Fotografias Alípio Padilha
Já não me lembro bem em que altura comecei a ouvir 65daysofstatic. Lembro-me que foi com a Radio Protector, por isso pode fazer muito bem 10 anos, já que o disco é dessa altura. E faz sentido. O que não fazia sentido para mim era eles não passarem por Portugal. O post-rock é o género de música que mais mexe comigo a vários níveis, mas principalmente aos níveis sensoriais e emocionais. Sempre que uma banda, que seja uma referência para mim, vem ao nosso país, faço todos os esforços e mais alguns para a poder ver. Infelizmente, muitos me têm passado ao lado, mas miraculosamente este foi possível. E todo aquele dia 27 de Outubro foi qualquer coisa de fascinante. O dia não correu muito bem, eram 19h e já estava tão cansada, tão nas últimas, que imaginar-me a ir para o Cais do Sodré, sabendo que depois só chegaria a casa sabe-se lá a que horas (afinal moro fora de Lisboa), me parecia uma missão impossível. Mas bora lá, jantar no papo, sorriso no rosto, e lá desci a Avenida da Liberdade de fones nos ouvidos, noite amena, caminhada de quase uma hora para limpar a cabeça, e quando cheguei ao Musicbox a disposição já era outra. Encontrei uma fila considerável, da qual fui salva por estar na guestlist (obrigada Musicbox!), e não tardou muito até os Thought Forms abrirem a noite. Confesso que não fiquei deslumbrada, mas penso que isso se deveu ao facto de eles parecerem cansados e pouco à vontade logo desde o início. Com o decorrer do concerto isso melhorou e fiquei com vontade de saber mais sobre eles e ouvir mais coisas. Está na todo list!
Mas passemos ao que interessa. Caramba, 65daysofstatic, que concerto do car**ho! Do carago! É isso!, já que vocês vinham do Porto do dia anterior. Sou da opinião que a música tem um poder transformador, um poder de nos elevar e transportar para locais únicos, privados, que podem ou não ser partilhados. Esta viagem fiz sozinha. A maior parte das vezes sou egoísta nisto, no que sinto e vivo durante um concerto. E depois há a questão do Musicbox, com a sua arquitectura, ser um sítio que facilmente se pode tornar mágico, assim se reúnam condições para tal e estavam lá todas. O quarteto em cima do palco tinha uma energia tão única, tão visceral, que havia músicas em que claramente éramos atingidos como que por uma onda electromagnética fortíssima, que nos acorda e revitaliza. A qualidade do som, óptima!, ajudou a criar essa atmosfera electrizante. O concerto começou com uma componente electrónica bastante forte, passeando depois por composições mais orgânicas. Na verdade, o jogo que fazem entre uma vertente e outra traz um equilíbrio que os destaca das demais bandas de post-rock. E nem vou falar na maquinaria toda que levaram, na quantidade de pedais e sintetizadores, tudo! Claro que também tenho que destacar o guitarrista principal, era completamente encantador nas suas interacções com o público e também na forma como interagia com os seus colegas. Já o outro guitarrista/teclista, era mais do estilo observador/provocador. Mas caramba, quando as suas mãos começaram a Radio Protector, não só me vieram as lágrimas aos olhos como não pude deixar de admirar a força, a paixão, a entrega dada à exigência daquela música. Ao vivo não é nada fácil de ser tocada e, estando eu ainda por cima de frente para ele, consegui assistir a uma autêntica prova de esforço e resistência. E foi lindo. Dez anos depois tive a oportunidade de os ver ao vivo e foi do caraças. Tivemos direito a encore, a uma nova explosão de energia e, quando terminou, a sensação dominante foi que esta é uma banda em que claramente coloca os seus discos a um canto quando sobem ao palco. Não é que os discos não sejam bons, aliás, sonoramente têm muito mais componentes presentes do que ao vivo, mas a magia que operam enquanto os vemos a tocar é impossível de reproduzir sem essa presença física, sem essa troca entre o músico e o ouvinte.
E pronto, é isto. Há momentos na nossa vida em que as coisas fazem sentido, o universo alinha-se e a beleza toma lugar. Este concerto foi um desses momentos, em que a beleza cósmica se fez sentir em plenitude e eu senti-me uma pessoa melhor por causa disso. A semana acabou por ser atribulada, o doutoramento está a carregar com tudo o que tem, mas é bom voltar a escrever sobre estas experiências! Quero deixar um grande obrigada ao Alípio Padilha, fotógrafo do Musicbox, por me ceder as suas belas fotografias! És um porreiro!
Já agora, no dia anterior fui ver Tindersticks ao Teatro Tivoli, pelo Música em DX! Podem ler o meu texto aqui: http://www.musicaemdx.pt/2016/10/30/uma-viagem-cinematografica-sala-espera-tindersticks/
Beijos e até breve!