A pele
O maior órgão do corpo humano
Pensa ela enquanto ele lhe toca o nariz com a ponta dos dedos
Estão deitados lado a lado
Nus
Ela de barriga para cima
Ele de lado
Começa na testa
Desenha-lhe as sobrancelhas
Podia fazê-lo de olhos fechados
Vê-se nos olhos dela que sorriem
Toca-lhe os lábios
Que ela entreabre num sorriso que ele já desvendou há muito
Sente-lhe o queixo de rebeca
E beija-o
Ela ri-se com cócegas
Desce com os dedos até ao pescoço
A mão percorre-lhe o peito
E fecha-se nos seios dela
Vazios
Usados depois de amamentarem os filhos
Os filhos dele
Já toca esses seios há quase 20 anos e continuam a surpreende-lo pela sensualidade
Como o surpreende a pele macia e suave
Que nem as fragrâncias italianas – as que ela prefere – nem os cremes com que se hidrata depois do banho
Conseguem disfarçar o cheiro
Quente, humano, doce, dela
Um cheiro que o alimenta de paixão
De desejo
Que o seduz
Olha-a nos olhos e reconhece-a
Os olhos dela continuam a sorrir
E pedem-lhe
Massaja-lhe a barriga metida para dentro
Estás mais magra outra vez
Diz-lhe
Estou óptima
Responde ela
Sente-lhe a curva da barriga vazia
Sente-lhe as costelas
E conta-as
Falta-te a do Adão
Diz-lhe ele
Ela ri-se
É por isso que és tão refilona
Continua ele
A mão já desceu até ao ventre e toca-lhe no tufo de pelos púbicos
Percorre o interior da coxa
Aquele único sítio do corpo da mulher onde não há pelos
Sente-lhe as coxas
Ela dobra as pernas para que ele lhe toque os joelhos
A respiração dela está mais forte
A dele está pausada
Mas não o sexo
Que ela sente duro nas costas da mão
Porque é que pintas sempre as unhas dos pés e não das mãos
Pergunta ele
Para tu fazeres essa pergunta
Que ela não responde
Como sempre
Descansa ao lado dela e olha-a nos olhos
Fundos, limpos, cinzentos
Que continuam a sorrir
Vira-te de barriga para baixo
Pede-lhe ele
Ela roda o corpo
Sem tirar os olhos dela dos dele
E repousa o rosto
Ele afasta-lhe os cabelos castanhos lisos que o cobrem
E toca-lhe os ombros
Musculados da ginástica
Sente-lhe as omoplatas
E desenha-lhe a coluna e as curvas desta
Uma ligeira subida a partir do pescoço
Uma descida mais acentuada a partir das omoplatas
E chega ao ponto que ele mais gosta
O início ligeiro daquela curva que o leva às nádegas
Pequenas como as de um rapaz
Musculadas com as de um homem
Que ele adora sentir
Apalpar
Morder
Agora percorre-as com os dedos
E sente aquela discreta penugem que as cobre
Os dedos descem
Reconhecem o caminho
Tocam-lhe o sexo
Húmido
Quente
Afasta-lhe os lábios e introduz-lhe um dedo na vagina
Ela geme
Os olhos já não sorriem
*Conto escrito ao som de ‘Are You a Boy or a Girl’, coletânea reunida por Ricardo Coelho, Though I Was James Dean For a Day
https://branmorrighan.com/2012/07/13.html
Helena Ales Pereira
Muito.mau!; roll de cliches a querer passar por literatura ..