Parece um exagero, apenas não o é. A minha relação com Paredes de Coura vem desde 2011, e a partir de então não mais consegui largá-lo. Apareceu na minha vida na altura em que mais precisava, mesmo eu não tendo essa noção na altura, e tornou-se numa espécie de ritual anual. Paredes de Coura tem uma energia, um ambiente e uma singularidade que nunca encontrei em mais lado nenhum. Hoje em dia, é muito mais do que um festival, muito mais do que uma imagem de marca – é uma maneira de se viver, pelo menos uma semana por ano.
A tenda é a mesma desde o primeiro ano, ainda se aguenta, e o local também! Adorei a clareira onde acampei lá em 2011 e, desde então, mal chego é para lá que me dirijo. Se no primeiro ano apenas fui na véspera, em 2012 já fui três dias antes, mas tanto o ano passado como este fui quatro! E só não fui antes porque tinha compromissos profissionais. Depois é toda aquela nostalgia – chegar à clareira, mandar a tenda ao ar, forrá-la com a manta, colocar o colchão, forrar o colchão com mais mantas, colocar as malas de lado (eu tenho 1,80m e ocupo muito espaço…) em filinha, dispôr nas colunas já pré-definidas as toalhas, etc. etc., colocar o tapete de entrada, a manta do espaço do convívio e sentar cá fora a comer, depois de centenas de kms feitos! Posto isto, é hora de colocar o casaco e dirigir-me à vila!
Se nos anos anteriores tínhamos as festas da vila, com o típico cantor pimba e as bailarinas mais despidas que vestidas com as bochechas do rabo a dar a dar, este ano, desde o dia 16, haviam autênticos concertos em jeito de warm-up para o festival. Foram bandas de muitíssima qualidade, como Moullinex, Xinobi, First Breath After Coma, Holy Nothing e outras (podem ver aqui) e logo no primeiro dia revi imenso pessoal que, normalmente, só vejo mesmo por Paredes de Coura. Está para breve o post sobre estes três dias que presenciei!
Outras duas coisas imensamente requintadas desta edição, foi o cinema ao ar livre (sempre relacionado com a música) e os ciclos de conferência com temas interessantíssimos (COURAge to THINK)! Mais um crescimento a nível cultural sem preço, de temas pertinentes e interessantes, com convidados de luxo e totalmente gratuito.
Uma das coisas que mais gosto quando vou a Paredes de Coura é estar no rio. Aquela paz que nos assalta, não havendo qualquer espaço ou hipótese para stress, euforia (a não ser a euforia de nos rirmos, e de gritarmos de choque quando entramos na água gelada), e para as preocupações quotidianas. Lembro-me de estar a dois meses de entregar a tese, completamente em pânico e com o tempo a apertar, e tirar na mesma aqueles dias para ir a Paredes de Coura. Comecei a trabalhar e, se tinha de escolher dias e local para férias, a resposta era automática e óbvia – pelo menos para mim, porque outras pessoas que nunca lá foram ficavam muito espantados por eu decidir ir acampar para um local onde a probabilidade de fazer frio e chover é sempre alta e sempre imprevisível. Não faz mal, digo eu, tudo por lá compensa, até o frio nos ossos, dos banhos gelados, e os resfriados à noite.
Liberdade. É este o sentimento que impera por lá. Liberdade de expressão, de movimentos, de sentimentos. Uma liberdade que se sente e pouco ou nada se consegue explicar. Cada um veste-se como quer, exprime as suas ideias, anda à vontade, sem que haja qualquer tipo de olhar julgador, sem que haja qualquer descriminação ou tentativa de opressão. Não é um festival de elite, nem de pobres, nem de hippies, nem de metaleiros, etc. – é um festival de pessoas que prezam o seu bem estar, a música e, lá está, a sua liberdade. E é por isso que quem lá vai e se identifica não mais esquece e quer sempre voltar. Quem vai e não se identifica, sejamos sinceros, também não faz falta. A essência de Paredes de Coura, na minha opinião, nunca esteve tão forte. Mesmo com a Vodafone a patrocinar o festival, não se tornou uma coisa comercial – não é um festival onde grandes marcas distraem tudo e todos com ofertas de brindes e outras actividades. Quem vai lá, é porque gosta de música e não está à espera de ser intoxicado com publicidade infinita. Mesmo a praça da alimentação é composta por entidades de menor dimensão. É um verdadeiro festival de música e não um parque de diversões que calha ter n palcos com bandas que custam milhões.
