Entrevista aos The Gift – 20 Anos de Carreira – Banda Portuguesa

Foi em 1994, tinha eu seis aninhos, que os The Gift, banda de Alcobaça, deram o seu primeiro concerto. Mais de vinte anos passaram desde então e recentemente foi lançada uma edição comemorativa dessas duas décadas, razão mais do que suficiente para uma entrevista com aquela que foi uma das primeiras bandas portuguesas que descobri. Ainda me lembro de quando ia visitar os meus familiares ao norte e o meu primo mais velho, sempre tão aficionado pelos The Gift, colocava um dos discos a tocar antes de adormecermos. A verdade é que a curiosidade ficou e não é todos os dias que vemos bandas com tanta longevidade, consistência e perspectivas de haver mais do que espaço para continuarem a inovar. Todos os trabalhos da banda têm comprovado essa diversidade, e John Gonçalves aceitou então responder a algumas perguntas sobre o percurso que tem sido feito pelos The Gift e também sobre a indústria e a nova música portuguesa. Da minha parte, o meu muito obrigada! Fiquem então com a conversa. 

20 anos é, literalmente, uma vida. Ainda se lembram de como é que dos Dead Souls, do Nuno e do Miguel, se tornaram os The Gift com a Sónia e o Ricardo? Algum momento ou circunstância especial que queiras registar?

A passagem de Dead Souls com o Nuno e o Miguel para The Gift com a Sónia, o Ricardo Braga e mais tarde comigo faz se no verão de 1994 e tinha como objectivo artístico fazer algo usando alguma tecnologia – teclados e caixas de ritmos – com alguns instrumentos clássicos – flauta que a Sónia tocava e bombardino que o Braga tocava – e melodias elegantes. Este foi o inicio da banda e o propósito maior desde projecto era entrar no importante concurso de música moderna do Bar Ben por onde passaram grandes nomes da música portuguesa alternativa nos inícios dos anos 90.

É raro, e notável, um projecto musical, seja em que país for, chegar a esta marca dos 20 anos. Imagino que vindos de Alcobaça, fora dos considerados núcleos centrais portugueses – Lisboa e Porto –, o início não tenha sido fácil. Ainda por cima ainda não se usavam muito todos os meios virtuais que se usam agora para facilitar a propagação. Como é que recorda esses tempos em que tentavam furar o mercado musical português?

Recordamos esses tempos com alguma saudade mas também com a certeza de que fizemos algo bem. Nessa altura, como hoje, nós tratávamos de tudo o que era artístico e de management e era comum marcarmos os concertos – como hoje – tratar da promoção – hoje com assessora de imprensa – e tomarmos conta de tudo o que tinha a ver com a produção do concerto, som, luz, slides e projecções que já tentávamos usar nessa altura. Na verdade hoje profissionalizámos essas áreas com pessoas que connosco trabalham mas dominamos por experiência própria todas as áreas duma banda desde a edição, promoção, fotos, videoclips, tudo o que tem a ver com concertos, etc… Imagina um curso intensivo de “como ter uma banda profissional em 20 anos” é o que diariamente ainda vivemos.

E ao longo dos últimos 20 anos muita coisa mudou, mas o mercado independente, apesar de ser cada vez maior, parece continuar a ser um pouco desprezado. Tendo começado dessa maneira, quais as maiores diferenças que sentem desde então até agora e o que pensam que poderá ser melhorado?

