Boa tarde! 2013 já começou e com ele recomeçam as entrevistas. Hoje apresento-vos o autor Alberto Silva que descobri recente e que me deixou logo rendida à sua escrita. Fiquem com a sua entrevista de um escritor que tem muito para dar. Tenho de confessar que foi das melhores entrevistas que já li. Adoro a forma como Alberto Silva se expressa.
Fala-nos um pouco sobre ti:
Antes de mais, deixa-me agradecer o convite para esta entrevista, Sofia. É sem dúvida, um enorme prazer, e ainda mais por ser a primeira do ano de 2013!
Sobre mim… aproveito o texto onde descrevo quem sou na minha página do facebook:
“Sou desinteressadamente interessado, tenho mudanças de humor, sou divertido e introspectivo, sou presente q.b. e maioritariamente ausente sem nunca esquecer, sou proactivo e não espero pelos acontecimentos, sou complicado, aliás, extremamente complicado até para mim mesmo, procuro a verdade das coisas fugindo à ilusão da fantasia, tenho sonhos (alguns reais outros nem tanto), sou verdadeiro nos meus sentimentos, sou verdadeiro acima de tudo comigo mesmo, detesto cozinhar mas faço o melhor arroz de tomate do mundo para a minha filhota, detesto a ignorância e a estupidez, irritam-me a incompetência e a mentira, adoro pequenos prazeres, sou incontrolavelmente viciado em nicotina, mas penso todos os dias em deixar de fumar, sou liberal de pensamento, sem nunca abandonar os meus ideais e valores, não gosto da promiscuidade, gosto de ouvir, mas não tenho muita paciência para conversas de circunstância, detesto a futilidade, mas adoro passar as tardes de Domingo em casa, gosto de desafios e não desisto facilmente, sou obstinado com o que me dá prazer, sou analiticamente pensativo em demasia, num estado de constante intermitência e não é muito difícil desligar e concentrar-me na desconcentração do mundo e no esvoaçar do meu pensamento. Adoro escrever, embora não o faça há algum tempo. Perco-me facilmente nas livrarias, inebriado pelo gosto de folhear manuais e novas descobertas. Detesto perder tempo a dormir e no entanto adormeço em qualquer canto com o máximo prazer, não sou grande amigo da comida e acho sempre que o tempo da refeição é uma total perda de tempo. Sou dos que acham que passamos pouquíssimo tempo nesta vida e gostariam muito que houvesse outra coisa depois disto tudo, mas que não acredita em nada disso.
Sou fruto de mim e de ti, sou eu com tudo o que me apareceu. Sou o tudo de alguém e sou o nada de muitos mais. Sou fruto de muitas alegrias e tristezas, ilusões e desilusões, conquistas e derrotas, procuras e encontros. Sou mais sereno hoje do que fui algum dia. Espero sê-lo ainda mais amanhã. Espero estar aqui muitos mais amanhãs…
Tenho pena de ter perdido a inocência acerca da Religião e acredito que o ser humano tem muita vontade de acreditar que acredita. Eu pessoalmente já não acredito, embora gostasse muito que houvesse mais depois disto.”
Como caracterizas o teu estilo e ritmo de escrita?
Eu diria que a minha escrita é eminentemente desconstrutiva. Gosto de brincar com as palavras, fazê-las ganhar vida própria. Carregá-las de emoções e sentimentos, em frases aparentemente sem nexo, que no final, farão parte de um universo mais lógico e evidente, sem nunca o ser abertamente.
Eu adoro escrever, e a escrita flui, vive, respira-me. Toma conta daquela parte do meu “eu” que necessita da adição, do vício.
Na poesia, por exemplo, a escrita é uma escrita de garra, quase vomitada. Sai. Ponto. Na prosa, acaba sempre por beber, da poesia, o ritmo, a intensidade, a própria loucura.
De uma forma geral, tenta ser louca, fora do comum, arrojada, mas nunca forçada. Se não sai, não se insiste.
Quais as tuas principais influências?
