Dizem que li 45 livros. 16 de autores portugueses. Dizem que li pouco. Sinto que li pouco. Ainda assim, do que li, houve livros que ficaram de tal maneira marcados no meu ser que este ano vou optar por fazer um destaque um pouco diferente. Não vou enumerar, só porque sim, os livros. Vou voltar a falar de alguns, se calhar repetindo (não sei, não vou ver) o que já disse nos posts de opiniões. O Goodreads tem esta coisa muito fixe – https://www.goodreads.com/user/year_in_books/2016/3547706 – que nos permite lembrar de forma muito bonita o que lemos ao longo do ano. E eu não podia ter começado 2016 de melhor maneira, ao contrário do que está a acontecer este ano (não sei que raio esperar do livro que comecei), pois comecei com Afonso Cruz. E ao todo li seis livros seus. Coisa pouca, certo? E o primeiro grande destaque vai precisamente para o Afonso, não fazia sentido de outra maneira. Não tanto para as Enciclopédias, que gosto de ler, mas mais por divertimento do que por preenchimento da alma. São os seus romances que realmente acabam por me marcar bastante e Flores e Nem Todas as Baleias Voam, tão diferentes um do outro, mas ao mesmo tempo tão intrinsecamente ligados, desempenharam perfeitamente o seu papel. Adorei também Vamos Comprar Um Poeta. Pequeno e incisivo. Ainda não escrevi sobre ele. Se calhar ainda paro o que ando a ler para o reler e escrever a opinião 🙂
O segundo grande destaque, indo mais ou menos por ordem cronológica, vai para Uma Rapariga É Uma Coisa Inacabada. Raios partam o raio do livro. Difícil de ler, muito difícil. Não só pela história que é, mas principalmente porque o estilo narrativo, nas primeiras páginas, dá connosco em doidos. Mas depois entramos naquele universo, percebemos a fragmentação, começamos a sentir a perdição. Há livros assim, que nos acertam em cheio, viscerais.
Eu em Paris, no dia em que ele morreu, há um ano atrás. Entro na Shakespeare and Company, olho para uma prateleira mais alta (ter 1,80m tem as suas vantagens). Vejo-o lá, sozinho. Pego nele, leio parte do que posso. Trago-o comigo. Devoro-o ainda antes de entrar no vôo de volta a Lisboa. Que mais dizer? É um livro que fala da morte de uma mãe, pelos sentidos do marido e dos filhos, pelo corvo. Foi editado meses mais tarde pela Elsinore – O Luto É A Coisa Com Penas. Aconselho, muito mesmo.
Uns meses mais tarde. Londres. Tate Modern Gallery. Acho que 2016 fica marcado pelas várias viagens que fiz pelo doutoramento. Um doutoramento que tem sido marcado por uma série de acontecimentos incontroláveis e que tanto o têm perturbado. Mas ao menos têm acontecido coisas boas também. Esta viagem a Londres foi qualquer coisa de muito especial e de lá trouxe quatro livros. Este é um deles. Que aborda uma série de questões em relação à mulher, ao seu papel nas relações com os homens, seja em âmbito passional ou profissional. Não é um leitura fácil ou directa, corrida, mas tem muito que se lhe diga e embora tenha sido publicado inicialmente ainda nos anos 90, é considerada uma obra fundamental nos dias de hoje.
O regresso de Nuno Nepomuceno foi estrondoso. Haja autor português que de repente tenha dado um salto de nos deixar abismados. A Célula Adormecida é um livro que merece toda a nossa atenção e destaque. Está bem desenhado, bem construído, coerente e marcante. A narrativa está bastante diferente da da trilogia anterior, mas a cinematografia mantém-se bastante forte. As temáticas são sensíveis, mas o autor arranjou maneira de serem também instrutivas. É uma obra com a qual aprendemos e desmitificamos uma série de coisas. Sobre o Estado Islâmico, sobre o terrorismo, sobre o que realmente acaba por motivar uma série de coisas. Hei-de recomendar sempre e para sempre este livro.
Este foi um livro que me surpreendeu. Mas o mais invulgar, é que não me surpreendeu enquanto o lia. Houve alturas, durante a leitura, que não sabia bem se estava a gostar ou não. Depois terminei, pousei-o, ainda nem sequer escrevi o post de opinião, mas acreditam que foi a longo prazo que fiquei surpreendida com a forma como a história me marcou? Wakaso e Piconegro são personagens que ganham uma vida imensa, que mesmo a história passando-se num contexto social tão diferente da minha realidade, não são raras as vezes em que por qualquer razão faço paralelismos com eles. Não sei que vos diga. Leiam!
Bem, eu tive mesmo sorte com as (poucas) leituras de 2016. Acabei a série Nascida nas Brumas, com o livro O Herói das Eras, o Filipe Faria também nos agraciou com um romance novo, A Alvorada dos Deuses, Juliet Marillier publicou o segundo livro de Blackthorn and Grim, A Torre dos Espinhos, o Rafael Loureiro também voltou à publicação com Cinzas de Um Novo Mundo, as Edições Saída de Emergência lançaram, para meu deleito, mais um livro de Sherrilyn Kenyon, Amor Em Quarto Crescente, estreei-me com John Fante e Elizabeth Strout, tive o prazer de também conhecer a escrita do premiado Julián Fuks e ainda de dar por mim completamente agarrada a um livro como O Projeto Rosie, de Graeme Simsion. Ah! E claro, a fantástica Miúda da Banda, de Kim Gordon! Que inspiração de mulher!
Depois destas referências todas chega a altura do último destaque: A Guerra Não Tem Rosto de Mulher. Acho que é impossível não destacar um livro destes. Nem sequer costumo ler não-ficção, ou trabalho mais virado para a documentação/jornalismo de eventos históricos, mas sempre ouvi falar da segunda guerra mundial sob uma perspectiva masculina. A verdade é essa. E não tem nada a ver com feminismos ou outras coisas quaisquer, mas toda a gente sabe que a luta pela igualdade de direitos não significa que as mulheres de repente passem a ser homens. E, sendo mulher, sei que nós temos particularidades que em certos ambientes podem ter efeitos que os homens nunca terão sequer noção. Este é um livro muito forte nesse aspecto, principalmente quando se passa num espaço temporal em que a mulher ainda é vista para pouco mais do que lavar a roupa e tratar dos filhos. E houve tão mais que foi feito. Obrigada, Svetlana.