Eu quero que a torneira pare, a sério que quero Luís, porque eu sei que me ias repreender por isto. Sei que no teu tom paternalista me ias dizer que eu estava a ser ridícula e que devia levantar a cabeça e canalizar todo este turbilhão de sentimentos para fazer algo bom. Porque é essa a pessoa que tu és. Eu sei, os tempos verbais, não me interessa, porque para mim és e serás. Aqui, comigo e com os que amas porque eu sei que não serias capaz de nos deixar completamente. Alivia-me pensar que ao menos já não sentes dor, que já não sofres como andavas a sofrer em que tudo era um esforço enorme. Nunca te queixavas, é essa a verdade, constatavas as coisas e seguias em frente, tenho tantas saudades tuas, Luís.
Lembras-te de todos os projectos que já vínhamos falando há mais de um ano atrás? Desde aquele evento do 5º Aniversário do Blogue em que vieste e foste de avião… Tinhas tantas coisas por fazer, mas querias estar presente e apoiaste-me e desafiaste-me sempre a fazer mais e melhor. Quiseste estar presente para me apoiar e aquele gesto contou mais que tudo. Será que já sabias de algum indício? Lembro-me de quando me começaste a dizer que não te sentias bem, que talvez fosses ao médico. Não quero continuar com este tom triste, não é o que tu queres. Quero antes ter bem presente todos os momentos em que estivemos juntos, todas as conversas que tivemos, a forma genuína e sincera como a nossa amizade nos dava tanta liberdade de espírito.
Não quero desvalorizar nenhuma das minhas pessoas, como eu chamo aos meus amigos, mas tu sempre foste aquele que mais acreditou em mim. Nunca percebi porquê e sempre fiquei incrédula com a tua capacidade em me motivar, em me fazeres acreditar que eu podia fazer mais e melhor se quisesse. Dizias-me tantas vezes “és o meu orgulho”… E agora tenho esta coisa em mim, este sentimento que tanto me traz o oceano ao olhar como me abre a expressão num sorriso que me diz que está na hora de eu fazer jus a essa emoção. Não como uma dívida, mas antes como uma concretização. E por isso vou sair deste torpor, cuidar dos meus alunos, cuidar do meu doutoramento, mas principalmente alimentar este blogue que nos juntou, que é a razão por eu te ter na minha vida.
Sabes o que mais me custa, ainda assim? Imagina a Feira do Livro de Lisboa, local onde nos conhecemos, sem ti! Tínhamos encontro obrigatório marcado todos os anos. Acabávamos sempre por nos encontrar noutras alturas, mas se não houvesse essa possibilidade pelas razões da distância e das nossas ocupações, tínhamos a certeza que ali nos iríamos reunir e isso dava-me bastante paz. Vi numa das fotografias que coloquei contigo há uns meses um comentário meu que dizia “espero na próxima feira do livro não estar com tantas olheiras”, só para não destoar ao teu lado. Parece que agora não interessa muito, pois não? Quando lá chegar, veremos, mas certamente que a praça da Porto Editora não mais será a mesma para mim. Não pensemos nisso, senão as lágrimas voltam e nós queremos é sorrisos.
A colectânea há-de acontecer Luís. Lembras-te daquela noite que mal dormi por causa de alguns contratempos? Foste tu, foste tu quem me acalmou, quem me guiou e me amparou. Como sempre o fizeste quando a vida dava trambolhões por este lado. Ah, uma coisa, não fiques ofendido com o silêncio da comunicação social em relação à tua morte. Eles temem-te, sempre te temeram, mesmo em vida, sabes disso. Faz-me lembrar aquela conversa que tivemos por causa dos tops internacionais. O alarido à volta do top da Amazon e o silêncio à volta do PRIMEIRO AUTOR PORTUGUÊS a fazer parte do grande top do NEW YORK TIMES! Lembras-te dessa conversa? Não ligues, mais cedo ou mais tarde tudo vem à superfície e tu não serás esquecido. Ainda estou nesta fase de transição, mas a seu tempo, tudo será exposto. Andarás comigo, não pela mão, mas a meu lado, sei que estarás sempre comigo. Deixo-te uma das minhas músicas preferidas, querido Luís, com muitas saudades tuas e um grande sorriso. Também te Adoro. Até já.
PS: Queridos leitores, nenhuma perda é fácil, a de um dos nossos melhores amigos, um dos nossos pilares, certamente é ainda menos. Não quero entrar numa espiral de tristeza, o Luís não era assim, eu não sou assim, e com o tempo, dia após dia, todos os sorrisos irão voltar, tal como todas as homenagens. O Luís era um grande escritor, mas uma pessoa ainda maior, de um coração sem limites e de um carinho e força sem igual. Quero agarrar-me ao seu sorriso, à força que me dava. Vou honrar isso, a sua vontade férrea de fazer as coisas avançarem. Quero concretizar muitas das ideias que tínhamos falado e discutido, porque sei que se ele ainda cá estivesse, não me ia deixar desistir delas. E por isso quero também agradecer o vosso apoio, sei que nestas alturas é complicado dizerem algo, tal como o é para mim. O BranMorrighan se é o que é hoje, se algum dia ousei fazer coisas diferentes, avançar com novos projectos e arrisquei dar a cara por mais, foi porque também tive todo o apoio dele e sei que se não fosse ele em certas alturas, muito não tinha acontecido. A colectânea Desassossego da Liberdade, por exemplo, teve o empurrão dele na minha decisão, foi ele que me fez acreditar que era possível eu conseguir montar um projecto artístico assim. Infelizmente, ele não conseguiu escrever o seu conto. Desde que falámos até à altura do crowdfunding a sua saúde foi ficando cada vez mais debilitada, mas sem dúvida que a sua concretização terá sempre o Luís como força motriz. Por isso, a seu tempo, transformada como inevitavelmente acontece quando perdemos alguém, hei-de retomar tudo por aqui, até mais se puder, ou mesmo se não puder.
Uma perda de alguém transforma o nosso ser, e tu como guerreira que és, vais transformar essa perda numa força que nem sabes que tens, e com essa força vais fazer coisas que nem sonhavas conseguir fazer.
Agora vais ter duas forças em ti e assim irás tornar-te numa pessoa nova com mais garra, mais destemida, mais focada.