Hoje trago-vos a entrevista de uma pessoa que admiro imenso, não só pela sua versatilidade, mas também pela forma como encara o mundo à sua volta. De forma admirável, Afonso Cruz tem conquistado vários tipos de públicos nos seus diversos projectos. Obrigada Afonso, pela disponibilidade e simpatia. Fiquem então com a sua entrevista.
Olá Afonso! Primeiro que tudo, muitos Parabéns pelo Prémio da União Europeia para a Literatura com a tua obra ‘A Boneca de Kokoschka’! Mas antes de abordarmos este tema, o que é que nos podes contar sobre ti?
Obrigado.
Posso contar que passo muitas horas a ler, que durmo a sesta, que gosto de cozinhar, que passei algumas fronteiras clandestino e que gosto de cerveja. Escrevo, ilustro, e toco na banda de roots The Soaked Lamb (uma tradução macarrónica de “ensopado de borrego”).
Como caracterizas o teu estilo e ritmo de escrita?
Não caracterizo. É muito difícil ter um olhar objectivo, quando se olha para dentro. Deixo isso para os outros, que são os nossos melhores espelhos.
Quais as tuas maiores influências?
Leio coisas muito diversas. Tento ensopar-me de filósofos como Nicolau de Cusa ou Plotino. Além disso, para mim, é muito importante estar a par do que se passa na ciência, sem no entanto deixar de ler livros sobre religião, incluindo todas as controvérsias e novelas, desde Irineu, Tertuliano, Orígenes, Celso, Valentim, Isaac Luria, etc. Poesia persa, em especial Rumi. Poesia mais recente, como Celan, Herberto Helder, E. E. Cummings, Dylan Thomas, Manoel de Barros. E escritores como Dostoievski, Thomas Mann, Saint-Exupéry, Pavic, Borges, e Nikos Kazantzakis. Alguns destes nomes são muito importantes para dar conteúdo, outros para dar forma.
Das tuas facetas como realizador, escritor, ilustrador e músico, tens alguma preferência? Como é que as conjugas?
Não tenho preferência. Têm todas um fundo comum, pois são formas de nos exprimirmos. A conjugação é natural: ou depende da vontade, ou depende dos prazos.
Tens colaborado em imensos projectos, fora as tuas obras individuais. Como é que vês, neste momento, o mundo editorial português?
Pessoalmente, não me posso queixar. Mas tenho algum receio que algumas editoras se estejam a perder no meio de grandes grupos, no meio de números. E que, em detrimento de outros valores, a qualidade se torne uma coisa indesejável.
Fala-nos um pouco sobre a tua obra premiada ‘A Boneca de Kokoschka’:
É um livro com uma estrutura um pouco especial, com alguns saltos temporais, um livro dentro do livro (atribuído a outro autor), capítulos fragmentários. É uma história sobre a criação da personalidade, da individualidade, e da necessidade do outro para que isso aconteça.
Tenho de confessar que ainda não li a tua última obra lançada ‘Jesus Cristo Bebia Cerveja’, mas o que é certo é que o título desperta logo uma grande curiosidade. Podes revelar-nos um pouco do que podemos encontrar neste livro?
É um livro sobre uma rapariga que pretende satisfazer o último desejo da sua avó: visitar a Terra Santa. Como não tem dinheiro nem condições para a levar, decide, com a ajuda de um professor, disfarçar uma aldeia, transformá-la em Jerusalém, e cumprir o desejo da avó.
Além da cerveja do título, que, há quem diga, é o motivo pelo qual existem livros, escritores e bibliotecas, esta história centra-se nas nossas maiores ambições, ou seja, naquilo que nós mais desejamos, ao ponto de o trocarmos pela própria vida. Transformamos o que adoramos em algo sagrado: como uma aldeia em Jerusalém, um homem em Deus, cevada em cerveja.
Já com oito obras lançadas e imensos projectos elaborados, que conselhos é que dás a quem se quer aventurar em qualquer um dos teus quatro mundos?
Fazer. Muitas vezes andamos perdidos e a coisa mais simples é fazer. Sentarmo-nos a escrever, por exemplo. Mesmo que nada saia bem. A correcção virá depois.
Pergunta da praxe: Alguma vez tinhas visitado o blog Morrighan? (Sente-te à vontade para dizer que não, é mera curiosidade) O que achas do espaço?
Sim, leio-o no reader. Acho sempre impressionante que haja pessoas que, sem receber por isso, se dediquem a divulgar livros. Todos os autores se devem sentir gratos, muito gratos, por isso. E beatificar quem o faz.
Que projectos é que tens em mente para um futuro próximo?
Mais alguns livros para 2013: um para crianças, um para todas as idades, mais um volume da Enciclopédia da Estória Universal, um livro ilustrado, e um romance.
Não o conhecia 🙂
Já li dois livros do autor, incluindo o "Jesus Cristo bebia cerveja" e alguns contos. Acho fascinante como se dedica a tantas artes diferente e parece conseguir conciliá-las. E 2013 promete muitos mais trabalhos do autor.
Mais uma boa entrevista, Sofia. 🙂
Obrigada Ana 🙂 Um dia destes tenho que te contactar para tratarmos da tua entrevista!
Beijinhos