O festival deste ano terminou com uma proposta imbatível. O trio alemão Gorilla Mask arrasou o jardim no final do Jazz Im Goethe Garten 2018.
Por João Morales
Os primeiros acordes poderiam evocar os Butthole Surfers de “Who was in my room last night”. O baixo eléctrico de Roland Fidezius, potente, vem dar os primeiros sinais. A ele se junta o saxofone alto de sonoridade saltitante manejado por Peter Van Huffel e a bateria de Rudi Fischerlehner. Uma plateia muito bem preenchida, como vem sendo hábito, para acolher o concerto final desta edição do Jazz Im Goethe Garten. Chamam-se Gorilla Mask e fizeram as honras da presença alemã.
Lançaram-se na edição em 2012, com o álbum Howl. Dois anos depois, com Bite My Blues, integraram o catálogo da Clean Feed, editora onde já bisaram, em 2017, com Iron Lungs. Estes jovens alemães são herdeiros de uma tradição que mergulha o Jazz em outras influências, não sendo despropositado falar dos Painkiller, Massacre, mas igualmente de Lounge Lizards, algumas encarnações dos Material ou dos Golden Palominos. Designar a sua música como Punk Jazz pode ajudar a situar, mas é ainda limitativo, dada a amplitude de sonoridades que vão contribuindo para a massa sonora que resulta do embate entre estes três músicos, quase sempre em crescendo, num sentimento de suspense que, no Goethe-Institut, foi geralmente quebrado por entusiastas e exultantes ovações.
Peter Van Huffel utiliza alguns pedais e efeitos no seu saxofone, provocando passagens espaciais ou momentos de quase diálogo consigo mesmo, confrontando o som do saxofone com a sua própria repercussão electronicamente processada.
A felicidade de tocarem em conjunto foi um sentimento notório ao longo de todo o concerto, ajudando à dinamização do grupo de uma forma constante, sem que houvesse momentos de simples agenda ao longo do set, mas antes um genuíno e destacado empenho em toda a prestação.
Com “Thump”, tema do álbum mais recente, saxofone e baixo vão intercalando riffs, até que Van Huffel, de forma decidida e lúdica, toma a dianteira, secundado por um baterista que fazia lembrar, a espaços, um Chris Cutler ainda jovem, pela forma de manejar as baquetas, fazendo-as “poisar” na tarola ou nos pratos com elegância, sem descurar a agilidade e rapidez.
Num concerto mais que competente, houve espaço para momentos devedores do Rock sinfónico ou da estética ECM (com Peter Van Huffel a trazer à tona evocações de Jan Garbarek ou um John Surman da sua fase electro-acústica), Roland Fidezius (que explorou igualmente uma gama de efeitos electrónicos) metamorfoseado num Bootsy Collins acelerado e embebido em improvisação, conjugações de Space Metal que equilibram os dois pilares com a sabedoria dos descomprometidos ou ritmos repetitivos e possantes que acolhiam o discurso de um Peter Van Huffel igualmente influenciado por Anthony Braxton ou Eric Dolphy (como foi o caso de “Hammerhead”).
A função encerrou com dois temas bastante rápidos, “Before I Die”, confirmando a formação como um Power Trio bem oleado e sem espigões por limar, e um encore oferecido com largos sorrisos, uma cavalgada saudável e voluntariosa, com os três músicos a puxarem pelos seus instrumentos de forma a assegurar um clímax sonoro que a todos agradou de sobremaneira.