O mercado independente é pequeno hoje como era pequeno há 20 anos atrás. Há bandas que pela estética que praticam não conseguem nunca aumentar esse público e há outras que partindo da matriz indie / alternativa conseguem chegar a mais pessoas. Isso não é algo exclusivo de Portugal, mas de todo o mundo. A diferença é que lá fora existe público, salas e industria que podem alimentar uma banda alternativa de forma profissional e no nosso país esse objectivo é muito complicado ainda nos dias de hoje. Eu como sou muito otimista, acho que hoje há veículos de promoção mais fortes, mais organizados, há mais salas para tocar, há muitos palcos de festivais, de queimas das fitas, de teatros e de auditórios que bem trabalhados podem garantir a subsistência de muitas bandas. Nesse sentido a maior diferença é que há 20 anos existia tudo isto mas em muito menor número e espero que nos próximos 10 anos Portugal possa ver crescer – como já acontece – excelentes bandas que possam ter carreira aqui e internacional.

Falando em carreira, antes deste último “20” lançaram sete discos passando por registos muito diferentes uns dos outros. Uma coisa é certa, a estética aliada à sonoridade tornou-se uma imagem de marca dos The Gift. Consideram que esse aspecto em particular vos ajudou a destacarem-se dos demais projectos musicais? 

A nossa estética musical é aberta e, como dizes e bem, isso nota-se quando se ouvem os vários discos dos The Gift. Obviamente que quem ouve apenas os singles terá como referência a voz muito personalizada da Sónia e as melodias sofisticadas de alguns instrumentais. 

Eu prefiro valorizar e destacar as diferenças entre várias correntes artísticas que os The Gift foram abraçando ao longo dos anos e quero acreditar que são essas características que determinam a longevidade da banda.

Nem sempre a banda tocou para o mesmo público e para nós isso é positivo, mas prefiro sempre ter alguém novo que descobre os discos na sua plenitude mesmo que não os descubra nos momentos em que são lançados.

As novas tecnologias permitem a uma pessoa de 18 anos ver um concerto nosso por acaso num festival ou numa praça e chegando a casa ouvir toda a nossa discografia.

Ao longo dessa discografia vocês já responderam a várias entrevistas que fui acompanhando, mas penso que nunca satisfiz uma curiosidade minha. Houve algum motivo em especial para de um álbum colorido como Explode, passarem para uma simplicidade sublime, a preto e branco, com Primavera? 

O álbum Explode sai em Março de 2011 e o Primavera sai em Janeiro de 2012. Se um era muito colorido, com uma estética sonora especial e gravado ao longo de vários meses o Primavera foram 2 semanas de gravações muito específicas no CCB, aproveitando o facto da Sónia estar grávida. 

Acho que gravarmos esse momento da gravidez da Sónia foi talvez a razão fundamental da existência do Primavera naquele timing e a forma íntima  como as gravações decorreram, com aquelas composições, com aquelas melodias e aquelas letras determinaram depois o preto e branco no design e conceito gráfico do projecto que foi para a estrada em duas partes muito distintas e tecnicamente muito desafiantes para nós e muito desgastante para a Sónia que estava grávida de 6/7 meses numa longa digressão ibérica de 22 datas.

Imagino que com tantos anos de estrada tenham vários episódios marcantes nas vossas memórias. Algum que possa deixar aqui? Seja entre vós ou com os vossos fãs?

Há sempre vários episódios quando se tem mais de 20 anos de carreira. No entanto eu prefiro sempre valorizar os episódios em contacto com o público e há um caso famoso em 1999 na nossa primeira “Aula Magna” quando de forma espontânea o público invadiu o palco fazendo um final apoteótico nessa sala já mítica da música portuguesa e que está num dos DVDs que acompanham a nossa caixa com o livro dos 20 anos do Nuno Galopim – esse sim com vários episódios privados e públicos da nossa vida – e com 4 CDs.

De volta ao presente, com este disco dos 20 anos saíram três canções inéditas em disco. Foram criadas já a pensar num disco inteiro de originais?

O disco de originais é um projecto que está a ser ultimado e terá uma estética, um conceito e uma ideia artística muito própria. 

As três canções que fazem parte do álbum 20 são casos distintos. O “Clássico” é uma canção em português e que marca na sua essência toda a carreira da banda enquanto o “Doctor” era uma canção que já apresentávamos ao vivo há 2/3 anos e o “Sehnsucht” é uma recriação de um tema original do álbum Primavera.

