Tentando, miseravelmente, resumir 2015 |
Acho que nunca tive tanta dificuldade em perceber como falar de um ano como de 2015. Se nos meus 27 anos pudesse classificar 2015 de alguma maneira, talvez o classificasse como o mais alucinante de todos, tanto no bom como no mau sentido. Não sei bem, mas parece que chegado este dia 31 sinto uma espécie de equilíbrio – que o universo tratou de me proporcionar coisas tão boas e tão extraordinárias, como sofrimento e lições de vida. Tenho esta impressão de que estou a fechar um ciclo da minha vida, mas não sei se compreendo bem o que é que isso quer dizer.
Na numerologia cada número tem um significado, mas dizem também que a nossa vida é composta por ciclos de setes anos. Talvez seja por isso que tantos enfrentam a crise dos sete. Não sei se já ouviram falar nisso, mas só este ano assisti a umas quantas separações que, imaginem só, tinham tido início há sete anos atrás. O blogue também faz sete anos, mas felizmente estamos “mais unidos do que nunca”, apesar de eu andar a pensar num novo rumo para a nossa “relação”. Na brincadeira da numerologia, fui também ver como seria o meu 2016 – ora, parece que também vai estar maioritariamente associado ao número 7, que tem muito a ver com a investigação, a veia cientista e de professor, e que está ligado ao misticismo e à reflexão. Eu não digo que a nossa vida é de ciclos? Vale o que vale, não que eu siga estas coisas, mas fica a curiosidade!
Okay, eu bem ando aqui a empatar, mas bora lá enfrentar 2015 de frente e perceber o que se tira dele. E é aqui que o meu estômago começa às reviravoltas, tanto pela sensação de coisas boas e borboletas na barriga, como pelo ácido que o corrói. O ano não começou mal. Eu tinha acabado de apanhar um susto com o LMR, mas as coisas pareciam melhores, o primeiro aniversário no Musicbox estava prestes a chegar e acabou por ser uma noite do caraças. Aliás, engraçado como dou contar de começar e acabar o ano mais ou menos da mesma maneira nesse sentido – com os The Allstar Project como música de fundo. Se precisam de bandas sonoras épicas para as vossas vidas, experimentem ouvi-los. Foi uma noite bem bonita, com Twisted Freak e Azul-Revolto e os The Allstar Project. Passados uns dias, com a minha estreia em entrevista na rádio marcada para essa noite, no programa Purpurina do Rui Estêvão da Antena 3, arranjo maneira de ir parar às urgências e de ficar lá o dia todo. Cheia de medicamentos, incluindo morfina, lá me dirijo eu para a rádio. No final não me lembrava de nada do que tinha dito, mas o podcast parece ter corrido bastante bem!
Seguiu-se o aniversário do blogue no Porto, em Fevereiro, com Tio Rex, Tales and Melodies, O Abominável e Les Crazy Coconuts! Houve disposição e companheirismo e foi também o início de uma grande amizade com a maior parte dos músicos que estiveram presentes esta noite. Passado pouco mais de uma semana morre o João, provavelmente o meu primeiro colega de escola que se tornou um amigo, que vivia porta com porta comigo. Ainda por cima em serviço, era polícia, e a perseguir ladrões. 27 anos, fazíamos um mês de diferença. Exactamente um mês. Eu a 1 de Junho, ele a 1 de Julho. Foi também exactamente um mês depois, mais dia menos dia, que o LMR morreu. Se perder um amigo de infância é como levarmos um estalo na cara, imaginem perder um dos vossos melhores amigos de hoje, do presente, de alguém sem quem vocês não se imaginavam. De vez em quando ainda faço de conta que ele está cá e imagino as respostas dele, o que ele me diria ou faria em certas circunstâncias. Por vezes consola lembrar-me da sua gargalhada (o João também tinha uma muito parecida), da sua ironia latente e mordaz quando necessária, da sua força, da sua humanidade, de tudo aquilo que me fez crescer com a sua sabedoria ao longo dos últimos anos. Não se enganem, se o BranMorrighan ainda existe, se eu algum dia tomei coragem de sair da minha zona de conforto e de fazer mais, acreditem que lhe devo muito, mais do que poderão imaginar. Nunca me vou esquecer das palavras dele, que não partilho porque as guardo como minhas, porque há sempre algo que merece e deve ficar só connosco. Era capaz de escrever linhas, folhas, livros inteiros sobre este 2015. Sobre tudo o que me deu e o que me tirou. Mas nunca vou ser capaz de arranjar palavras que expressem o vazio que ainda está presente, o quanto me sinto impotente quando entro no meu quarto e sem querer encaro as minhas estantes e lá estão eles, os seus livros em primeira fila, com as suas dedicatórias lá dentro, lembrando-me cada momento e afastando-me ao mesmo tempo.
