Ok, tens um manuscrito, escreveste centenas de páginas, queres dar a conhecer o teu trabalho e partilhar a tua imaginação com o resto do mundo. Tudo bem. Como sabes, se não sabes devias saber, que o caminho é longo e árduo, que um manuscrito precisa de ser imensamente trabalhado, revisto, trabalhado, revisto, quem sabe reescrito, até um mínimo de qualidade e garantia serem satisfeitos, decides enviar esse teu bebé, o teu manuscrito, a pessoas que o aceitam ler, ou seja, a leitores-beta. A função destes, que para além de lerem em modopro bono normalmente têm a intenção de ajudarem e contribuírem, consiste acima de tudo em apontar todo o tipo de observações relativas ao dito cujo. Gostou, não gostou, o que gostou mais, o que gostou menos, coisas a melhorar, coisas a manter, etc., só para dar alguns exemplos.
Nesta fase, o autor do manuscrito arrisca-se a todo o tipo de feedback que pode ir de encontro, ou não, com as suas ambições.
Desde 2010/2011 que alguns manuscritos vão passando pelas minhas mãos. Já cheguei, mais do que a ler, a rever e a fazer sugestões a obras integrais que provavelmente nunca viram nem verão a luz do dia. Outras estão neste momento à espera de publicação, mas com publicação certa. Leituras são coisas que não me faltam, sou uma leitora completamente inveterada, mas gosto de fazer parte do processo e de contribuir com o que puder para ajudar os autores destas novas criações a chegarem a algum lado ou pelo menos a melhorarem.
No entanto, a tarefa consegue ser deveras ingrata, principalmente quando sabemos que o/a dono/a do manuscrito fica ofendido/a com as sugestões ou se julga melhor do que aquilo que lhe está a ser opinado.
Quando um leitor-beta vos diz que o vosso manuscrito tem erros ortográficos e incoerências em género e número, das PIORES respostas que podem dar são:
– “Já esperava que tivesse erros ortográficos”
– “Não revejo o que escrevo”
-“Ignora os erros e liga só ao conteúdo”
-“Devia ter revisto, mas ainda não arranjei quem o fizesse.”
-“Não quero saber já da escrita, mas do conteúdo e da estrutura.”
Gente, não se enganem a vós mesmos, por favor. Um bom conteúdo nunca na vida será suficiente para a edição de uma obra. Mais, uma escrita caótica e errática desmotiva qualquer leitura, por muito interessante que o enredo possa ser, o que em boa verdade, muitas vezes nem é! Imaginem o que é um texto nesse estado chegar sequer a uma editora! É a vossa morte ainda antes de nascerem!
Sei que devem estar a pensar, ‘oh Sofia, mas que novidade nos estás a dar!! Como é que ainda te chocas com estas coisas?’ Pois podem crer que fico chocada à mesma, acima de tudo por haver sempre tanto protesto em relação à resistência das editoras em publicarem novos autores portugueses. Sinceramente, há medida que me passam mais manuscritos pelas mãos, as reações de alguns deixam-me sem dúvidas nenhumas sobre essa resistência.
Quanto a estes casos tenho a dizer que: se não é vossa intenção serem escritores sérios, honestos e respeitáveis, por favor não gozem com a cara de quem aceita ler-vos de boa vontade e de borla. Se não se dão sequer ao trabalho de rever o que escrevem, nem sequer pensem em enviá-lo a alguém que tem mais do que fazer e atentem na postura que têm quando recebem as críticas ao mesmo.
Apesar de este ser um post mais negativo sobre esta experiência, tenho a dizer que ainda há coisa de dias tive uma experiência óptima na qual tenho fé que venha a resultar numa publicação por uma boa editora mais mês, menos mês, mais ano, menos ano. A pessoa recebeu bem as observações apontadas, a postura é de um esforço para se superar constantemente e o respeito por quem leu o seu manuscrito é admirável. Porém nem todos são assim, o que é uma pena. Sei que não sou especialista na área, nem sequer tenho formação alguma em edição/revisão/literatura, mas penso que bom senso é algo ao alcance de todos.
