Grande
André Ducci
Polvo
24 págs
9,90 euros
Composto sem uma única palavra, este livro foi pensado de raiz para ser apreciado por crianças que ainda não dominam a linguagem escrita, permitindo uma enorme liberdade na construção, interpretação e narração da história. Contudo, a beleza e a imponência das imagens, facilmente fará com que Grande, segundo título de André Ducci publicado em Portugal, possa vir a integrar as prateleiras de livros ilustrados que fazem as delícias dos adultos.
A narrativa parte da deambulação de uma figura semelhante a um dinossauro, construída com linhas rectilíneas, movendo-se num ambiente pautado por grandes manchas de cor. Estamos no universo pictórico habitual deste autor, cujos trabalhos muitas vezes remetem para as grandes tapeçarias persas, pela articulação cromática e pela inserção das figuras no fundo.
Há uma calma no seu desenho que espelha os cenários onde decorre a acção (os mais atentos estarão recordados de No Fim do Mundo, história situada na Antártida que marcou a sua estreia na edição portuguesa). Se juntarmos a isso as várias vezes que Ducci opta por desenhar animais, começamos a intuir uma reflexão sobre a presença humana, em diferentes cambiantes.
Desta vez, há um entendimento mais profundo que remete para a questão ecológica, para a intromissão do Homem no habitat natural de tantas espécies, ou até mesmo para a ancestral intenção de concentrar em si mesmo (num antropocentrismo exacerbado) as valências e as decisões de um planeta habitado por outras espécies.
As sequências das roldanas remetem para o mítico filme de Charles Chaplin, Tempos Modernos, mas também há qualquer coisa de Metrópolis, obra emblemática de Fritz Lang, no elemento maquinal e em toda a transformação que ele implica, face às primeiras páginas. Será interessante, perceber como as crianças vão lidar com esta surpresa na história, um volte-face que anula qualquer hipótese de um Éden eterno e equilibrado, como nunca o conhecemos.
João Morales