[Opinião] A Tentação de Sermos Felizes, de Lorenzo Marone

A Tentação de Sermos Felizes engana-nos logo pela capa e pelo título. O que é que quero dizer com isto? Quero dizer que, se forem como eu, à primeira vista parece um romance de algibeira e, novamente, se forem como eu, isso pode fazer com que não seja muito atraente à primeira vista. No entanto, este livro foi-me oferecido por uma grande querida amiga minha e isso fez com que pegasse nele mais cedo ou mais tarde. A surpresa boa é que podia ter pegado nele mais cedo!

Este romance é narrado por um idoso, Cesare, de 77 anos que vive agora sozinho num apartamento num prédio habitado por personalidades bastante singulares. A senhora dos gatos, o amigo velhote que já não sai de casa e agora um casal mais jovem cuja relação desperta curiosidade desde o início. Para além disso, tem dois filhos, Sveva e Dante, cujas personalidades são tão distintas e com quem se desleixou durante tanto tempo. A sua rotina diária vê laivos de chama quando interage com Rossana, a sua “enfermeira”. Ao mesmo tempo que o enredo se desenrola no presente, Cesare vai-nos contando sobre três mulheres inacessíveis que ficaram no seu passado.

A Tentação de Sermos Felizes é muito mais do que um romance, é uma dissertação sobre a velhice e a solidão, um relato cru e realista sobre o que as não decisões podem provocar a longo prazo. Também o tema da violência doméstica e do custo do silêncio, mesmo a pedido das vítimas, é brutalmente arrebatador. A homossexualidade dentro da família, os amores não vividos, os filhos a herdarem comportamento dos pais, o preconceito com outras classes sociais e conclusões tiradas antes do tempo, tudo narrado sem falinhas mansas, fazem desta obra e destas personagens uma pequena relíquia.

Lorenzo Marone constrói neste livro uma narrative inteligente, mordaz, sensível e comovente, ao mesmo tempo que nos provoca uma constante reflexão. Enquanto não se vive uma dor na primeira pessoa, não podemos entendê-la. E, no entanto, quantas pessoas usam impropriamente as palavras “como eu te entendo”. Não entendes mesmo a ponta de um corno, meu lindo, era o que devíamos responder-lhes. Sai daqui uma bela recomendação. Quem sabe para o final do vosso Verão. Podem comprar aqui.

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5 Comentários
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emptyhappysong
emptyhappysong
2 anos atrás

De facto, o título engana muito, também me passaria essa impressão de romance de algibeira… mas pelo que escreveste sobre a história, fiquei com bastante curiosidade 👀 Obrigada pela partilha!

PS: Afinal ainda há quem leia blogues, hahah 😛

emptyhappysong
emptyhappysong
Reply to  Sofia Teixeira
2 anos atrás

Obrigada! ^^

A capa também, mas do que vejo no Goodreads há edições com capas um pouco menos enganadoras 😛

Quanto a sugestões, dos livros que li este ano, talvez sugira o livro do Noiserv e o De Amor e de Sombra da Isabel Allende (mas recomendaria leres primeiro A Casa dos Espíritos, que é o primeiro de todos dela, e que acho especialmente relevante nos tempos que correm).
Convém referir que o livro do Noiserv é diria que é mais como uma espécie de puzzle, portanto talvez requeira um mindset um pouco específico (pelo menos eu senti isso e quero ler novamente).

emptyhappysong
emptyhappysong
Reply to  Sofia Teixeira
2 anos atrás

Não cheguei a ler o Desassossego, não, mas vou então apontar. 😛

Li o Jogo de Ripper e gostei bastante também (tinha muita curiosidade por esse livro porque é um setting a nível de época e local e um plot completamente diferente dos outros, e estava curiosa para ver como isso se iria cruzar com o estilo de escrita que encontrei n’A Casa dos Espíritos – e que está bem presente no Ripper também).
O que me fez gostar mais d’A Casa dos Espíritos e do De Amor e Sombra é precisamente o setting em que as histórias se passam. Gostei especialmente do primeiro, mas ao mesmo tempo é um livro mais “inconvencional” na forma como apresenta a “história” e poderá ser mais difícil de se gostar. Mas a moral por detrás de tudo o que acontece é incrivelmente importante.

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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

    O nome tem origens no fantástico e na mitologia celta. Bran, o abençoado, e Morrighan, a deusa da guerra, têm sido os símbolos desta aventura com mais de uma década, ambos representados por um corvo.

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