Entrevista a Tiago André – DJ “A boy named Sue”

Não me recordo bem do momento exacto em que comecei a seguir o Tiago, mas lembro-me da primeira conversa mais a sério que tivemos, no Pai Tirano, ali na Bica. Enquanto bebíamos a nossa cerveja partilhámos uma série de histórias e a verdade é que conhecer a pessoa por trás do personagem que tanto vamos vendo pela internet fez com que respeitasse ainda mais o seu trabalho. Não foi inocente ter-lhe pedido para ser o “DJ oficial” do sétimo aniversário do blogue, nem de o ter convidado depois para fechar a festa no Maus Hábitos. A boy named Sue é um dos melhores DJs que conheço e é já reconhecido tanto nacional como internacionalmente. Nos últimos meses tem andado imparável e, como tal, justificou-se termos aqui uma pequena entrevista sobre ele. Está longe de chegar perto de toda a experiência que o Tiago tem acumulado, mas já dá para terem alguma noção de como tem estado imparável. No final do post têm link de Facebook e as próximas datas. Obrigada, Tiago! 

Tiago, conta-nos, como é que é ser o “A boy named Sue”?

É ser e fazer muitas coisas, é passar a vida rodeado de discos, a ouvi-los, a conhecê-los, a transportá-los e a mostrá-los às pessoas. É dividir o tempo entre viagens, horas de dj em cabines, em estúdios de rádio e todo o trabalho de casa de pesquisa, audição, emails, telefonemas, papéis, post-its…

Sabes que procurar esse nome no Google enche-nos de entradas sobre o grande Johnny Cash. Foi um músico que de alguma maneira te marcou particularmente ou foi só a sua canção? 

Sim, foi claramente um músico e uma pessoa que me marcou, com toda a sua humanidade, qualidades e defeitos. Aparte da sua música, a sua história de amor e de vida é inspiradora. Além do Johnny Cash em si, a música que escolhi para o meu nome é uma música especial, que conta uma história que me diz muito e de onde tiro um lema de vida.

E que lema de vida é esse? 

Muito resumidamente a música conta a história de um rapaz cujo pai baptizou de Sue (nome de mulher) e abandonou muito novo. O rapaz teve uma vida difícil e complicada e, muitos anos depois encontra o pai, que odeia de morte. Mas o pai diz-lhe ”eu sabia que não ia poder estar a teu lado para tomar conta de ti e educar-te, e foi o nome que te dei que fez de ti um homem forte, capaz de enfrentar todas as dificuldades da vida”. Daqui tiro a lição ou lema de que em vez de ‘chorar’ ou lamentar as adversidades e coisas más da vida, devemos enfrentá-las e usá-las para aprender, crescer e tornarmo-nos mais fortes.

Antes de seres DJ também estiveste do lado de quem tem uma banda. Fala-nos um pouco sobre essas experiências.

Quando era adolescente, como muitos jovens, tive várias bandas de garagem, uma delas, os MC Dolls, foi algo mais sério, mas depois de um ano de existência e de uma dezena de concertos pelo país, um dos elementos, o Afonso Pinto (baterista, agora vocalista dos Parkinsons) foi viver para Londres e a banda terminou. É estranho olhar para trás e lembrar esses tempos, a internet era uma coisa rara, gravar uma maquete também não era fácil e barato. Faziam-se flyers em fotocópias e trocavam-se cassetes (quando havia gravações). Hoje qualquer pessoa pode gravar algo e pôr no youtube e no dia seguinte ser conhecido mundialmente.

O que é que te fez largar essa estrada e enveredar pela de DJ?

No fundo não larguei, porque continuei a trabalhar com bandas, nos bastidores do Tigerman, dos Wraygunn e apoiando mais uma série de projectos. Mas sim, por um lado descobri que tinha jeito e gosto em ser dj e partilhar música com outras pessoas. Além disso eu era vocalista e como costumo dizer: vocalista desempregado ou aprende a tocar algo ou é difícil de começar uma banda só com letras… Além disso, acredito que para uma banda existir tem que haver uma espécie de química ou relação forte entre os elementos, talvez apenas não tenha voltado a encontrar as pessoas certas… não é uma hipótese posta de lado para o futuro…

Fotografia Nuno Sampaio

E a Faculdade de Letras de Coimbra e o curso de Geografia? Que se passou por lá, já que claramente não estás ligado à Geografia? 

Quando encontro um professor antigo e me pergunta pela Geografia, eu respondo-lhe: pois Geografia, só na prática mesmo… Quando acabei o curso tive o azar de ter apanhado uma série de reestruturações a nível de competências e cargos de instituições: Direcção Geral das Florestas, Ministério do Ambiente, Direcção Regional da Agricultura… o que não facilitou o meu estágio. Por outro lado já estava a ganhar dinheiro com a música e luzes (também sou técnico de luz de teatro e concertos). Acho que no fundo foi a música que me escolheu. Mas a Geografia não está de todo esquecida, até gosto muito de explorar as relações entre Geografia e História da Música.


Os teus sets são reconhecidos como dos melhores, tanto a nível nacional como internacional. São diversificados, dinâmicos e juntam o antigo ao novo. De onde é que vem toda essa escola musical?

Acho que vem por um lado de algumas pessoas que me influenciaram bastante e por outro da minha curiosidade, pesquisa e procura constante. Além disso tenho uma visão ou personalidade muito particular em relação à música que passo, sem preconceitos de géneros ou temporais e muito segundo o instinto ou intuição.

Quem ou que acontecimentos é que foram essenciais para que chegasses a tal mistura? 

