À Conversa com Tiago Sigorelho e Pedro Saavedra sobre o projecto Gerador

Gerador, é este o nome da mais recente plataforma de acção e comunicação para a cultura portuguesa! A divulgação do projecto já começou e com ela também a concretização de um dos projectos do Gerador, a revista trimestral Gerador! Com a participação de várias pessoas das mais diversas áreas da nossa cultura, este é apenas o primeiro passo que a iniciativa deu para chegar ao público e o segundo acontece já este fim-de-semana, no Sábado.

Mas afinal quem são estas três pessoas e o que é, ao certo, o Gerador? Qual o seu conceito de cultura? O que é que pretendem alcançar? Foi a estas perguntas e a outras quantas que Tiago Sigorelho e Pedro Saavedra, dois dos três fundadores, sendo o terceiro o Miguel Bica, aceitaram responder, dando-nos algumas novidades em primeira mão.

Tiago Sigorelho, Pedro Saavedra e Miguel Bica conheceram-se através de um cruzar de interesses no projecto PT BlueStation, um espaço onde havia eventos/actividades culturais todos os dias. Desde que se conheceram, foram falando várias vezes sobre o que é que poderiam fazer mais sobre a cultura portuguesa: «Houve um dia em que achámos que fazia sentido lançarmos um projecto e criarmos o Gerador. Desafiei-os a pensar num projecto alargado, em que a revista seria apenas uma das iniciativas», conta-nos o Tiago. O que é certo é que os três se despediram dos seus respectivos trabalhos e, em Março de 2013, começaram então a preparar todo este projecto que é agora o Gerador. «Foi nessa altura que começámos a pensar, a estruturar as coisas, a percorrer o país de lés a lés e a bater à porta de cada parceiro, para os convencer a entrar neste projecto», completou.

Num mundo em que a era digital domina boa parte das publicações, o Pedro explicou-nos que «Nós, os três, não acreditamos que as publicações impressas estejam mortas.» Apesar de muitas publicações terem passado para a web, a essência da revista Gerador foi «criar um objecto em papel tão interessante que não fosse possível ter essa experiência de outra forma.» Com isto, não quer dizer que a publicação não tenha uma extensão online, mas a intenção dos criadores do Gerador foi criar algo que as pessoas possam guardar, ler e reler, e que, daqui a uns anos quando olharem para 2014, vejam que têm duas publicações que reflectem a cultura portuguesa do momento em que foram publicadas, e que sirva como um Almanaque. «Apesar de estarmos na era dos e-books, as pessoas continuam a levar para a praia o objecto em papel. É na mesinha de cabeceira, é nas estantes, as pessoas continuam a gostar de lombadas, e dentro disso nós imaginámos o objecto como um objecto de culto. Todas as revistas vão ser diferentes, todas vão ter um designer diferente, que é em si também um autor.»

Design Sónia Rodrigues

O formato irá manter-se, mas o design em si pode variar radicalmente. «A intenção é as pessoas terem curiosidade em obter o objecto ainda antes de lerem o conteúdo.» Se ao início 116 páginas pareciam muitas aos seus criadores, é certo que quando este número saiu já tinham material para pelo menos três números. Outra intenção é fazerem com que cada pessoa sinta que o objecto é delas e também um espaço foi criado, na capa, para a pessoa colocar o seu nome.

Quanto à definição da palavra Cultura, e o que o projecto Gerador encara como tal, o Tiago esclarece-nos: «A palavra Cultura, para nós, é muito mais ampla do que o significado mais habitual. Embora a maioria das pessoas relacione cultura à cultura clássica ou alta cultura, para nós a cultura é muito mais do que isso e começa logo com aquilo que identifica o indivíduo. Para nós, a nossa identidade e aquilo que nos define, como a nossa gastronomia, a maneira como nos vestimos, os nossos sotaques, ofícios e outros, tudo isso define a cultura.»