Há pessoas que não têm noção daquilo que dizem e fazem… pior para elas. Só é mesmo pena ainda importunarem quem é honesto e bem intencionado.
Carina, por vezes acho que estas atitudes são quase ingénuas. Não sei. Mas como tudo na vida, é uma questão de postura!
Olha uma vez pediram-me para ler um conto infantil. Eu li. A ideia – apesar de verde – era interessante, mas precisava de ser MUITO MUITO trabalhada.
Só na primeira página risquei quase todas as frases e dei sugestões para o autor reescrever… Mesmo que não fosem grande coisa, certamente era melhor do que estava, porque até eu – que sou adulta – fazia questões àquilo. Termos demasiado complexos, uma escrita nada poética, típica em livros infantis. Nada, nada disso.
Sabes o que o autor fez? Refutou cada uma das minhas notas, dizendo que o que eu tinha sugerido é que era vulgar. o.O oi?? -.-' nunca mais! Disse o que tinha a dizer, qe se queria publicar, tinha de dar volta àquilo e sai do processo beta.
Ingratidão e cegueira de ver o que está à frente é algo que me mexe com os nervos. Eu não tenho nada contra a pessoa, mas o conto estava péssimo. O que iria dizer? publica, está óptimo, parabéns? Nah, não sou assim. Além de que coitadinha das crianças, certo? 😛
Enfim, para se submeter a leitores-beta é preciso muita coragem, mas humildade para aceitar criticas e há pessoas que não têm nenhuma.
Ivonne, eu acho que a ansiedade de ver as coisas escritas lidas por outras pessoas levam-nas a uma ansiedade em que se lhes disserem algo que não seja positivo já nem cai bem.
As pessoas podem pensar que escrevi este post baseada num único caso especial ou assim, mas não, isto aconteceu mais do que uma vez e, na minha opinião, a postura e atitude são tudo.
Claro que o escritor não tem de concordar com tudo, mas deve ser razoável e saber avaliar os conselhos que lhe são dados, ou comparar com outros, no caso de haver vários leitores-beta.
Sofia, eu não lhe chamaria bem ingenuidade. Por vezes depende um pouco da maturidade do escritor, que vai evoluindo ao longo dos anos. Mas há limites. Normalmente não faço leituras beta, até porque não tenho muito jeito para opinar a respeito da história em si. Mas no que diz respeito à revisão da ortografia… até tenho calafrios ao ler algumas coisas, e penso "mas será que esta pessoa chegou a rever o texto por ela mesma?!" Uma gaffe ou outra acontece a todos, mas quando se encontram 20 erros por página… nem sequer dá para apreciar a história em si, porque corta o ritmo quase de raiz.
Para além disso, esse tipo de atitude por parte do escritor é uma falta de consideração para com o leitor, a meu ver.
Olá.
Infelizmente há pessoas que não têm a humildade necessário para ver para além do seu próprio ego.
Uma coisa que para mim faz todo o sentido é que conhecimento só gera conhecimento quando é partilhado. Desta forma, quando os escritores nos pedem para ler o manuscrito estão à espera que haja uma partilha da nossa parte, por isso não percebo qual a resistência deles em aceitar as críticas.
Tenho muitas experiências como leitora-beta. Aliás, depois da primeira fiquei completamente viciada nisto, por isso faço-o para muitos escritores e de boa vontade. Até ao momento ainda não tive nenhuma situação desagradável. Quando envio a minha opinião acerca do livro digo sempre que é apenas a minha visão da história e que, por isso, não é melhor nem pior do que qualquer outra.
Não sei como reagiria se me deparasse com uma pessoa "quadrada" em termos de pensamento. Se nos pedem opinião devem estar preparados para o ouvir as melhores e as piores críticas. Têm é de responder com educação e respeitar o nosso trabalho, porque o fazemos com gosto e de livre vontade.
Como dizes não nos faltam coisas para ler e se decidimos investir o nosso tempo a tornar o trabalho de outras pessoas melhores, esperamos pelo menos uma abertura de espírito para aquilo que partilhamos.