A primeira pessoa que me influenciou musicalmente foi o meu pai e o que ouvia em casa, através dele conheci desde Jacques Brel ao Sérgio Godinho ou desde música celta à Laurie Anderson. Mais tarde, por volta dos 14 anos, numas férias com amigos, passei uma semana a ouvir  as cassetes do Staring at The Sea – The Singles, dos Cure e o Psalm 69 dos Ministry. Isso acordou-me para o punk, hardcore, new wave, que explorei o máximo que pude. Mais tarde, na convivência com o Paulo Furtado, que é uma espécie de irmão mais velho, abri os meus horizontes para o blues, o gospel, o easy listening, o tango… Mas há muito mais pessoas, acho que todos os meus amigos de alguma forma me influenciaram e me fizeram crescer musicalmente e me foram mostrando coisas importantes durante o meu percurso. Juntando a isto à minha curiosidade e necessidade de aprender, perceber e descobrir as relações entre os mais diversos tipos de música, as suas origens, os seus contextos sócio-culturais, os seus contextos geográficos e históricos, acho que chegamos a esta mistura actual.

Tens o teu programa de rário na RUC desde 2004. Que papel tem tido a RUC na tua vida? 

A RUC tem sido algo permanente na minha vida. Desde muito novo que ouvia a RUC, gravava cassetes com músicas dos programas.. mais tarde as festas e concertos que promovia, e depois o entrar e fazer parte dela. É uma escola, uma família, uma mãe, uma amante e uma filha. Há algo muito especial naquela rádio quase inexplicável. Aprendi e aprendo muito na RUC, e por sua vez tento sempre dar o melhor por ela.

Fotografia Nuno Gervásio

Temos tido o Baú do Sue na Antena 3, estiveste no Casa a Arder da Vodafone… O que é que catapultou todo este aumento de actividade no último ano? 

A minha actividade principal é trabalhar com o Paulo Furtado no Tigerman e nos Wraygunn. Como este ano seria um ano de pausa e menos trabalho, para preparação do novo disco, resolvi apostar a sério na minha carreira de Dj e tentar levar as coisas para outro patamar. Com base no que tenho vindo a construir nos últimos 15 anos, tentei trabalhar melhor a nível de promoção e agenda e na singularidade deste meu projecto, um dj de rock, e levá-lo ao máximo de pessoas possível. Acho que tem estado a correr bem, vou em 6 meses de ‘tour’ pelo país quase ininterrupta e o feedback tem sido muito positivo.

Como é que todos estes universos, o de roadie, dj e radialista, se conjugam e contribuem para a tua personagem A boy named Sue? 

Acho que se conjugam facilmente, apesar de serem coisas bastante diferentes. Com Tigerman tenho a possibilidade de viajar bastante e conhecer realidades e pessoas muito diferentes e ter contacto com muitas visões e aproximações ao mundo da música, isso é algo que me faz crescer bastante. Por outro lado, toda a experiência e a parte de produção, promoção, etc, dum projecto como o Tigerman me dá conhecimentos úteis para os meus próprios projectos. Aliás, voltando à pergunta anterior muito do que eu estou a fazer este ano é promover um projecto de Dj quase como se fosse uma banda.

Com tanta estrada e kms percorridos, queres destacar dois ou três momentos, ou até pessoas, que te marcaram, seja para o bom ou para o mau? 

Além das pessoas que já referi, há mais uma lista interminável de pessoas que me têm ajudado e marcado muito, desde amigos próximos, a programadores ou pessoas que apostaram em mim, ou outros amigos djs. Um dos momentos mais importantes terá sido quando o Jon Spencer me convidou para fazer a 1ª parte dos Blues Explosion no Hardclub no Porto, ao que se seguiu o convite para os acompanhar na sua tour em Itália. Outro foi quando fiz uma tour de 6 datas em Oslo (graças a um amigo que vive lá). Numa cidade com um público e uma sociedade que não conhecia, dizerem-me no final duma das noites, foste incrível, nós nunca vimos este bar assim cheio a dançar, é impagável. Nalgumas festas que tenho criado em Lisboa, o Kaleidoscope, o Chills & Fever e o Diabo no Corpo às vezes sinto uma felicidade extrema por algo que eu criei e idealizei estar a fazer uma multidão feliz.

Que palco te falta pisar que ainda não tenhas pisado? 

Acho que muitos… Gostava que, em geral, o ser dj de rock fosse mais reconhecido e fosse uma opção para quem programa grandes eventos. Há muitos bons djs de rock em Portugal e muita gente a gostar de rock. Gostava também de voltar a sair de Portugal e pisar os palcos de algumas festas e festivais no estrangeiro, mas é algo que também estou a preparar e a programar para o futuro.

Fotografia Pedro Veludo

Facebook

https://www.facebook.com/djaboynamedsue/

Datas

13 Julho/ Festival de Curtas Metragens de Vila do Conde

15 Julho/ Diabo no Corpo, Musicbox, Lisboa

23 Julho/ Dunas Bar, Vale de Cambra

28 Julho/ Festival Mêda+, Mêda

29 Julho/ Rodellus Music Fest, Braga

30 Julho/ Xapas Bar, Paredes de Coura

5 Agosto/ Moods Cafe, Lagos

6 Agosto/ Sabotage Club, Lisboa

12 Agosto/ Uncle Joe’s, Esmoriz

13 Agosto/ Jameson Lazy Sessions, Porto

13 Agosto/ Convento do Carmo, Braga

3 Setembro/ Gliding Barnacles, Figueira da Foz

7-10 Setembro/ Reverence Valada Festival, Valada

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  • Sobre

    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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