Do Medo à Esperança
Raquel Varela e António Coimbra de Matos
Editora: Bertrand Editora
Sinopse: Um encontro inesperado: uma historiadora social, do trabalho, dos movimentos sociais, da revolução Portuguesa, e o pai da psicanálise em Portugal, o psiquiatra António Coimbra de Matos, escrevem a 4 mãos um livro sobre o medo, ou, melhor dizendo, sobre como vencer o medo, social e individual.
Como reconstruir uma sociedade participativa sem que o coletivo esmague o individuo, como ser livre sem ser individualista. Do nosso bairro à história do país, das nossas relações afetivas ao que queremos para o futuro.
Um livro que se lê sem parar, como uma longa conversa entre dois espíritos inconformados, dois sonhadores realistas que acreditam no futuro de Portugal.
Opinião: Ora aqui está um livro que à primeira não me chamou muito à atenção, mas que depois, ao cruzar-me com algumas passagens, me suscitou uma curiosidade imensa. Está inserido na secção de “Ensaios e Documentos” da Bertrand Editora e no fundo é uma conversa, dividida por uma série de partes, entre a historiadora Raquel Varela e o psicanalista António Coimbra de Matos. Os assuntos que exploram são vastos, embora com algumas repetições, mas o que mais me fascinou foi que, apesar de ambos partilharem um pragmatismo delicioso, se notou claramente que ambos têm formações e acções diferentes nas suas vidas sociais/laborais. De alguma maneira penso que quando iniciei a leitura, esperei que a conversa convergisse para um mesmo tom ou alguma homogeneidade de discurso, mas não foi o que se verificou. E isso é bom. Porque a cada parágrafo do diálogo notamos bem a personalidade e convicções de cada.
Do Medo à Esperança é então o resultado da troca de visões sobre vários factores que influenciam o comportamento individual e colectivo na sociedade portuguesa, com uma forte presença crítica a políticas instauradas ao longo do tempo. Existe uma forte constatação e discussão na forma como o ser humano parece isolar-se cada vez mais, centrar-se no seu próprio eu, ignorando que é na cooperação e não na competição individualista que se conseguem criar e florir novas relações e matéria. É feita uma pergunta, com alguma frequência, de como é que uma pessoa pode ser feliz estando só? Existe espaço para se falar de tudo um pouco: medo, solidão, amor, família, o tão aclamado estado social e política interna. Penso, acima de tudo, que existem umas quantas passagens que resumem facilmente o core da obra: «A revolução é o remédio para a violência, a cooperação, o tratamento da depressão.» «Vivemos para nos realizarmos e não para sofrer. Temos direito ao prazer e não o dever de suportar a dor. O entusiasmo é o melhor sinal de saúde mental; e o desânimo, o de depressão. O conformismo é para os masoquistas.»
Não quero falar muito mais sobre o livro, mas acho que para os interessados no comportamento e motivação humanas, num pouco de história sobre a evolução desse mesmo comportamento e algumas direcções que poderemos estar a seguir, Do Medo à Esperança é, sem dúvida, um título interessante. Não esperem uma conversa completamente fluída e estruturada. Volta e meia são dados alguns saltos e nem sempre os diálogos são equilibrados no que toca à proporção de contribuição para a conversa. Ainda assim, é interessante o suficiente para nos prender com bastante força do início ao fim e fazer-nos sublinhar umas quantas passagens que vamos querer reler outras tantas vezes.