Seria difícil e redutor, concentrar tudo em meia dúzia de aspectos ou, até mesmo autores, quando se fala em influências. Um sentimento, uma emoção, um estado de espírito é, inúmeras vezes, “A” influência absoluta e necessária. Por vezes são momentos, etapas, são frases ou palavras… Há tanto que nos rodeia que nos faz viver e sentir vivos. Tudo o que foi – e o que é – nos influencia, de uma maneira ou de outra. Tudo. Por vezes pegamos nesses pequenos nadas e fazemos uma história.
Sem fugir das influências na escrita, invariavelmente teremos de visitar escritores como Dostoiévsky, com a sua escrita exploradora da condição humana nas suas vertentes arrasadoras e alucinantes, que nos transportam a mundos desordenados e perfeitamente actuais; Nietzsche, pela sua crítica ao status quo instalado, acompanhou parte da minha adolescência, revelando e demonstrando-me que o pensamento crítico deve fazer parte de nós e que a escrita de aforismos nem sempre é tão simplista como pode parecer; Kafka que, ao ler o seu “O processo” e o “Castelo” rapidamente entendi que os pavores e constrições interiores são potenciadores de obras prodigiosas, em ambientes elevadamente visuais e absolutamente envolventes. O Allan Poe, que me apresentou ao “Corvo”, que acho simplesmente divinal. “A metamorfose”, “Assim falou Zaratustra”, “O Castelo”, “O Príncipe”, “O Jogador”, “Gente que bate à porta”, entre outros, talvez tenham sido a porta para o meu caminho na literatura.
Gosto de escrita diferente, que desperte, que abra mentes. Que fuja à norma, à regra e ao processo comum, instalado. Gosto de quem pensa fora do quadrado, de quem quebra barreiras e procura dar passos em frente. Já há demasiadas pessoas a darem passos para o lado. O que precisamos é de quem dê passos em frente, que faça as coisas mexer e andar.
Escreves poesia e romance. Qual dos géneros preferes? Qual deles achas que te faz chegar mais perto dos leitores?
A poesia é mais rápida de se escrever, sai de uma forma muito fluida, vomitada, de dentro das entranhas. A prosa, sendo fluida, também, embora pela forma tenha de ser necessariamente diferente, na sua génese. Não fico muito tempo a pensar no que vou escrever, ou na forma. As ideias fluem naturalmente, muitas vezes à medida que vão saindo as palavras anteriores. Quando se dá conta, do caos, nasce um texto. Ainda caótico, mas ordenadamente desconstruído de um caos gerador. Gosto de gerar caos, do caos.
Escrevi três livros de poesia e um romance. Na sua forma muito peculiar, ambos são altamente envolventes na forma como despertam a emoção e o prazer em mim. Um não existiria sem o outro, na minha forma de escrita.
Apesar da escrita ser sempre um prazer para mim, este último livro, o romance, foi sem dúvida especial, e pela reacção dos leitores se calhar foi com o romance que alcancei uma maior projecção.
Conta-nos um pouco sobre o teu trabalho já publicado.
Tenho três livros de poesia editados, dois em 2011 e um no início de 2012, uma participação numa colectânea de poesia e no ano passado editei o meu primeiro romance – branco.
O Demências – poemas ou algo parecido, o primeiro que editei, surgiu de forma algo inesperada. Eu sempre escrevi, sempre pensei que seria fantástico poder, um dia, editar um livro, mas achava que era um daqueles sonhos que não se iria concretizar, nem perdia muito tempo a pensar nisso. Depois de ter imenso material reunido, de o prazer de escrever ser tão grande e por ter um feedback tão entusiasta, por parte de quem me ia lendo, pensei – porque não? – e assim surgiram os 2 primeiros livros o “Demências poemas ou algo parecido” e o “Labirinto de nós”. Como consequência desse trabalho fui convidado a participar numa colectânea de poesia editada o ano passado.
Em 2012 editei um e-book, de download gratuito (http://perfeitosencaixes.comlu.com/web_documents/perfeitos_encaixes.pdf), e que teve uma excelente aceitação por parte dos leitores, chamado “perfeitos encaixes”, com alguns textos que eu simplesmente quis partilhar com os meus leitores.
