Amanhã é dia de entrevista com os Dead Combo, algo que há uns meses nunca sonhei que pudesse vir a acontecer, mas a verdade é que se vai tornar mesmo realidade. A causa principal desta entrevista, para além de ser a primeira ao blog Morrighan, é sem dúvida o trabalho mais recente – A Bunch of Meninos. Dez anos após o lançamento do primeiro álbum homónimo, eis que este duo, formado por Tó Trips e Pedro Gonçalves, nos brinda com um novo disco que se distingue pela sua alma, pela magnificência e poder de sintonia e cumplicidade entre estes dois músicos.
É sabido que a magia da música dos Dead Combo bebe bastante da cidade de Lisboa, das suas gentes e paisagens, palcos e interacções. A mim parece-me que a cidade tornou-se parte deles e é certo que, depois de escutarmos um disco que seja, jamais seremos capazes de passear pelas ruas de Lisboa da mesma maneira que antes. A Bunch of Meninos não é excepção.
Começamos com “Waiting For Nick At Rick’s Café”, numa balada calma, num abrir de cortinas lento a preparar-nos para o que ainda está para vir. “Povo Que Cais Descalço” é daquelas músicas em que a cada acorde também nós vibramos, num arrepio ao fundo das costas em que a imagética começa a funcionar e a a fluir livremente.
Assim continuamos com “Arraia” e “Miúdas e Motas”, até que em “Waits” há algo que começa a fervilhar dentro de nós, o som fica no ouvido, o pé bate no chão, a energia invade-nos e damos por nós num miradouro a olhar para o rio Tejo, à espera de algo acontecer, numa necessidade de nos mexermos. Em contraste, a música seguinte, “Zoe Llorando”, senta-nos, leva-nos os cotovelos aos joelhos e a cabeça às mãos num balancear cadente.
“B.Leza” altera-nos novamente o espírito numa sonoridade algo sensual e até, ao seu jeito, atrevida. Fala connosco sobre uma potencial história de jogos de olhares, de uma dança invisível em que os pares se atraem. “Dona Emília” vem claramente por-nos a dançar, a energia começa no primeiro segundo e abana-nos sem dó nem piedade, coisa que também não queremos que tenha. “A Bunch of Meninos” puxa-nos para o palco, qual amante dançante que nos dá as mãos e nos faz rodar, qual anca latina ao ritmo de um compasso electrizante.
“Dos Rios” chega a invocar as memórias do fado, sempre com a marca Dead Combo, sem seguir regras ou convenções, com a irreverência patente de quem não se conforma com a banalidade. “Welcome Simone”, faz-nos perguntar quem será esta Simone e que história terá para nos contar e, a juntar a “Mr. Snowden’s Dream”, outro nome curioso, transportam-nos para um ambiente mais Western, interrogativo, expectante. A festa acaba com “Hawai em Chelas”, um arraial de alegria e vivência, experiências em montra e outras por contar, convidando-nos a recordar tempos de juventude solarengos e felizes.
Tudo o que aqui escrevi é fruto de uma interpretação muito pessoal que pode nem sequer se cruzar com as ideias dos seus autores quando as criaram, mas a verdade é que a música dos Dead Combo é mesmo assim, tem o poder de proporcionar a cada um uma experiência única, um traçar de destino imagético que prima pela liberdade de expressão. Não é à toa que este disco entrou directamente para os tops nacionais, nem que passados estes dez anos sejam considerados dos melhores músicos das últimas décadas. O seu traço é único, a postura também, a alma reflecte não só o ser lisboeta como o ser português, o andar perdido pelas ruas, a saudade do que nunca aconteceu e a ânsia do que está para vir. Por último, há que destacar o artwork. Só pela capa já dá vontade de pegar nele e explorá-lo, ou seja, o produto final ficou de uma mestria brutal. Muito, muito bom.