Dada esta amplificação do conceito de Cultura, perguntei-lhes se não haveria o receio de se dispersarem ou de não conseguirem cobrir tudo. Tiago explicou-nos, em primeira mão, que «na nossa página da internet, gerador.eu, vamos ter a continuação deste estilo que temos aqui na revista.». Ou seja, mesmo que num dado número não consigam tocar algumas das áreas, esse espaço na web servirá como um complemento à revista no tempo que medeia entre o lançamento de dois números. «Durante este período irão aparecer novas áreas. Uma já podemos anunciar, é o artesanato, em que vários outros autores vão escrever da mesma forma como estão na revista escritas, mas cujo conteúdo irá aparecer no nosso site e no nosso facebook. Outra coisa importante é que, apesar de não acreditarmos que as publicações impressas estão mortas, não desvalorizamos nada a presença online. Nós achamos é que mais do que passar os conteúdos da revista para o online, ela não vai existir online, o que nós vamos fazer é ampliar os conteúdos. Nem é darmos mais detalhes sobre um dado artigo, vamos criar novos artigos, mas alinhados com os artigos da revista. Dessa maneira acreditamos que vamos chegar a mais pessoas.»

A revista foi anunciada na Sexta-feira, mas é certo que neste pouco tempo as mensagens ainda não pararam de chegar, tanto de sugestões de áreas a cobrir como de ideias/iniciativas. Se antes tinham uma pequena gaveta com algumas ideias, «agora parece um armário!».

Um ponto de partida importante, é este que o Pedro destaca: «Nós queremos retirar a Cultura do peso institucional, do apoio do estado, do apoio público. Não temos nada contra o apoio público, mas o nosso desafio enquanto projecto foi descobrir formas de financiamento e modelos de negócio que nos conseguissem fazer produzir coisas interessantes, mas todas essas coisas têm um custo. Produzir uma revista é uma coisa muito cara. O projecto não é a revista, mas a revista é uma das dimensões do projecto. Nós queremos que o projecto evolua de muitas formas. Quanto ao nos dispersarmos, se fosse só uma revista, talvez corrêssemos esse risco, mas não nos vamos limitar a esse espaço de duas dimensões.»

E tanto é verdade que é já neste Sábado que acontecerá o primeiro evento do projecto Gerador, chamado “1ª Comunhão Gerador“, evento onde irão reunir todos os seus parceiros, entidades e convidados. O mote é simples: Como fazer cultura para todos, hoje? É a esta pergunta que todos os parceiros e convidados irão tentar responder. «Vai ser no dia 26, no Sábado, no Espaço Santa Catarina, das 14h às 23h. Irá haver actividades como instalações interactivas, cinema, irá haver grupos de conversa para responder àquela pergunta, haverá teatro, um concerto, e tudo ao mesmo tempo ao longo desse período. Uma questão fundamental para nós é ser homogéneo em todas as iniciativas que temos, a começar pela própria revista. Se queremos realmente trazer menos formalismo à cultura, um dos aspectos que temos de dar atenção é à acessibilidade. Tanto em termos de localização das iniciativas, como de preço. A revista custa 5€, mas em relação ao custo de produção, nunca iremos conseguir reaver o dinheiro investido. A própria 1ª Comunhão é de Acesso Gratuito.», esclarece o Tiago.

Em relação ao conceito do evento 1ª Comunhão, Pedro explicou-nos que a função deles não era tanto dar respostas, mas sim fazer perguntas: «“Como fazer cultura para todos, hoje?” é uma questão pertinente em 2014 e queremos que as pessoas também nos ajudem a entender. Para o evento, fizémos três grupos e as pessoas de cada grupo são completamente diferentes. Temos por exemplo o Hugo Brito, chef, o Fernando Alvim, que todos conhecem, o Vincente do Ó, realizador, entre outros. Nós quisemos juntar pessoas de diferentes áreas porque queremos que estas pessoas falem entre si e que cheguem a pontos de entendimento sobre aquilo que é a cultura para quem a produz e para quem assiste.»