Depois de três anos a ir como mera espectadora, este ano recebi a bela prenda de ser aceite como imprensa. Quando se gosta tanto de algo como eu gosto deste festival, receber este reconhecimento pelo meu trabalho foi como um bálsamo para mim. Na véspera do festival começar no recinto, lá fui levantar a pulseira e nem queria acreditar em mim. Foi uma experiência muito diferente e eu queria mesmo fazer algo bonito.Não sendo um jornal ou uma revista badalada de imprensa, quis manter a identidade do meu trabalho, tendo consciência daquilo que representava – um blogue pessoal apaixonado por cultura portuguesa, em que o meu principal objectivo ali eram as bandas portuguesas. Sem me querer comparar com jornalismo profissional, sem ambicionar ser comparada com que publicação for. Ser apenas eu, fazer aquilo que sei de melhor e sentir-me apaixonada por isso. Em Paredes de Coura encontrei isto tudo! As bandas portuguesas, por norma, eram as primeiras do dia a tocar e, na maioria das vezes, logo a seguir eu ia para a zona de imprensa fazer a reportagem desse dia. Só publicava no dia seguinte porque tinha de esperar pelas fotos do excelente Hugo Lima, mas sentia-me de tal forma orgulhosa dos nossos artistas que abdicava de estar ali na plateia (da imprensa também se ouve e vê bem) a ver os artistas estrangeiros, para escrever sobre os nossos. Se isto não é termos gosto pelo que fazemos, o que é? Também as Music Sessions, a cada tarde antes do recinto abrir, foram uma experiência única – estive numa ponte romana, numa serração, num campo de futebol e num miradouro, tudo em paisagens idílicas. Um autêntico mimo!
Perdoem-me as fotos de má qualidade, tiradas com o meu telemóvel, mas como este post é de um teor tão pessoal, quis partilhar convosco conteúdo 100% meu. Poderia falar dos meus concertos preferidos, do que foi melhor e pior, mas para isso também já serviram as reportagens e, como tal, fico-me pelo ambiente no recinto. Nunca tinha visto tanto público a receber as bandas portuguesas como este ano. Por vezes tímido ao início porém, após incitamento da banda ou por pura reacção, não tardavam em manifestar o seu contentamento. E há para todos os gostos, o quadrado central mesmo em frente ao palco onde acontecem os moches, os saltos e o auge da euforia, ou então o anfiteatro inteiro para estar de pé ou sentado, proporcionando experiências muito próprias e pessoais ao gosto de cada um.
O que é que fica, no fim? Toda uma saudade e vontade infinita de voltar. Este ano até uma foto com o famoso Piruças tirámos! Sei que não falei de muita coisa, mas falar sobre Paredes de Coura torna-se algo viciante e não quero de todo alongar-me em devaneios. Ficam agora os agradecimentos à organização do Vodafone Paredes de Coura, à Ritmos, aos meus companheiros de guerra – Caldeira, Marçal, Kristen, Francisco e os grandes Les Crazy Coconuts – e a todas as pessoas que me receberam bem e me respeitaram pelo trabalho que estava lá a fazer. Paredes de Coura volta a marcar a minha vida de forma única e tornou-se, sem dúvida alguma, uma autêntica necessidade para mim. Ir a Paredes de Coura é como se estivesse a suster a respiração o ano todo e, quando chego lá, pudesse finalmente respirar fundo e como deve ser. Liberdade, sim, também conhecida com o nome Paredes de Coura.