A chamada “20 Tour” passará no dia 12 de Agosto pelos palcos do Sol da Caparica num momento de celebração em que a banda já prepara, também, o lançamento de um novo trabalho produzido por Brian Eno. Querem adiantar um pouco sobre que tipo de concerto podemos esperar no Sol da Caparica e para quando o lançamento desse novo trabalho? Fará parte do repertório uma ou outra música nova?

O festival Sol da Caparica é um dos momentos altos da nossa digressão de verão, onde apresentaremos uma cenografia nova, e será um prazer fazer parte de um festival já incontornável do panorama musical nacional com o melhor que se faz na música portuguesa nos dias de hoje. O nosso concerto será focado nos grandes temas dos The Gift, nos singles mais conhecidos e o que nós denominamos de “lados B” dos nossos discos que são canções que trazemos para os concertos porque fazem sentido para nós, mesmo que não sejam os temas mais conhecidos da nossa carreira

Os temas do novo disco serão primeiros apresentados a todo público e só depois serão apresentados em concerto, mas ainda não há data para esse lançamento.

Por falar em concertos, recentemente estive numa feira internacional de música profissional e ao falar da exportação de música portuguesa recebi vários feedbacks diferentes. Um deles é que uma banda portuguesa a cantar em inglês no Brasil nunca terá sucesso. Vocês já estiveram lá, sentiram essa barreira? 

Eu vivo no Rio de Janeiro há 4 anos e conheço muito bem a realidade brasileira como consumidor de música lá e como músico que tocou em vários locais do Brasil como Rio de Janeiro, São Paulo, várias cidades do interior de São Paulo, Recife, Natal, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba.

De todas as digressões que temos feito no Brasil, a língua nunca foi um problema porque nos posicionamos perante públicos que não valorizam apenas a língua. Se esse público vê bandas estrangeiras cantar em inglês não me parece que terá grande problema em assistir a um concerto dos The Gift ou outra banda portuguesa a cantar em inglês mas o contrario será também natural.

Consideram que, por outro lado, ao cantarem em inglês a vossa exportação foi mais fácil? 

Não, não acho e a internacionalização de projectos a cantar em português também tem vários exemplos de grande sucesso. No caso dos The Gift a nossa internacionalização foi feita com objectivos muito concretos para Espanha pela proximidade, Brasil por oportunidades que surgiram ao longo dos anos e EUA / Canadá, apesar de termos tocado em quase toda a Europa e até na Austrália ou Ásia.

Sem editora internacional, sem agente internacional e sem management estrangeiros continuamos a trilhar o nosso caminho internacional de forma muito calma, tranquila e aproveitando as oportunidades que vão surgindo.

Para as bandas que agora começam, de forma independente, que conselhos lhes podem dar? Tanto a nível de arranque como de tentativa de fazerem valer a sua música junto dos media principais? 

Há dois conselhos que dou sempre e os dois não se misturam.

Por um lado tentar artisticamente ser o mais honesto possível com o que a banda ou o artista mais gostam. Não ceder a pressões de qualquer nível e aproveitar o talento nos ensaios, nos concertos e no estúdio para crescer.

Depois de serem honestos no trabalho artístico há além da música os vídeos, as fotos, o design do disco que é muito importante encararem ou terem alguém que encare o negócio com o maior profissionalismo possível.

Definir objectivos periódicos possíveis de atingir, trabalhar a promoção dos discos e concertos, manter bons contactos com promotores, teatros, salas, rádios, media, blogs, tentar usar bem as redes sociais e estar preparado para ser persistente e paciente.

Se existir talento, persistência, paciência juntamente com boas estratégias – dirigidas pela banda ou por uma equipa – pode haver esperança numa carreira.

https://www.facebook.com/The.Gift.Official/

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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