Acredita que me senti indignada com esta tua experiência.
Carina, é bem verdade tudo que dizes… Enfim!
Silvana, obrigada pela mensagem. Mais uma vez é claro para mim que tens toda a razão. Só que às vezes penso que as pessoas são cheias de si mesmas e não querem aceitar que talvez não sejam assim tão promissoras, não sei… Eu abro várias vezes disponibilidade aqui no blog para ler beta. Como é óbvio, não conheço as pessoas de quem estou a ler e não faço ideia de como são no dia-a-dia, mas raramente não sou surpreendida, seja pela positiva ou pela negativa!
Estás mesmo zangada!
Mas se um autor dá o texto para leitores-beta lerem, tem de saber depois aceitar essa leitura! 😀
Olinda, não estou zangada, sei que o texto está agressivo, mas nem era essa a real intenção. Gostava apenas de quem se está a aventurar na escrita tivesse consciência e sensibilidade quando é para mostrar o seu trabalho aos outros 🙂
Xiiii publicar um livro é caotico. Os leitores beta merecem um bom agradecimento pelas criticas. Bem, mal, uma merda, desenvolve aqui, exageras ali, palavra repetida, etc., etc…
Só com criticas se pode chegar a um texto ideal. O problema é mesmo a editora. Por isso deixei de escrever com o fim de publicar. Só pelo gozo de o fazer. Bem ou mal 🙂
Eu tenho que dizer que, ainda que compreenda do onde a autora do artigo está a falar, mostra, infelizmente, uma certa falta de desconhecimento do processo que está por trás da escrita de um livro
Não quero com isto dizer que, oh, por exemplo, não há autores que não sejam convencidos, e achem-se tão fixes que não se incomodam a rever e mandam o livro como está. Sim, há mesmo disso, e muitos.
No entanto, é um bocado ingénuo pensar que depois de acabar de escrever um livro, se faz uma revisão completa, se manda para os beta readers e já está.
Para começar, é preciso distinguir DUAS fases muito diferentes da revisão de um livro, duas fases essas que pedem duas pessoas muito diferentes:
1 – Revisão EstruturalBeta Reading.
2 – Revisão de EstiloProof Reading.
Ambas exigem conhecimentos, capacidades e estados mentais muito diferentes, e um bom beta reader que se preze nunca tenta fazer as duas ao mesmo tempo.
A primeira é a chamada revisão à história. Exige atenção ao pacing, personagens, plot, etc. Digamos que é uma visão mais abrangente da história em si.
A segunda foca-se no estilo de escrita e no apanhar de erros gramaticais, lexicais, gralhas, etc. Foca-se muito no detalhe e ignora coisas como mais abrangentes, porque, vejamos, o cérebro humano ou se foca no geral, ou se foca no detalhe.
Fiquei um bocado parva com a noção que a autora do artigo, quando lhe pediram para ignorar os detalhes e focar-se na história ficou muito espantada e até (parece) incomodada porque lhe pediram para ignorar gralhas e erros que tais. Se tivesse parado para pensar um bocado, percebia porque é que os autores com dois dedos de testa não fazem uma revisão total e só depois mandam para os beta readers. Imaginemos então o cenário ideal proposto aqui:
Vocês escreveram um livro sobre vampiros mortalmente alérgicos a bananas, reveram tudo muito bem revisto, tiraram gralhas, erros gramaticais, está perfeito para ir para a editora mal seja aprovado, e mandaram para os beta readers. Imaginem então que, ao chegar ao meio, um dos beta readers descobre um plot hole, em que um dos vampiros vai a uma festa onde conhece a sua amada, festa na qual toda a gente come bananas, adora bananas e atira bananas uns aos outros. O vampiro cairia morto para o lado, certo?
