Escritos Aleatórios #61

Tenho tentado perceber como lidar com isto. Sinto a tua falta, Luís, e se a minha vida mudou depois de te conhecer, certamente vai mudar ainda mais depois da tua morte. Ouço as reclamações de que a comunicação social não fala de ti, ouço os choques espantados do inesperado. Porquê? Como? Mas desde quando? Não percebem que para quem te era próximo, para quem lutou contigo durante este tempo todo, tudo isso é irrelevante porque já nada te traz de volta. É claro que mereces todas as homenagens do mundo pela pessoa que és, é claro que mereces ser recordado de todas as maneiras possíveis e imaginárias, mas antes disso tudo é preciso aceitar que te foste embora, que não te vou voltar a ver, que não te vou voltar a abraçar nem vou voltar a falar contigo.

Sabes, continuo a receber mensagens, a maioria porque “sei que vocês eram bons amigos”, mas há uma coisa que não sei sequer se tu sabias – que eras das pessoas mais importantes para mim. Existem estes caminhos que se cruzam na vida e que tudo transformam. A tua força, a tua alegria, o facto de acreditares no melhor das pessoas, sempre foi uma inspiração. Fartei-me de to dizer enquanto estiveste por cá, espero que tenhas acreditado se não quando me voltar a cruzar contigo vou-te dizer das boas, que eras das melhores pessoas, que para mim eras uma fonte inesgotável de força e carinho. Lembras-te do dia em que nos conhecemos? Em que eu disse que gostava imenso de ler o teu livro, mas que não tinha conseguido o contacto com a editora (e as minhas finanças eram muito parcas nessa altura). Tu pegaste em mim, ainda quase sem me conheceres, chamaste o Rui (perdoa-me, querido Rui, mas esta é uma das lembranças que mais me fazem sorrir e ainda bem que aconteceu porque também te conheci a ti) e disseste-lhe que querias que me enviassem um exemplar d’A Mentira Sagrada. Para depois tratarmos de trocar contactos e para eu te avisar quando a PE o fizesse. O Rui não ficou com ar muito contente, mas lembro-me que ainda nos rimos bastante com isso.

Preciso de te deixar ir, lembrança por lembrança, mas não sei como o fazer. Também não quero continuar, não agora. Dói, tudo, de cada vez que te vejo em imagens, em mensagens, no que for. Sabes porque é que não estou chateada por não estares a aparecer em todo o lado? Porque sou egoísta, porque mesmo evitando televisões e Facebook, mal cheguei a casa vieram ter comigo a dizer que tinham visto nas notícias que tinhas morrido. A minha reacção foi um resmungo, virei costas e fui para o meu quarto. Vieram atrás de mim. Tive vontade de gritar, de bater, que me deixassem em paz. Achavam mesmo que eu ainda não sabia? Porquê a tortura? Porque eu sei Luís, porque na noite antes de tu morreres eu já sentia ainda mais a tua falta. Dizem que as mulheres têm este sexto sentido, que se foda isto tudo quando esse sentido só nos faz sofrer. Tive pesadelos nessa noite, não especificando, sonhei que me tinham roubado algo de um valor sentimental sem preço. Quando acordei, recebo a mensagem a informar-me que te tinham roubado à vida.

Hoje vai ser o teu funeral e eu não vou poder estar presente, não te vou poder ver uma última vez. A distância que nunca foi um problema para nós, torna-se agora em fonte de tortura. Hei-de chegar até ti outra vez, Luís Miguel.

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Anónimo
Anónimo
9 anos atrás

Muita paz e coragem para viver com mais essa dor 🙁 Todos passamos pelo mesmo e ninguém está preparado quando acontece.

  • Sobre

    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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