[Os Meus Discos] Adeus, de Indignu

Os indignu são uma banda portuguesa de post-rock pela qual nutro um imenso carinho. Penso nunca ter escrito extensivamente sobre eles, mas há pelo menos um par de memórias em concertos ao vivo das quais não me consigo esquecer. Uma sensação de eternidade, transcendência. Uma sensação de casa. Um espaço onde as emoções podem fluir livremente, sem julgamentos.

O post-rock é um género musical que, na minha opinião, nem sempre tem a devida apreciação. Talvez porque fuja aos clichês do POP (que também gosto), mas pergunto-me se não será essencialmente pela inquietação que consegue provocar. E os indignu têm não só o dom de se destacam pela sua própria personalidade, mas essencialmente pela conjugação dos instrumentos que usam, pela forma delicada, porém incisiva, com que chegam ao nosso coração.

adeus é o mais recente disco da banda e proporciona-nos uma viagem sensorial quântica pura. a noturna, a primeira faixa, estende-nos uma passadeira láctea em que a percepção do espaço e do tempo se entrelaçam com o nosso espaço emocional incitando-nos à descoberta, mas com cautela. É com esse mesmo tom que devolução da essência do ser começa. indignu tem-se destacado sempre pela forma magistral com que conjuga bateria, baixo, guitarra, violino e piano, para além de toda uma atmosfera electrónica etérea. Há laivos de fado, há laivos de clássico, há centelhas da herança das inspirações que usam, mas acima de tudo há a mestria da forma única com que se expressam.

devolução da essência do ser é uma canção na qual temos a oportunidade de deixar fluir o cosmos num grito de liberdade que ecoa e que nos retorna a casa. São 14 minutos em que começamos de forma compassada, urgindo pela respiração, uma de cada vez, com paciência, com aceitação. E depois crescemos com a canção, com a sua intensidade, com o abrir do peito e a sensação de sermos arrebatados por algo que é maior do que nós. Nesta devolução da essência do ser, há muitas despedidas, há muitos adeus. Há uma urgência de paz. Mas para a alcançar, primeiro precisamos de exorcizar o que nos consome. Abrir espaço para que possamos respirar e ser novamente completos.

Avançamos para em qualquer entranha, uma balada ao piano que chega após uma pequena catarse, que comove, mas que também traz alguma luz, um pingo de inocência, seguido do peso da realidade. É aí que chega urge decifrar no céu. Somos liderados pelo belo violino, pelo seu tom encantatório suportado por uma guitarra que faz as horas à melancolia, para rapidamente tudo ser arrebatado por uma bateria e um baixo que se recusam a ficar no chão. Juntam-se vozes que ao primeiro momento nos arrepiam, que nos dão a mão, que gritam connosco e partilham a nossa dor de uma forma que sozinhos talvez não conseguíssemos expressar.

E ainda assim, sentimos esperança, precisamente por não estarmos sozinhos nestas múltiplas despedidas. Porque um fim, traz sempre um novo início. E num tom saltitante, abraçados por uns fios de fado e de universo, lá nos vamos reinventando com os indignu até chegarmos à última canção — sempre que a partida vier. Depois de todo o turbilhão emocional, esta última canção fez-me dançar, entregar-me ao que não se pode controlar.

Uma partida pode não significar nada, ou pode significar tudo. Ainda assim, são inevitáveis. E a vida continua. Mesmo que ao início haja sombras, mesmo que o adeus seja duro, eventualmente a luz chega e o sorriso brilha novamente. sempre que a partida vier significa para mim esse balanço entre a felicidade e a tristeza, entre o olá e o adeus, entre o que foi e o que é. E todas as emoções são válidas e aceites nesta maré de um mar tão vasto e profundo que é o pequeno espaço que temos entre as nossas costelas.

Gostaria de ter mais vocabulário para vos descrever melhor a composição musical deste disco, mas estou destreinada e, honestamente, prefiro que ouçam. Sem dúvida que será uma experiência super pessoal e eu aqui limito-me a descrever a minha. E se não é esta a beleza da música, o que é? Aconselho apenas a que tenham uns bons headphones ou barra de som, porque sem dúvida que este disco merece. Infelizmente estive doente quando apresentaram o disco em Lisboa, mas espero vir a ter a oportunidade de os ver ao vivo, porque tenho a certeza que vai ser dos concertos mais belos que irei ver. Um grande abraço a todos vós, meus queridos indignu.

Indignu
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    Olá a todos, sejam muito bem-vindos! O meu nome é Sofia Teixeira e sou a autora do BranMorrighan, o meu blogue pessoal criado a 13 de Dezembro de 2008.

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