Opinião: Como é Linda a Puta da Vida, de Miguel Esteves Cardoso

Como é Linda a Puta da Vida

Miguel Esteves Cardoso

Editora: Porto Editora

Sinopse: «O que espanta num gato é a maneira como combina a neurose, a desconfiança e o medo – para não falar numa ausência total de sentido de humor – com o talento para procurar e apreciar o conforto e, sobretudo, a capacidade para dormir 20 em cada 24 horas, sem a ajuda de benzodiazepinas.

O gato é neurótico mas brinca. (…) Mas, acima de tudo, descobriu o sistema binário da existência.

Que é: dormir faz fome. Comer faz sono. Acordo porque tenho fome.

Adormeço porque comi. Nos intervalos, faço as necessidades.»

Opinião: Adquiri este livro em Abril de 2014 e pouco depois comecei a lê-lo. Não como se lê um romance, pois trata-se de um livro de crónicas, mas antes como uma espécie de diário nocturno. Nas noites em que era possível, lia uma das crónicas e muitas vezes desligava a luz a pensar sobre as mesmas. Mas tal como em tudo na vida, não nos podemos forçar a ler por ler, andei uns meses em que mal tinha tempo para ler e, quando tinha, só me apetecia enveredar por narrativas mais complexas que me tirasse “deste mundo”. Ficou mais ou menos a meio e voltei a pegar nele no início deste novo ano de 2015. Mais uma vez confirma-se, não somos nós que escolhemos as leituras, mas as leituras é que nos escolhem a nós, parece que adivinham o timing em que se devem colocar à nossa frente! O que é certo é que devo ter pegado no livro mesmo na altura certa porque rapidamente o terminei. 

Esta colectânea do escritor Miguel Esteves Cardoso, também conhecido como MEC, contém crónicas de vários anos, ao longo da última década, e também abrange vários temas. O primeiro, o que mais me emocionou, está relacionado, e friso, com a sua mulher. Quem já leu este livro perceberá o porquê do negrito, tem a sua piada, mas o que já não foi assim tão engraçado foi assistir aos momentos de luta enquanto Maria João esteve no IPO. Doença do século, dizem muitos, mas o que importa aqui é a mensagem de esperança, entre altos e baixos, e um carinho e devoção enormes que transparecem do autor para o leitor e para a própria Maria João. 

Os restantes temas têm sempre a sua pertinência. Algumas crónicas estão mais interessantes do que outras, muitas vezes não nos conseguimos situar bem nas ideias do escritor, mas uma coisa é inegável – MEC tem uma personalidade tão vincada que, quer se goste, quer não, ninguém pode duvidar da sua genuinidade e poder de expressão. Não tem papas na língua, gosta de pegar nos touros pelos cornos e sabe bem como abordar temas mais sensíveis de forma directa e perspicaz, sem ser grosseiro. Nunca li nenhum romance do autor, foi a minha estreia na sua escrita, mas a sua aparente sinceridade e frontalidade fez-me perguntar como será o seu estilo num outro registo. Pode ser que 2015 traga mais MEC ao Morrighan. 

Deixo-vos um excerto que também deixou a sua marca:

É pena. As pessoas dizem que o tempo cura tudo mas não sabem dizer como. Ou não podem. Porque a ideia delas, mais automática do que mal pensada, é que o tempo cura através do esquecimento. (…) 

Porque o esquecimento é contrário ao amor: é um atentado contra ele. (…)

É a tal “questão do tempo”. Parece sábia mas é estúpida. Tão estúpida como dar importância ao espaço físico e aconselhar, para um luto ou desgosto de amor, pôr-se a milhas do lugar onde aconteceu. (…)

A verdade é que não há nada que se possa dizer. Mas não se pode dizer que o tempo fará esquecer. Ou que o esquecimento fará com que deixe de doer tanto. (…)

– Miguel Esteves Cardoso, O tempo que nos aproxima

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3 Comentários
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Anónimo
Anónimo
9 anos atrás

Esse excerto sem dúvida que me deixou curiosa.
Parabén pelo blog, adoro o visual 🙂
CriArte a Ler

Morrighan
Morrighan
9 anos atrás

Olá, CriArte a Ler! :))
Muito obrigada, também já dei uma espreitadela no teu. Vou meter na lista para seguir 🙂

Beijinho!

Anónimo
Anónimo
9 anos atrás

Muito obrigada Morrighan 🙂
És muito bem vinda 🙂

  • Sobre

    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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