Ou seja, o autor agora tem que reescrever uma ou mais partes do livro para resolver o plot hole, tem que inventar cenas onde esse vampiro desenvolve resistência às bananas, ou onde explica porque é que ele é diferente dos outros vampiros, ou até inventar um novo local onde ele e a amada se conhecem. Secções inteiras arriscam-se a serem cortadas (conheço uma professora de escritaescritora publicada que uma vez, cortou 40.000 palavras de um livro durante a revisão. 40.000!) ou reescritas. E depois de reescrever estas secções todas, o autor tem que ir fazer copywritting de tudo que fez de novo. Portanto, faz mais sentido afinar a história e mandar aos Beta Readers para rever e só se preocupar em ir atrás das gralhas e do estilo linguístico quando a história estiver a 100%.
Por isto quero dizer que fazer a revisão "como se fosse para a editora" e só aí mandar para os beta readers arrisca-se a ser uma perda de tempo e esforço tremenda. Pedir a alguém para se focar na história e ignorar erros é um pedido não só perfeitamente válido como perfeitamente LÓGICO. Aborrecer-se com os autores só porque eles pedem para concentrar-se numa coisa (ie, a história) mostra realmente falta de experiência de como decorre o processo de escrita (e revisão) de um livro.
No futuro, sugiro à autora do artigo que preste mais atenção aos pedidos que os escritores lhe fazem, e tente perceber porque lhe pedem o que pedem (e se continuar sem perceber, perguntar-lhes directamente), em vez de tirar conclusões precipitadas e acabar por parecer um bocado ingénua. De certo que haverá pessoas que realmente acham que conseguem singrar sem terem uma obra revista devidamente, mas também há a séria possibilidade que estes escritores sabem exactamente o que lhe estão a pedir.
Ah, tenho que pedir desculpa por uma calinada terrível — o termo não é copywriter. É sim "proofreader". Lamento o erro, é o que dá escrever textos à 1 da manhã.
Ocorreu-me também que há sempre a possibilidade que a autora do artigo simplesmente não consiga concentrar-se na história se esta tiver escrita com muitas gralhas. Nesse caso sugiro que diga imediatamente ao escritor que não serve para beta reader, mas sim que funciona melhor como revisoraproofreader.
Olá Ana,
Obrigada pelo comentário.
Penso que decidiste focar-te numa parte do texto e não no todo ou então realmente eu não consegui passar a mensagem que queria.
Não me lembro de alguma vez ter dito que para um leitor beta o livro devia ir revisto como se fosse para uma editora, mas lembro-me de que o que me choca muitas vezes é a atitude do autor em si. Ter erros é normal, por vezes nem os revisores das editoras os apanham todos, mas a atitude do autor quando recebe a observação de que tem erros e de que essa atrapalha a leitura (ora vejamos, por muito boa vontade que haja em ler apenas a história geral em si, se encontras erros linha sim, linha não, bem, talvez devesse ter havido algum cuidado, ou não?).
"Ambas exigem conhecimentos, capacidades e estados mentais muito diferentes, e um bom beta reader que se preze nunca tenta fazer as duas ao mesmo tempo."
"No futuro, sugiro à autora do artigo que preste mais atenção aos pedidos que os escritores lhe fazem, e tente perceber porque lhe pedem o que pedem (e se continuar sem perceber, perguntar-lhes directamente), em vez de tirar conclusões precipitadas e acabar por parecer um bocado ingénua."
Se há coisa que a autora do artigo faz é perguntar directamente o que é que o autor quer. E isso qualquer um poderia comprovar se eu revelasse os seus nomes. Volto a dizer, o problema não está no que o autor pede, mas na forma como reage ao que ouve sobre o que pediu.
Acredita, existe uma séria possibilidade de os autores não saberem o que estão a pedir e depois não saberem reagir ao resultado do que pediram. É a postura em si que é o problema.
E claro, vou ignorar o tom hostil com que o comentário foi feito sem qualquer tipo de necessidade.
Bom, devo desde já clarificar que não tive qualquer intenção de soar hostil. Não tenho motivo para tal (não a conheço, e nunca usei os teus serviços de beta reader, por isso não tenho más recordações ou algo que me fizesse reagir de forma menos que educada). E não tenho qualquer gosto em ir ser hostil no blogue de outras pessoas só porque sim.
