Jazz em Agosto 2025: Viagem por túneis de som (Elias Stemeseder & Christian Lillinger)

Jazz em Agosto 2025: Viagem por túneis de som (Elias Stemeseder & Christian Lillinger)

Uma proposta multimedia que conjuga som e luz, tal como os dois músicos articulam os sons acústicos com os artificiais. O resultado é uma imersão sensorial, uma espécie de site specific musical que convida ao abandono de espartilhos estilísticos.

Texto: João Morales

Fotos: Petra Cvelbar – Gulbenkian Música

Assim que o concerto começa, torna-se evidente o principal motivo para a escolha do Grande Auditório para a apresentação deste duo, Elias Stemeseder & Christian Lillinger, cuja terceira etapa do projecto, o álbum Antumbra (Plaist Music; 2024) servirá de mote ao espectáculo (depois dos dois volumes anteriores de Umbra, envolvendo Peter Evans, e de Penumbra, já em pleno dueto).

A sonoridade inicial que impera conjuga a limpidez do piano, dedilhado com minúcia e parcimónia, ou a característica vibração do cravo, aqui devidamente filtrada, com a dureza dos breaks da bateria. E toda esta envolvência cristalina é acompanhada pela projecção de coloridas tiras ao alto, criando um autêntico cenário virtual que assume uma dimensão fundamental em todo o ambiente que nos é proposto.

A electrónica ganha espaço na prestação de Stemeseder, gradual mas insistentemente, mantendo o diálogo com o seu parceiro, numa constante tensão criativa e interventiva que, amiúde, pode mesmo ser confundida com alguma divergência – ou dispersão. Mas, rapidamente e sem margem para dúvidas, se compreende que tudo não passa de uma estratégia consertada, duas sonoridades que se completam, preenchendo o nosso imaginário e toda uma sala de dimensões consideráveis.

A pesquisa que este duo electro-acústico nos propõe é ambiciosa, esforçando-se por alcançar novos patamares na conjugação de linguagens como a Música Contemporânea, a Improvisão, ou a utilização de samples e outras formas de modificação sonora, a priori, assumidamente artificiais. Durante o espectáculo, foram vários os momentos em que a fragmentação do discurso de ambos se acaba por reconstruir num novo reencontro, introduzindo a importância da intuição e de um forte conhecimento mútuo nessa descoberta constante de soluções.

Os cenários foram sendo alterados à medida das necessidades que a evolução musical impusesse, incluindo momentos de intensa obscuridade, acolhendo autênticos túneis e cornucópias de sons que foram sendo criados com o auxílio da parafernália electrónica, mas também pela acuidade dos dois executantes, equilibrando momentos de contenção e maior espectacularidade.

Elias Stemeseder nasceu em 1990 tem trabalhado bastante a solo e com o seu trio, com Jim Black e Thomas Morgan. Na editora portuguesa Clean Feed podemos encontrar o seu trabalho nos álbuns Suface of Inscripcion (2017), assinado pelo baterista Dre Hocevar, ou Dürer’s Mother (2022), do saxofonista Pospieszlaski. Por seu lado, Christian Lillinger (que já tocou com Joachim Kühn, Miroslav Vitous, Barre Phillips Tobias Delius, Peter Evans ou Alexander Von Schlipenbach, também conta com participações na mesma Clean Feed, como Live at the Armoury, com Gordon Grdina e Mat Maneri, ou Sinister Hypnotization, do Lisbon Berlin Quartet, de Luís Lopes, projecto com o qual já tocara no Jazz em Agosto, em 2014). Passou, por mais que uma vez, pelo palco do Jazz Im Goethe Garden, com destaque para o excelente concerto dos Kuu, corria o ano de 2015 (cuja recenção está indisponível, pois foi escrita para o Diário Digital, que já não existe online).

A parte final deste concerto fica pautada pela entrada da luz natural em toda a sala do Grande Auditório. Removida a parede central do palco, é a vegetação do jardim, um cenário natural e envolvente que serve de pano de funo ao encerramento da longa peça que ocupou toda a prestação. Uma experiência envolvente, arrojada e interdisciplinar, que mereceu um agradecimento de Elias Stemeseder ao técnico de som, Marco Pulidori, constante do programa, porém, mantendo no animato quaisquer responsáveis pela performance de luminotecnia. Depois, foi tempo de penetrar no tal jardim, agora tridimensional. 

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