2015 foi um ano filho da puta em muitos sentidos, desculpem-me a linguagem. Ninguém perdoa perder as pessoas que mais se ama. Podemos eventualmente aceitar, aprender a viver com isso, mas ninguém vai dizer que está tudo bem.
Com isto já íamos no final de Março e o meu doutoramento a sofrer as consequências. Estava também a dar aulas, e dei até ao final de Julho, e foi o que correu menos mal, já que fui avaliada como Excelente em termos de docência. Haja boas notícias. Mas há mais. O LMR era para ter feito parte, morreu cedo demais, da colectânea Desassossego da Liberdade, que eu organizei e que foi editada pela Livros de Ontem. Mas aconteceu e correu tudo muito bem. Para além dos autores já editados anteriormente – Manuel Jorge Marmelo, Carla M Soares, Nuno Nepomuceno, Samuel Pimenta e Pedro Medina Ribeiro – descobrimos mais cinco novos autores e ainda tivemos a estreia do Noiserv na literatura e mais uma participação literária de Guillermo de Llera. A apresentação foi n’O Bom, O Mau e o Vilão, contou com a actuação de Tio Rex e entre abraços, algumas lágrimas e muita emoção, veio cá para fora o objecto físico com a magnífica autoria gráfica de João Pedro Fonseca. Para mim é o livro perfeito enquanto conceito, dedicação e expressão. Mas eu sou suspeita, a ideia foi minha!
Um mês antes, tive mais uma noite de curadoria minha no Musicbox, em Junho. Esteve lá a Surma, que acho que vai ser só a melhor coisa em 2016, estiveram os Twin Transistors, que também acho que vão dar muito que falar no próximo ano, e a fechar a festa os cada vez melhores Les Crazy Coconuts. Bela maneira de entrar no Verão, de aliviar e espantar más energias, essas coisas todas. Claro que tenho de também agradecer ao Musicbox pela confiança em me deixar levar lá projectos em que acredito. Em 2015 cheguei a organizar lá mais duas noites, em Setembro com Tio Rex e Um Corpo Estranho e em Dezembro as apresentações dos discos de Bússola e Les Crazy Coconuts. E agora vem aí o sétimo aniversário! Musicbox, mil vezes obrigada por me receberes e a quem acredito!
Veio o Verão e os Festivais e… eu doente. Pois é, eu sei que o sorriso está sempre presente na cara, que dificilmente deixo transparecer que não estou bem, mas fui abdicando de várias coisas ao longo de 2015 por não andar tão bem de saúde. Entre desmaios esporádicos e sem razão aparente a uma constante fragilidade em ficar doente, lá me safei a ir ao fantástico Bons Sons e a Paredes de Coura, embora para este último tenha de me ter vindo embora no último dia por já não aguentar com as dores e com a febre. Ainda assim, os dias que aproveitei foram excelentes! Estive com imensos artistas que admiro, fiz novas amizades, aprofundei alguns laços, foi bom. Foi realmente bom.
Chega Setembro e com ele, não sei como, uma nova força. Decidi pegar no meu doutoramento pelos cornos e ou era agora ou não era, e tem sido. Felizmente, por tudo, tem sido. Escrevi um paper que foi aceite numa conferência, vou a França em Março!, já estou a tratar de um novo, que vai demorar mais tempo, mas cuja motivação andava desaparecida e agora tenho mesmo vontade de voltar a trabalhar nisto, tenho dado apoio lectivo a uma cadeira de primeiro ano… Não sei, as coisas andam a melhorar! E é bom, e é excelente, mas é-o de forma limitada. Todos nós temos a nossa vida pessoal e não pensem que não sou comum mortal e que não me apaixono e desapaixono. Apenas não falo disso. No meio de tanto trabalho quem é que tem tempo para pensar nessas coisas, não é? Ficariam admirados como arranjamos tempo para em cada brecha pensarmos no que não devemos!