A única razão que posso atribuir ao suposto tom é que poderá ser difícil para outros aperceberem-se de entoação e expressão no meio escrito, e o que devia ser crítica construtiva pode ser muito facilmente interpretada como hostilidade. Por isso agradeço teres ignorado o tom hostil visto que na realidade não estava lá. Eu própria não teria referido o tom novamente não fosse para clarificar — não vão as pessoas mesmo interpretar o tom como hostil depois de te teres referido a ele.
No entanto, tenho a certeza que não és daquelas bloggers estupidamente sensíveis que acham que qualquer pessoa que discorde com elas automaticamente está a ser hostil, razão pela qual quis clarificar o assunto. Com essas pessoas, infelizmente, não vale sequer tentar falar. Por isso quis clarificar a situação foi porque não valia a pena ficarmos com impressões erradas uma da outra, sobretudo quando estivermos a debater um assunto tão interessante.
Voltando aos pontos que abordaste:
"mas a atitude do autor quando recebe a observação de que tem erros e de que essa atrapalha a leitura (ora vejamos, por muito boa vontade que haja em ler apenas a história geral em si, se encontras erros linha sim, linha não, bem, talvez devesse ter havido algum cuidado, ou não?)"
Estou a ver que o que assumi estava correcto – não te é fácil ler livros com erros. Nada de mal com isso, significa que, muito provavelmente, tens olho para o detalhe. Mas acho injusto (e ingénuo) atribuir "atitude" ao que é lógica. Como dizia um escritor "escrever é rever". Nenhum livro fica bem escrito só com uma revisão (acho que o Ken Follet precisa de rever 12 vezes, mas não tenho a certeza). Logo, se um autor pede "Por favor ignora os erros ortográficos" é mais provavelmente porque ele tenciona focar-se na história na primeira revisão e nos erros na seguinte, e não por má atitude.
"Volto a dizer, o problema não está no que o autor pede, mas na forma como reage ao que ouve sobre o que pediu."
Se um autor realmente pede opinião e depois não gosta do que ouve é uma coisa, e realmente tenho pena se tiveste que aturar desaforos se eles não gostaram. Mas nesse caso o que sugiro é ignorar. Não vale a pena perder tempo ou paciência com pessoas super-sensíveis que levam a mal qualquer crítica que se faça.
Note-se que o autor DEVE informar com antecedência o que quer — "foca-te na história não na ortografia" por exemplo. Claro que há pessoas (como tu mesma indicaste ser) que não consegue concentrar-se na história se tiver muitos erros. É perfeitamente aceitável, da mesma forma que há muita gente que consegue desligar completamente o "auto-corrector interno" e focar-se apenas na históriaplotpersonagens mas podem não conseguir distinguir uma virgula de um ponto e virgula. Por isso sugiro que não leves tão a sério essa atitude: se eles foram parvos, quem perde é eles; se eles sabem o que querem, da próxima que peçam diretamente.
Olá Ana,
Mais uma vez obrigada pelo comentários e esclarecimentos. Confesso que, realmente, achei que tivesses sido um pouco hostil embora não por teres discordado de mim, isso eu respeito porque também eu discordo de outros, mas pela forma como abordaste o assunto. Mas estou completamente esclarecida e ainda bem que nisso estamos em sintonia 🙂
Sabes uma coisa? Eu acho que a maioria dos estreantes no mundo literário enquanto autores, não têm noção das fases pela qual um manuscrito pode/deve passar. Desde ter conhecimento de que tipo de leitores pedir (seguindo o exemplo que deste no primeiro comentário) a depois como lidar com os feedbacks que recebem.
Normalmente considero que até tenho uma grande capacidade de abstração no que toca aos erros. Aliás, já comecei leituras em que era suposto analisar as duas coisas ao mesmo tempo e em que acabei por fazer duas leituras ao dito manuscrito porque se ia andar com atenção aos erros a história ia-me, certamente, parecer miserável.
O problema está quando há trocas de palavras constantes, falta de palavras, aqueles desalinhamentos em género e número.. Por muito que te tentes abstrair, isso por vezes quebra a leitura, principalmente se forem muito recorrentes. Não sei se aí existe abstração que valha.
