deles. Foi dada total criatividade, tanto a um como a outro, para interpretarem a peça como melhor entendessem. Às vezes há alturas em que, por imposições de prazos ou outras razões, me vejo obrigado a ser mais objectivo e a escrever as partes dos outros músicos. Mas mesmo quando o faço tento ao máximo ter a sensibilidade de perceber como é que o músico olha para aquilo que lhe estou a mostrar. Quando mostro uma pauta a um músico existem muitas imprecisões e gosto de trabalhá-las com eles, por isso estas experiências com músicos têm sido bastante enriquecedoras, precisamente porque eles têm outras visões que eu não tenho e que trazem uma profundidade que às vezes eu não consigo. Mas todas as relações, mesmo no quotidiano, acabam por me influenciar. Não há um Tiago Sousa músico e um Tiago Sousa outra coisa qualquer, as coisas estão todas interligadas. Eu tento ser uma pessoa o mais honesta e sincera possível e tento transportar isso na minha música como no dia-a-dia. No fundo é tentar ser consequente com aquilo que faço e que não sejam demasiado estanques.»

Uma das coisas que caracteriza muitas vezes o mundo da música são os vários circuitos que existem consoante o género. Apesar de a música de Tiago Sousa beber muito da música erudita e das referências que tal apela, Tiago não considera que a música que faz seja erudita, nem que haja propriamente um circuito a que possa pertencer: «Eu não vou fazer os circuitos dos festivais de Verão, por acaso este ano tive a oportunidade de tocar no festival Bons Sons e foi uma experiência muito enriquecedora, mas foi muito particular porque toquei num auditório, ou seja, não é música que tu possas trazer para um espaço exterior e fazer aquilo funcionar. Não existe um circuito muito claro ao qual eu possa pertencer, acabo por ir gravitando à volta de uma série de pessoas que muito generosamente vão apreciando aquilo que faço e que me vão convidando e dando apoio, como o caso da Inês (Magafest). E é assim que as coisas têm acontecido comigo, são pessoas que vão descobrindo a minha música e vão ficando interessadas, por qualquer razão que seja, e que me vão dando essas oportunidades. Mesmo quando vou tocar lá fora, tem sido um bocado assim. Tento sempre é que exista esse respeito porque de facto é uma música que tem um espaço muito particular e é necessário que esse espaço lhe seja dado para poder ser devidamente apreciada.»

Qual será a maior diferença ao tocar este tipo de música em Portugal, que é um país de massas e mais comercial, e no estrangeiro? «O que tenho sentido quando vou tocar lá fora é que as pessoas estão muito predispostas a ouvir. Que é uma coisa que aqui, às vezes, tenho dificuldade em sentir. Tem acontecido menos porque vais ganhando algum reconhecimento e as pessoas ficam mais atentas, mas em Portugal as pessoas vão aos concertos mais para estarem umas com outras e não tanto para usufruir do concerto. O que é um pouco estranho e paradoxal, estamos a viver uma das fases em que mais festivais e concertos existem, a oferta é imensa, e depois vais ver as experiências que as pessoas trazem deles e são, muitas vezes, superficiais. Lá fora, parece-me, e não é exclusivo, em Portugal também acontece, é que existe um hábito muito maior de perceber a complexidade das coisas e de estar predisposto a ouvir e a respeitar. Mesmo que depois no fim cheguem à conclusão que não gostaram. E isso tem também a ver com o contacto com a tal música erudita. Qualquer puto de Paris já foi pelo menos uma vez à Ópera, ou ver a Orquestra Sinfónica, ou um solista tocar. Em Portugal, se fores perguntar à maior parte dos teus amigos, se calhar ainda nenhum viu um concerto de música acústica (risos). A sensibilidade também é uma coisa que se cultiva, tem de haver uma certa prática. E acho que essa é a maior diferença.»

Fotografia Vera Marmelo

Quanto ao concerto mais intenso, e por ser péssimo em questões de algibeira, Tiago Sousa elegeu o último no Bons Sons: «Foi um concerto onde tudo funcionou bem, consegui eliminar uma série de preocupações e de abstrair-me de tudo à minha volta. Consegui ser mais objectivo com aquilo que estava a fazer. Durante muitos anos andei a recusar o academismo, e depois cheguei à conclusão que precisava de uma série de preceitos e de uma série de métodos que esse academismo transporta. Portanto, fui eu próprio estudar, sem um professor, porque eu tenho um bocado essa necessidade de correr pela minha própria vontade. Fui então pesquisar e desenvolver algum conhecimento sobre como é afinal tocar piano! (risos) Porque afinal é uma coisa bastante complexa, requer uma boa coordenação motora e uma grande capacidade de concentração. E de facto, neste concerto, correu tudo muito bem, ao ponto de que quando comecei o concerto tinha uma sala simpática à minha frente e, de repente, quando estava a terminar, olhei para a frente e tinha a sala completamente cheia e nem sequer me apercebi de nenhuma daquelas pessoas ter entrado na sala. Consegui mesmo estar naquele momento presente. Foi uma coisa mesmo especial para mim, principalmente porque tem todo um processo atrás, de alguma dor e sofrimento (risos), quando aquilo aconteceu foi mesmo – bolas! – agora é só continuar e prosseguir que assim as coisas conseguem ser muito mais valiosas para mim e para o público.»

Na calha já estão mais dois álbuns, um deles com voz para sair no início de 2015, mas o foco vai estando em apresentar os trabalhos mais antigos. Da minha parte, que tenho ouvido os seus discos com frequência enquanto trabalho no meu doutoramento, só posso aconselhar a que ouçam e a que vão ver o Tiago assim que possam. Deixo-vos os links principais para o seguirem e ao seu trabalho:

Facebookhttps://www.facebook.com/tiagomsousa

Site Oficialhttp://www.tiagosousa.org/

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