Mas hey! Fui a Bilbao!! Graças à Omnichord Records tive a oportunidade belíssima de ir fazer de “agente secreta” por uns dias e de ficar a conhecer melhor toda a indústria musical. Não só os dias de conferências e de concertos foram intensos, como também a cidade é linda e fiquei enamorada ao primeiro pé pousado no chão em frente ao hotel, com vista para o rio e para as pontes. Sem dúvida que foi um ponto alto de 2015. Mal descansei, mal dormi, alimentei-me mal, ahahah, mas que interessa isso quando a adrenalina parece que nos preenche por completo? Claro que depois cheguei a Portugal e só queria comer o mundo inteiro e dormir infinito… Mas desde então que tenho estado mais activa a ajudar as bandas da Omnichord e tem sido uma experiência muito boa. Se eu já considerava antes que tinha uma família em Leiria, hoje tenho a certeza de ter uma. Ah! E os sacanas dos Phase que deram um concertão do caraças no Beat em que eu mal conseguia respirar em condições e nem sequer pude gozar o concerto como deve ser? É bom que voltem a dar mais concertos… Isso e os Allstar terem disco novo… Era bom, não era? E já agora, o Hugo Ferreira é o maior. Não sei como é que ele consegue, mas ele é o maior.
E com isto chego a Dezembro, com a cabeça a mil, doente, mais uma vez, há quase duas semanas, mas digo-vos que estou com a sensação que 2016 vai ser do caraças. Aprendi tanto este ano, cresci tanto, tive que lidar com tanta coisa ao mesmo tempo que se hoje olho para mim e me vejo com vontade de continuar com o doutoramento, com vontade de continuar a dar aulas, com vontade de continuar com o blogue, as minhas pantominices e ainda de organizar uns quantos concertos… É porque está tudo bem, não é? Sem ironias, estou mesmo cheia de ganas para o próximo ano, tenho objectivos já muito sólidos com prazos muito curtos que quero cumprir o superar o melhor possível. Não esqueço quem perdi, não esqueço quem amo, não esqueço quem sou. Vem tudo comigo em tudo o que faço e só assim é que é possível continuar.
Não vejo cada ano como um recomeço, como essa coisa do ano novo vida nova. Ninguém começa nada de novo, nem sequer recomeça. Uma pessoa pega no que resta no momento e tenta fazer disso algo melhor. Nós apenas continuamos, não recomeçamos, podemos é continuar agora de uma forma mais madura, mais atenta, com uma postura diferente e mais senhora de si. É isso que eu desejo a toda a gente, que não ignorem aquilo pelo que passam, as coisas boas e as más, mas que aprendam com elas, que se tornem mais fortes, mais sábias, que continuem a arriscar, que continuem a errar e a acertar, aprendendo com ambas. A vida nunca é, nem será, uma linha recta. Mas independentemente da forma, podemos sempre sorrir, sorrir é a melhor arma contra qualquer adversidade. Façam os lutos que precisarem, despendam o tempo que precisarem para os pequenos lamentos, mas não percam muito tempo com isso. Como diz Afonso Cruz e muito bem “Viver não tem nada a ver com isso que as pessoas fazem todos os dias, viver é precisamente o oposto, é aquilo que não fazemos todos os dias.” E por vezes nem damos conta desta verdade tão simples.
Terminando, já tenho muita coisa planeada para 2016, mas vou deixar isso para outro post, que este está assim meio lamechas e confuso e é mais para exorcizar alguns demónios que outra coisa. Mil beijos e sorriam! Venha de lá esse 2016 lindão para lhe fazermos frente.
PS: Último Diário de Bordo de 2015, bem gigante, sem imagens, não sei se quiseram ler tudo até ao fim ou não, sei que é talvez o post mais pessoal que alguma vez fiz, mas encarem-no como uma passagem de um livro qualquer surreal. Tanto podem acreditar como não, o que interessa é que entrem em 2016 cheios de força! Beijos!