Sendo assim, concordo quando dizes que o autor pode pedir uma leitura em que o foco é a história, mas também reforço a ideia de que se deve ter um mínimo cuidado quando se entrega um manuscrito. Será que à medida que o autor vai escrevendo, quando acaba, não pode reler o que escreveu para tentar apanhar o grosso das possíveis gralhas?
Eu não sou escritora, posso afirmar com tremendo grau de certeza que nunca vou ser, mas quando me tento colocar no lugar de alguém que está a escrever pela primeira vez, por mais que a urgência de mostrar ao mundo nos faça querer enviar para tudo e todos o manuscrito, fico sempre com a sensação que ia querer enviá-lo no melhor estado possível.
Mas pronto, lá está, não sou autora nem escritora, sou leitora. Talvez não sirva mesmo para leitora-beta e a boa vontade e o querer ajudar não sejam suficientes para dar palpites, mas é isto que eu sinto.
Resumindo, talvez haja mesmo uma certa falha de comunicação nestes pedidos. Por vezes os autores nem sabem bem o que querem e os leitores ficam indecisos sobre o que se focar.
Penso que ninguém cobra para ser leitor beta, eu sei que nunca cobrei, mesmo já tendo feito revisões e tudo mais, e daí a minha indignação para certas atitudes. Querer tudo de um leitor beta irá requerer mais do que uma leitura ao manuscrito e, algumas vezes, quando o feedback é negativo, as respostas são… ingratas? Para não dizer coisas mais feias!
Bem, obrigada mais uma vez. O teu contributo neste tópico foi/é importante porque também alerta para outros tópicos que não explorei no post e que são importantes.
Como escritora, nunca envio textos a ninguém sem os ter lido duas a três vezes, pelo menos. Talvez seja demasiado perfeccionista, mas não gosto de enviar textos com resmas de erros ortográficos porque isso revela falta de atenção, falta do domínio da língua e, a meu ver, falta de "amor" ao que se está a fazer. Claro que nem todos pensam assim, mas, para mim, o escritor deve preocupar-se tanto plot e a estrutura como com a ortografia. Fazem parte de um todo, e é esse todo que revela o valor da obra e do escritor.
Aqui está uma linha de pensamento que para mim faz todo o sentido.
Concordo inteiramente com a Carina, e estou convicta, como escritora, de que há um mínimo de exigência que devemos ter quanto à escrita, antes de submetermos o nosso texto ao olhar de alguém, mesmo de um beta reader.
Posto isto, é evidente que nenhum manuscrito está isento de erros e gralhas, há é erros mais e menos graves, mais ou menos frequentes, sendo que, se forem excessivamente frequentes e graves, podem mesmo impedir a boa leitura da história. Nesse caso, acho perfeitamente natural que o beta reader chame a atenção ao autor, para que este saiba que esse aspecto está a prejudicar a leitura e precisa de muito trabalho.
A questão das fases de escrita não é linear para todos os autores, não é forçoso que a composição e apuramento da história anteceda a preocupação com uma escrita minimamente aceitável – acho que são complementares. Há, claro, uma segunda fase, que podem ser duas ou três ou vinte, em que se vai revendo e ajustando, e também nesse caso depende do autor, porque nestas revisões também se pode contemplar alguma pequena alteração de plot.
Ainda assim, sendo o autor livre de escrever o que quiser, como quiser, a questão está mesmo na reacção. O leitor beta lê com toda a boa vontade, é preciso ouvir a opinião com uma cabeça limpa e alguma humildade (de que tanta gente carece), mesmo que não agrade ou não concordemos, olhar para o texto através dos olhos de quem o leu, e pensar se terá ou não razão, se o que diz / sugere pode ou não contribuir para melhorar o NOSSO texto, ou vai acabar por levá-lo por algum caminho que não era o pretendido, e o melhor é persistir com a ideia inicial.
Tudo isto, mas antes de mais ouvir, agradecer e não menosprezar a opinião que nós próprios pedimos.