Recensão: Tropel, de Manuel Jorge Marmelo, por João Morales

Tropel
Manuel Jorge Marmelo

Porto Editora
149 págs

Distopia? É melhor que sim…

Embora tentador, é difícil catalogar esta história como uma distopia, tal é a presença de elementos concretos e actuais, referências identificáveis por todos, e um assombroso desejo de que tudo não passe… de uma ficção.

Tropel, assim se designa o mais recente romance de Manuel Jorge Marmelo, demonstra mais uma vez a capacidade deste autor em criar narrativas apelativas, escritas de forma extremamente fluída, onde a intensidade das personagens e do seu devir substituem qualquer arquitectura intrincada de relações ou um discurso apoiado num vocabulário hermético. Sem que, com isto, se menospreze a escolha das palavras exactas e da sua carga simbólica. Pelo contrário – veja-se a referência repetida à “actividade venatória”, introduzindo um carácter ritualístico numa descrição de brutalidade: “Sim. Caço refugiados. É este, agora, o meru desporto., o meu modo de vida, aminha principal especialidade venatória. É o meu contributo para limpeza e para o progresso da minha pátria amada”.

Atanas Viktor é o jovem narrador, nome no qual, consciente ou inconscientemente, encontramos ecos a Thanatos, o Deus da morte – mas da morte pacífica. O seu pai é Hirónimo, tal como Hieronimus Wolf, historiador do séc. XVI, todavia, mais uma vez o pensamento do leitor vagueia e é impossível não pensar em Bosch, o pintor de As Tentações de Santo Antão, quadro que repousa no Museu Nacional de Arte Antiga. 

O Clube dos Caçadores ocupa-se de vigiar a fronteira, mas não apenas. O seu espírito voluntarioso leva-os a criar armadinhas e ciladas, aliciando refugados que acabam abatidos. A crueza do raciocínio que pauta o comportamento destes homens é notória e assumida. Logo nas primeiras páginas, a cena que põe termo à vida do avô de Atanas deixa bem clara a ausência de contemplações e a rigidez dos preceitos que norteiam esta comunidade, bem como a bestialidade dos comportamentos com as mulheres, tónica constante ao longo do livro. 

O livro é pontuado com algumas alusões literárias, absolutamente justificadas, consistindo em contributos inteligentes e adequados à consolidação do simbolismo de uma interpretação literária e filosófica de tudo o que nos é apresentado: O Estrangeiro, obra maior de Albert Camus, ou o igualmente icónico O Deserto dos Tártaros, de Dino Buzzati, estabelecendo um paralelismo interessante entre o conflito que se pressente, mas não eclode, e a ansiedade da personagem Krassimiro (“disse-lhe que estava a ler um livro em que um Tenente espera por um ataque dos tártaros. Limita-se, porém, a esperar. Espera e espera num forte erguido no meio de um deserto poeirento onde nada acontece”)

Um ambiente maléfico alimenta o pior de cada um e assegura a continuidade do mal. A moral nivela-se por baixo: “senti confusamente uma espécie daninha de triunfo e vingança, o alívio mesquinho de saber que Marguita não mais seria tratada com deferência especial e que provaria do mesmo veneno que a minha mãe há muito ingeria em grandes sorvos”.

Naturalmente, este livro é um alerta e uma denúncia, uma obra assumidamente política, nunca no restrito sentido partidário, mas tendo por base um olhar sobre alguns discursos da actualidade. Seria tão que o pudéssemos continuar a definir como distopia…

João Morales

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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