[Opinião Blog Morrighan] Canções Mortas, um disco onde o choro se dá de sorriso nos lábios, de Coelho Radioactivo

Pensei em mil maneiras de começar esta opinião, mas depois li este excerto da Murmúrio Booking e achei que não valia a pena reinventar a roda. Uma introdução que é ao mesmo tempo um resumo: 

“O Coelho Radioactivo faz suas, as suas canções. Espera que a inspiração venha e depois pede-lhe para ficar um bocadinho… porque saber-se exactamente o que se quer, nem sempre é uma qualidade. As suas canções, as que não podiam ser de mais ninguém, são canções feitas de noite, para terem o peso dos dias. E gravadas de manhã, para terem a frescura da noite.” Murmúrio Booking

Mas há muito mais para dizer deste Canções Mortas, o seu mais recente disco. Confesso, ainda não ouvi trabalhos anteriores. Gostei tanto deste que a premissa dada na divulgação – que este era um disco diferente – fez com que quisesse apenas mergulhar neste universo primeiro, entranhar-me nele e quem sabe mais tarde viajarei por outros mundos de Coelho Radioactivo. O que é certo é que a um primeiro contacto houve logo empatia. 

Tenho este gosto, por vezes viciante, de músicas mais melancólicas, que no seu tom calmo expelem a raiva, a fúria, o lado negro que todos temos. Existe aquele estado de humor, que muitas vezes a vida assim nos remete para, em que só este tipo de canções o mitiga, independentemente de serem agradáveis de se ouvirem a qualquer hora. Talvez por passar, também eu, uma fase mais negra da minha vida, este disco chegou num timing perfeito, em tom de embalo e de suspiro. 

Começamos com Uma Nova Jerusalém I, talvez a mais calma das canções. Um relance apenas do que está para vir, com uma estrofe de três versos e uma acústica que oscila entre o passivo e o urgente. Até que começam as teclas e estamos em Pistola, o início, talvez, da obscuridade teatral de cada letra. É aqui que a estética e a imagética se começam a projectar de forma palpável.

Sangue foi o single de antecipação e talvez tenha sido esse mesmo tema que me chocou pela positiva. A pergunta que surgiu na minha cabeça foi logo: como é que com melodias tão bonitas e harmoniosas se transmitem imagens tão sombrias, tétricas até. E é nesta simplicidade tenebrosa que viajamos e crescemos em intensidade pelo restante disco. 

Existe beleza no negrume da noite, tal como existe em tudo o que tem um fundo de felicidade, mesmo que distorcido pelo tempo ou pela memória. Braços, a quarta música, é um novo confronto entre a severidade e o afecto. Esses ecos, continuam por De Vez, em que a lírica fantástica remete-nos para paixões sufocantes, contrastando com os clássicos de finais felizes. 

É em tom calmo, que a violência de Deito se faz chegar rapidamente. Não uma violência agressiva, mas antes daquela que sentimos por dentro, a corroer lentamente. É como assistir por uma janela, observando através de sons vibrantes, guitarras irrequietas e uma bateria que marca o ritmo de passos invisíveis. Chega Cavalo para nos mostrar o que tantas vezes nos atormenta “mas eu só te queria ter dito // o que não disse e nunca mais falar contigo”. 

O interlúdio chega pouco antes do fim do disco, com Uma Nova Jerusalém II que dá a liberdade ao ouvinte de fazer as suas próprias projecções. A composição sonora deste instrumental está muito bem feita, a cada momento parece que nos suspendemos à espera da voz que não chega, enfatizando a sensação de vazio que tão bem caracteriza a temática. 

O Juízo precede a última canção, Já Vai Embora. Não gostei tanto dessa música, confesso, mas a última volta a compensar. É uma espécie de adeus, em tom de até já. Para o que é bom e para o que é mau, tudo acaba, mas também existe sempre um amanhã, um novo nascer do sol, traga ele o mesmo peso de ontem ou uma nova perspectiva. 

Na minha opinião, é essencialmente disto que se trata Canções Mortas – de um conjunto de histórias mais ou menos tenebrosas, mas que habitam em cada um de nós. É um Folklore límpido, em que o tom noir e as melodias mais tristes e, claramente, experimentais, lhe conferem uma perspectiva única e diferente dos demais. É um disco algo lúgubre, em que muitas vezes fazemos o luto de nós mesmos e dos que nos rodeia, mediante quem encaixa em cada papel. Acho que, acima de tudo, é um disco de louvar, pela coragem em ser diferente e de não ter problemas em assumir essa diferença. 

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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