Lista de publicações:
Demências poemas ou algo parecido – Edições Vieira da Silva (2011)
Labirinto de nós – Alfarroba Edições (2011) (Opinião no Morrighan)
Colectânea de poesia entre o sono e o sonho vol. III – Chiado Editora (2012)
Perfeitos encaixes – e-book (2012)
Branco. – Chiado Editora (2012) – romance
Fora as publicações em formato físico, lançaste também um e-book. Qual a tua opinião sobre o tema ‘Livro vs E-book’?
Como amante de livros continuo a preferir o livro tal e qual sempre o conhecemos. Adoro sentir a sua textura, o seu peso, o seu cheiro, de o folhear e perder-me nos textos, mas acho bastante interessante o formato ebook, pela sua practicidade – pois podemos transporta-lo connosco para todo o lado, num simples telemóvel, por exemplo. Em alguns casos pode servir como um excelente veículo de divulgação, permitindo novas abordagens à escrita e divulgação de conteúdos.
Hoje em dia a criação não tem, nem pode ter, limites. O ebook pode ser um excelente meio de se conseguir fazer chegar a leitura a um público mais vasto, incorporando elementos visuais, som, movimento, etc.
Sei que utilizas bastante a web para ir dando a conhecer o teu trabalho. Tens recebido feedback dos leitores?
Sim, bastante. Tem sido uma aventura fantástica, uma jornada de aprendizagem e crescimento, com um feedback tremendo, profundamente positivo, muito bom mesmo… No caso do “branco.”, por exemplo, temos criado uma corrente de quase campanha, onde o escritor e o leitor se confundem, com a geração de movimentos e ideias que surgem de várias pessoas diferentes. Ainda continuo a receber – e partilhar – fotografias do “branco.” com os seus leitores. Até ao momento, sei que já visitou Washington e a Casa branca, passou pelo Japão, foi à Opera em Paris, chegou recentemente ao Egipto, saltou a Espanha, e passeia infinitamente por Portugal e pelas cidades e vilas magníficas que temos. Além das fotos, chegam peças de áudio, comentários, cartazes, enfim, tem sido ao mesmo tempo inesperado, mas imensamente bom, com uma alegria enorme de conseguir a proximidade com todos os que me lêem.
Para além do facebook (facebook.com/alberto.silva.autor), escrevo com alguma regularidade no meu blogue: http://sofarouge.blogs.sapo.pt/.
Que projectos tens em mente para um futuro próximo?
No futuro ainda mais que próximo, agora, vou lançar um projecto acabadinho de sair da forja e que divulgo aqui em primeira mão: vai sair um ebook, para o qual convidei alguns escritores como o Pedro Paixão, Samuel Pimenta, Hugo Girão e o Jorge Bogalheiro, e ainda ao nível da fotografia o Pedro Costa. É um projecto que me deu um gozo tremendo e que penso ser algo de inovador no campo dos ebooks, uma vez que é uma conjugação de poesia, contos e frases em perfeita sintonia com a fotografia. Lancei o repto a todos para que escrevêssemos algo sem tema definido, sem limite de ideias, sem barreiras ou constrições, sem fio condutor… A ideia era reunir um conjunto de textos (poemas, contos, mini-contos, etc), que ficassem assentes num fluir de imagem (fotografia), já num formato pensado nas novas tecnologias e suportes, como são as tablets. E o melhor, é que vai ser de download gratuito.
Além disto, quero muito continuar a escrever enquanto me der prazer e o continuar a fazer para mim próprio. Assim, serei fiel ao meu estilo de escrita, não me desiludo a mim nem aos meus leitores, nem engano ninguém. Enquanto assim for, continuarei a escrever: com prazer, ânimo, vontade, garra…
Escrever mais um romance, talvez editar um novo livro de poesia, mas acima de tudo continuar a escrever com prazer.
Pergunta da praxe: O que achas do blog Morrighan?
Desde o dia que o conheci que tem sido uma companhia diária. Isso diz tudo. As críticas, as apresentações, os novos autores, os livros revisitados, o rico conteúdo, tudo isto é indissociável do Morrighan. Foi uma das boas surpresas de 2012, tanto o blogue como as nossas pequenas, mas profundas, conversas.
Parabéns Sofia. Muitos!
Muito obrigada por toda a atenção, simpatia e disponibilidade, Alberto. Tudo de bom.