Acima de tudo, a intenção é aproximar quem faz cultura do público e levar o próprio público a aproximar-se dos autores que a produzem. «Muitas vezes as pessoas criticam coisas que não conhecem e muitas vezes os autores também produzem coisas que não sabem bem para quem estão a fazê-lo. Esta é uma função onde nos sentimos muito à vontade para mediar, respeitando sempre os gostos. Nós acreditamos profundamente que é possível uma pessoa ter esta revista em cima da mesa de um café em Castro Laboreiro ao lado do Correio da Manhã e gostar de a ler. Nós trabalhámos muito para que o tom e a maneira de estar fosse para todo o tipo de pessoas.», conta-nos o Pedro.

Imagem de Diogo Rebelo

Também o conceito Trampolim do projecto Gerador promete vir a projectar muito da nossa cultura que ainda é desconhecida pela maioria. O conceito é de curadoria de um espaço em que se irá promover novos autores da cultura portuguesa. Seja música, gastronomia, BD, artesanato, cinema, teatro ou outro, iniciativas não irão faltar. 

Se muitos poderiam pensar que o Gerador veio para criar concorrência na área da Cultura, Pedro esclarece-nos que: «Nós temos parceiros que teoricamente podiam ser nossa concorrência, mas nós queremos é criar sinergia com isso. Achamos que uma ideia de rede nos pode levar mais longe, pois seremos mais fortes a produzir. Nós não temos qualquer relação financeira com os nossos parceiros. Nós não achamos que somos especiais, “É um milagre! A revista Gerador vai revolucionar a cultura portuguesa!” Não, não vai, mas vai ajudar a cultura portuguesa a tornar-se mais dinâmica, mais visível para as pessoas. Há muitos projectos que às vezes se colocam nesta posição, mas nós nisto nem se trata de falsa humildade, é que nós somos espectadores ávidos de gastronomia portuguesa, de cinema português, já o éramos antes e mesmo que o projecto acabasse iríamos continuar, mas queremos fazer chegar isto a mais pessoas.» 

Tiago completa: «Nós acreditamos que fizemos uma boa leitura da situação actual. Seja pela simplicidade da linguagem ou pela acessibilidade. Decidimos logo ao início que íamos tratar toda a gente por tu, temos que nos aproximar, mesmo que exista quem fique chocado. Mas temos cuidado com a linguagem. Se os nossos pais lerem, ficarão certamente tranquilos. Quanto aos parceiros, começámos por contactá-los por termos certas necessidades que não conseguíamos colmatar e a certa altura os próprios parceiros acharam interessante o conceito de rede e hoje em dia conseguimos colocar diferentes parceiros em contacto para fins comuns. O que esta rede pode originar, nós não temos noção, mas sabemos que queremos cada vez mais pessoas nesta rede. Até podem não fazer nada para nós, mas podem gerar coisas neste sentido.»

A conclusão, parece-me óbvia, o projecto Gerador, no seu conjunto de actividades e propostas, pode não vir a revolucionar a cultura portuguesa, mas já está a marcar, certamente pela diferença. Quanto mais não seja pela postura. Esta Associação sem fins lucrativos, Gerador, na sua maneira simplista de encarar o seu público, irá certamente conquistá-lo. Eu própria já tenho a revista Gerador, muito obrigada pela oferta!, e é um mimo de edição. O design está muito bonito, todas as secções estão bem definidas e esclarecedoras de algumas dúvidas. Nunca uma Declaração de Amor à Cultura Portuguesa foi tão original. 

Para os interessados, não se esqueçam de aparecer no Sábado, no Espaço Santa Catarina, a partir das 14h, para verem com os vossos próprios olhos algumas das actividades propostas pelo Gerador. 

Fiquem também atentos porque, hoje ainda, irá ser colocado um passatempo online para oferecer 5 exemplares da revista Gerador. 

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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